
Aos 17, encontrei Ronaldo, ainda Ronaldinho. Também tinha 17 anos. Embarcávamos para a Holanda. Ele sozinho, calmo, um olhar meio vago, a caminho do PSV Eindhoven. Eu, com outros 15 adolescentes eufóricos e embasbacados com o tetracampeonato, partia para um ano de intercâmbio estudantil. O hoje Fenômeno iniciava a conquista do planeta; nós apenas começávamos a ter nova visão de mundo.
Pela primeira vez víamos um craque que não era mais velho do que nós. Tão moleque quanto. Meio ingênuo até. Já no avião, respondia ao assédio com timidez, monossilábico, com um quê de Barbosa: É, só, u-hum… Com insistência, deixou a cabine, onde a tietagem dos pilotos era o preço por um lugar mais tranquilo, para uma sessão de fotos.
No instante do clique, surge o matador. Puxa pelo braço a menina mais bonita do grupo e dispara a única frase completa para aquele fã-clube ocasional: “Vem cá, gatinha. Pode bater a foto.” Era o homem gol pronto. Tranquilo e infalível como Bruce Lee.
Quase agnóstico quando o assunto é futebol (embora simpático ao poder superior do Parque São Jorge), acompanhei com interesse inédito o campeonato holandês e a trajetória de Ronaldinho no PSV. Entre 1994 e 1995, o vi cair nas graças não só da população de Eindhoven. Ainda saudosos de Romário de “Susa Fária”, os holandeses sacaram logo que o sujeito era fora do comum, embora ainda não fosse ‘fenomenal’. No PSV, Ronaldinho ainda não tinha o apelido que o consagrou. Mas as arrancadas explosivas deixavam para trás o porte franzino do menino promissor de Bento Ribeiro.
Dali em diante a história do Fenômeno é fartamente documentada, dentro e fora de campo. Alcançou a condição de celebridade em escala planetária, unindo o mundo da bola e o universo pop. E em uma carreira tão grandiosa quanto acidentada, em qualquer sentido. Afinal, está aí a origem do Fenômeno.
Entre uma ressurreição e outra, Ronaldo alternou momentos de maturidade com deslumbramento infantil, comum a tantos boleiros. Mas nunca buscou refúgio no discurso hipócrita do bom-mocismo nem atribuiu queda ou superação a questões do além. A fenomenologia que ostenta o R9 é essencialmente mundana.
Michel Blanco
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