sábado, 29 de janeiro de 2011

Cadeira cativa!



Blog de Josias de Souza

Imortal!



Blog de Josias de Souza

Meus porta-vozes de sonho

DAVOS - Desço para o café-da-manhã no Morosani Post Hotel, na Promenade, a rigor a única rua de Davos. As outras são ruelas sempre cobertas de neve nesta época do ano, a ponto de não se distinguir a calçada da rua propriamente dita.
Cruzo com dois velhos amigos, Arantxa González e Keith Rockwell. Acompanham o chefe, Pascal Lamy, o diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), para um café-da-manhã com um ministro que não consigo identificar (nem é relevante para esta história).
Apresento Lamy: se houvesse um Oscar para funcionário internacional, seria fácil o meu candidato. É o profissional perfeito ou quase perfeito, que perfeição não existe.
Foi comissário do Comércio da União Europeia, período em que colidiu algumas vezes com os delegados brasileiros. Depois que passou a chefiar uma organização global, no entanto, defende um único interesse, o do comércio internacional e o de uma organização em que, bem ou mal, todos os países têm o mesmo peso teórico, já que as decisões são tomadas por consenso, não por voto, qualificado ou não.
Provoco sempre Lamy para que seja candidato à Presidência da França (ele é do Partido Socialista). Nesta quinta-feira mesmo, disse-lhe que, se Dominique Strauss-Khan, francês, socialista e também diretor-gerente de uma organização internacional (no caso, o FMI), pode ser pré-candidato, por que não Pascal Lamy?
"Tenho mais o que fazer", despreza.
Volto à Arantxa e Keith. Arantxa, uma espanhola que fala ao menos seis outras línguas com perfeição, é uma das porta-vozes de Lamy. Uma vez, em Cancún, durante uma Ministerial da OMC (a instância suprema da organização), conversávamos em espanhol quando se aproximaram um jornalista italiano e outro alemão.
Arantxa trocava do espanhol para o italiano e do italiano para o alemão e de novo para o espanhol como se todas fossem suas línguas nativas.
Keith é inglês. Cobriu para "The Times" a Rodada Uruguai, o ciclo anterior de liberalização comercial (agora estamos na empacada Rodada Doha). Cheguei a ele por intermédio de um gigante do jornalismo brasileiro, Celso Pinto, que foi a alma na criação do jornal "Valor Econômico", depois de brilhante carreira na "Folha" e, antes, na "Gazeta Mercantil".
Tornamo-nos amigos à distância. Sempre que estamos no mesmo ambiente/cidade, ele me convida para conversar informais com Lamy para fazer o ponto da situação das negociações comerciais.
Keith e Arantxa tomam lugar à mesa do café-da-manhã, mas não tomam o café-da-manhã propriamente dito. Ficam, ambos, anotando a conversa.
Por isso, o título da coluna: porta-vozes dos meus sonhos. Não só nem principalmente porque somos amigos e tenho, por isso, um tratamento privilegiado. É que os dois estão perfeitamente informados de tudo o que está acontecendo com o "digi" Lamy ("digi" é como dizem DG, de diretor-geral, no peculiar dialeto da burocracia internacional).
Por isso mesmo, a informação que transmitem aos jornalistas não é de ouvir dizer, não é suposição. É testemunho presencial.
No Brasil, não conheço um só porta-voz de qualquer autoridade que participe diretamente das reuniões, conversas etc de seus chefes. É como escrevi outro dia: porta-vozes que não portam a voz.
Já crescemos o suficiente para que comecem a surgir os Keiths e as Arantxas, não?

Clóvis Rossi

Uma Europa particular

O discurso do presidente Obama sobre o Estado da União não foi muito inspirador. Mas a resposta oficial do Partido Republicano, apresentada pelo deputado Paul Ryan, foi realmente interessante. E não o afirmo como elogio.
Ryan fez afirmações extremamente dúbias quanto a empregos, saúde e outros assuntos. Mas o que atraiu mais minha atenção, ao ler a transcrição de seu discurso, foi o que ele teve a dizer sobre outros países. "Vejam o que está acontecendo a países como Grécia, Irlanda, Reino Unido e outras nações europeias.
"Demoraram demais a agir, e agora seus governos se viram forçados a impor dolorosas medidas de austeridade: grandes cortes de benefícios para os idosos e fortes aumentos de impostos para todos."
A história é boa. Os europeus vacilaram quanto aos deficit, e isso conduziu a uma crise. Infelizmente, embora a afirmação seja ao menos em parte procedente com relação à Grécia, não foi nada disso que aconteceu na Irlanda ou Reino Unido, países cujas experiências de fato refutam a atual narrativa republicana.
Mas o fato é que os conservadores norte-americanos há muito têm uma Europa particular em suas imaginações -- uma região de economia estagnada e serviços de saúde terríveis, uma sociedade em colapso sob o peso do governo grande. O fato de que a Europa não seja nada disso -- vocês sabiam que, na Europa, a probabilidade de que um adulto em seus anos produtivos esteja empregado é superior à dos Estados Unidos? -- nunca os impediu de dizer o que dizem. Portanto, não deveríamos nos surpreender com as patranhas semelhantes que contam sobre os problemas europeus de dívida.
Vamos falar sobre o que realmente aconteceu na Irlanda e no Reino Unido.
Às vésperas da crise financeira, os conservadores só tinham elogios à Irlanda, um país de baixa tributação e baixos gastos públicos, pelos padrões europeus. O Índice de Liberdade Econômica da Heritage Foundation atribuía à Irlanda posição superior ao de qualquer outra nação ocidental. Em 2006, George Osborne, hoje secretário das Finanças britânico, declarou a Irlanda "um exemplo reluzente da arte do possível em termos de política econômica de longo prazo". E a verdade era que, em 2006/2007, a Irlanda operava com superavit orçamentário e tinha um dos mais baixos níveis de dívida entre os países avançados.
O que aconteceu de errado, então? A resposta é que os bancos irlandeses se descontrolaram nos anos de prosperidade, criando uma imensa bolha imobiliária. Quando a bolha estourou, a arrecadação do governo despencou, causando uma disparada no deficit, enquanto a dívida pública também explodia porque o governo assumiu as dívidas dos bancos. E os severos cortes de custos, embora tenham conduzido a uma imensa perda de empregos, não foram capazes de restaurar a confiança.
A lição da derrocada irlandesa, portanto, é o exato oposto do que Ryan gostaria que acreditássemos. Não é um caso de "cortem os gastos agora ou coisas ruins acontecerão', e sim um caso de que orçamentos balanceados não servem de proteção a um país que não regulamente seus bancos de maneira efetiva -- um argumento exposto com clareza no recente relatório da Comissão de Inquérito sobre a Crise Financeira, a qual conclui que "30 anos de desregulamentação e de aposta na autorregulamentação" ajudaram a criar a nossa catástrofe. Eu me lembrei de mencionar que os republicanos estão fazendo tudo que podem para solapar a reforma financeira?
E quanto ao Reino Unido? Bem, ao contrário do que Ryan parece ter dado a entender, o Reino Unido na verdade não sofreu uma crise de dívida. É fato que David Cameron, que se tornou primeiro-ministro em maio, reverteu a política econômica em direção da austeridade fiscal. Mas isso aconteceu por escolha, e não em resposta a pressões de mercado.
E a base dessa escolha é a adesão do novo governo britânico à mesma teoria proposta pelos republicanos -- a alegação de que reduzir os gastos do governo quando a economia está deprimida na verdade ajudará o crescimento, em lugar de prejudicá-lo.
E que forma essa teoria está tomando quando aplicada na prática? Uma forma não muito agradável. A economia britânica, que parecia estar se recuperando no começo de 2010, voltou a apontar queda no quarto trimestre. Sim, o clima influenciou, e não, não devemos confiar demais em resultados referentes a um único trimestre. Mas certamente não existem sinais da alta na confiança do setor privado que supostamente deveria compensar a demissão de meio milhão de funcionários do governo. E, como resultado, a experiência britânica não oferece sustentação às alegações republicanas de que os Estados Unidos precisam cortar seus gastos para enfrentar seu imenso desemprego.
O que me conduz de volta a Paul Ryan e sua resposta ao presidente Obama. Vale repetir que os conservadores norte-americanos há muito empregam o mito de uma Europa fracassada para argumentar contra a aplicação de políticas progressistas nos Estados Unidos. Mais recentemente, tentaram aproveitar os problemas de dívida da Europa para beneficiar sua agenda, ainda que os fatos europeus apontem na direção oposta.
Mas Ryan costuma ser retratado como um dos líderes intelectuais do Partido Republicano, e como especialista em assuntos de dívida e deficit. Por isso, a revelação de que ele literalmente nada sabe sobre as crises de dívida em curso no momento é, como eu disse, interessante -- e não de modo positivo.

Paul Krugman

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

'Dilmadora'!



Blog de Josias de Souza

Reciclagem!



Blog de Josias de Souza

Tortura não mais

Sabe qual a principal notícia, entre a vinda de Barack Obama em março, a discussão do salário mínimo, o presidente do TCU recebendo uma baba para palestras em órgãos que o tribunal investiga, o pobrezinho do Maranhão pagando rios de dinheiro para ex-governadores?
Na minha opinião, é a notícia publicada hoje pelo jornalista Evandro Éboli no jornal "O Globo" de que a Secretaria de Direitos Humanos vai enviar ao Congresso um projeto criando uma comissão especial para... investigar tortura nas prisões!
Muito se fala, com justo horror e asco, da tortura, das mortes e dos desaparecimentos de militantes políticos ocorridos durante o regime militar (1964-1985), mas a gente finge que não vê, não sabe, nunca ouvir falar em tortura de preso pobre e jogado em cadeias e penitenciárias pelo país afora.
Dá tontura só de pensar no que esses homens e mulheres passam nas cadeias, muitas vezes tratados como seres sub-humanos e roucos de tanto gritar sem que ninguém os ouça e os acuda, afora ONGs e voluntários esparsos e corajosos.
Para lembrar de um caso emblemático: aquele menina trancafiada numa cela só de homens no Pará, estuprada, maltratada, humilhada, marcada no corpo e na alma para todo o sempre.
Pelo projeto, a comissão terá onze membros, incluindo médico, psicólogo, arquiteto e assistente social, entre outros, e terá o poder de entrar nas cadeias e penitenciárias sem aviso prévio, sem consentimento dos diretores. Pode também ir atrás de uma denúncia, anônima ou não, ou simplesmente decidir ir por vontade própria.
A ideia vem do secretário anterior, Paulo Vannuchi, e foi bem encampada por sua sucessora, Maria do Rosário. Eles e ela - a comissão - têm a cara do Brasil que a gente vai construindo aos trancos e barrancos: um país mais desenvolvido, mais democrático, mais justo e mais humano.
Criminosos, por piores que tenham sido seus crimes, têm direito à Justiça, ao respeito e a um tratamento humano edigno proporcionado pelo Estado. Até porque somos nós que pagamos, não um brutamontes qualquer que usa o cargo, o distintivo e o poder fugaz para descontar no outro suas mágoas da vida.

Eliane Cantanhêde

Por que saí do Brasil

A partir desta semana, meus comentários serão feitos dos Estados Unidos, onde vim participar de uma incubadora de projetos sociais na Universidade Harvard. O programa envolve as faculdades de educação, saúde pública, administração pública, direito e negócios e tem duração de12 meses. Pretendo, neste espaço, focar novidades na área de capital e as inovações tecnológicas.
O objetivo do projeto, batizado de Open City (Cidade Aberta) é misturar jornalismo, educação e urbanismo, gerando, com as novas tecnologias de informação, cidades mais democráticas e educadas.
A base do Cidade Aberta é a experiência do bairro-escola, que visa à integração da escola com a cidade, criando redes de relacionamento, e do Catraca Livre (catracalivre.com.br), um provedor de conteúdo que informa o que existe de graça ou a preço popular na cidade de São Paulo. O projeto tem o apoio tecnológico do Google e da IBM.
Vou redesenhar meu site (www.dimenstein.com.br), no próximo mês, para abrir um espaço colaborativo ao meu projeto, além de transmitir as descobertas que faço nos Estados Unidos, a começar de Harvard e do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).

Gilberto Dimenstein

Receita para a felicidade

Certa vez, Sigmund Freud questionou uma amiga: "Mas, afinal, o que querem as mulheres?". Nem ele nem ninguém jamais conseguiu esclarecer o enigma. Mas, se formos um pouco mais modestos e perguntarmos apenas "o que quer o ser humano?", a resposta é quase óbvia: queremos a felicidade.
Eu não digo isso sozinho. Na verdade, essa é uma noção bastante popular entre filósofos de diferentes épocas e orientações. Já no século 4º a.C., Aristóteles afirmou que a "eudaimonía" (felicidade) é o fim de toda ação humana. Jeremy Bentham (1746-1832) não só definiu que a meta das políticas públicas era promover o bem-estar como fez a primeira tentativa de calculá-lo objetivamente. Thomas Jefferson (1743-1826) incluiu a "busca pela felicidade" entre os direitos inalienáveis elencados na Declaração de Independência dos EUA, ao lado da vida e da liberdade.
A grande dificuldade é que, apesar de sabermos o que queremos, somos péssimos em obtê-lo. Ou melhor, nós até que nos saímos relativamente bem quando lidamos com a felicidade presente (temos, afinal, o prazer para nos guiar), mas basta adicionar a dimensão temporal, isto é, colocá-la no passado ou no futuro, para que tudo dê errado.
A boa notícia é que, com auxílio da neurociência e da economia, psicólogos estão conseguindo mapear os problemas. Ainda não são capazes de oferecer uma receita para a felicidade, mas já podem apontar um punhado de coisas que não deveríamos fazer, mas vamos continuar fazendo do mesmo jeito.
Várias boas obras tratam do assunto: "Stumbling on Happiness" (tropeçando na felicidade), de Daniel Gilbert, "The Happiness Hypothesis" (a hipótese de felicidade), de Jonathan Haidt, e "The Paradox of Choice" (o paradoxo da escolha), de Barry Schwartz, para citar apenas três.
Centro hoje meus comentários no livro de Gilbert. Se o resultado deixar eu e os leitores felizes, poderei, no futuro, voltar a abordar o tema com o enfoque dos outros autores.
Acho que foi o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan quem afirmou que, "no Brasil, até o passado é incerto". A frase é boa porque vem revestida com ares de paradoxo. Analisando bem, contudo, há poucas coisas mais incertas do que o passado, em especial nosso passado pessoal. E isso porque nós o acessamos através da memória, a qual, mais do que imperfeita, é irremediavelmente traiçoeira.
Sempre que a utilizamos, temos a sensação de estar consultando um registro fotográfico de cenas ou um meticuloso banco de dados. Essa é mais uma das trapaças de nossos cérebros. Qualquer um que já tenha tentado guardar fotos ou filmes no computador sabe quanta memória isso consome. Apesar de termos bilhões de neurônios formando trilhões de conexões, não haveria espaço para armazenar toda uma vida na forma de imagens gravadas.
Na verdade, o que o cérebro guarda são registros hipertaquigráficos a partir dos quais nossa mente reconstrói o episódio cada vez que nos lembramos dele. Como não poderia deixar de ser, essa processo sofre distorções pelo que estamos sentindo ou pensando no momento em que acionamos a memória.
Num experimento clássico, voluntários veem uma série de slides de um carro vermelho que se aproxima de uma placa de "dê a preferência", vira à direita e acerta um pedestre. Depois de observar as imagens, o grupo se divide em dois. O primeiro é o controle. Os pesquisadores não fazem nenhum comentário para eles. Para o segundo, perguntam se viram um outro carro passar o veículo vermelho quando ele estava diante da placa de "pare". Em seguida, os voluntários são colocados diante de duas imagens: o carro vermelho se aproximando de uma placa de "dê a preferência" e outra dele chegando perto do sinal de "pare". Quando se pergunta qual o slide que eles haviam visto originalmente, mais de 90% dos que estavam no grupo de controle apontam para o "dê a preferência". Já no grupo que foi influenciado pela pergunta, 80% indicam o "pare". Uma simples perguntinha alterou sua memória. Evidentemente, quando há emoções envolvidas, a coisa só fica pior.
Também fica pior quando nos movemos para o futuro em vez de para o passado. O acesso aqui já não é pela memória, mas pela imaginação. Nós a utilizamos para tentar estimar como nos comportaremos em situações hipotéticas que ainda não aconteceram. Mas, a exemplo da memória, nossa imaginação também carrega uma série de falhas de engenharia e vieses que a tornam presa fácil de todo gênero de armadilhas.
É por isso que não hesitamos muito antes de repetir erros que deveriam ser conhecidos, como voltar a passar férias na casa da sogra, mesmo depois dos micos que tivemos de pagar e das guerras entre parentes que tivemos de testemunhar no ano anterior. Sob a excitação da perspectiva de sair em férias, o cérebro imagina o futuro mobilizando apenas as lembranças positivas das estadias prévias e seletivamente ignorando as negativas. É também por isso que pessoas voltam a contrair núpcias. O segundo casamento é, segundo Samuel Johnson, "o triunfo da esperança sobre a experiência". Nunca se esqueça de que a mente é uma grande trapaceira.
Quer mais algumas enganações? Pois bem, tendemos a considerar mais provável aquilo que imaginamos com mais frequência. Como pessoas normais preferem pensar em coisas boas a ruins, somos aquilo que a literatura chama de "eternos otimistas". A maioria de nós espera viver mais, ter casamentos mais longos, viajar mais e ser mais inteligente do que a média. Mesmo quando tomamos um banho de realidade, isto é, quando somos confrontados com fatos negativos como sobreviver a um desastre natural ou presenciar um acidente na estrada, o efeito realístico desses eventos tende a durar pouco e, após algumas semanas ou quilômetros, a ilusão de segurança se restabelece. Esse otimismo visceral é também a razão do sucesso de loterias, das quais mentes racionais guardam econômica distância.
Por vezes, o impacto do evento negativo até reforça o otimismo. É o que concluiu um estudo de 2003 que mostrou que pacientes de câncer tinham mais confiança em seu futuro do que pessoas saudáveis. A grande exceção a esse quadro parece ser a depressão. O sujeito deprimido faz uma avaliação absolutamente realista de suas capacidades e perspectivas. Em resumo, não vivemos felizes (e nem mesmo saudáveis) sem ilusões.
Algumas delas são bastante poderosas. O dinheiro traz felicidade? Sim, mas só até certo ponto, ou, para ser preciso, só até US$ 100 mil, anuais. Várias pesquisas mostram que o dinheiro é necessário para garantir condições básicas de vida que nos permitam aproveitá-la adequadamente, mas rendimentos que excedam essa cifra não acrescentam nada em felicidade.
O mesmo vale para filhos. Só que eles, na verdade, trazem infelicidade. Quatro trabalhos diferentes mostraram que o sonho da paternidade/maternidade deixa casais mais infelizes, pelo menos no intervalo que vai do nascimento do mais velho ao instante em que o caçula sai de casa. É só a partir daí que marido e mulher voltam a experimentar os níveis de satisfação que tinham como recém-casados.
Tais ilusões prosperam porque são biológica ou socialmente úteis. Um país em que as pessoas parassem de produzir depois de atingir determinado nível de rendimento rapidamente patinharia na estagnação econômica. No caso dos filhos a importância é ainda mais evidente: quem não os tem não passa seus genes adiante. Nesse quesito como em tantos outros, estamos programados para ser enganados.
É claro que o fato de haver ilusões necessárias não implica que todas o sejam. Há muitas, talvez a maioria, que é melhor evitar. Como temos enorme dificuldade para imaginar corretamente como nos sentiremos no futuro, o melhor caminho é perguntar para pessoas que estão vivendo hoje a situação que enfrentaremos como elas se sentem. Um exemplo forte é o de uma doença terminal ou severamente limitante. Se nos perguntam como reagiríamos, muitos, do alto de sua saúde, dirão que prefeririam morrer. Entretanto, a esmagadora maioria dos que recebem um diagnóstico sombrio ou sofrem um acidente não tenta o suicídio. Perguntar a um bom número deles como se sentem é provavelmente uma apreciação mais realista do que a fornecida por nossa imaginação.
Esse remédio, entretanto, é muito pouco utilizado. Segundo Gilbert, isso ocorre porque, entre as falhas de fabricação de nosso cérebro, está aquela que faz com que nos vejamos como um sujeito individual e único. É claro que somos todos únicos, mas somos também muito mais parecidos uns com os outros do que gostamos de supor.

Hélio Schwartsman

As proteínas salvadoras do Dr. Hecht

Posso ter deixado escapar, mas não vi em lugar nenhum da imprensa brasileira, com o devido destaque, a notícia do ano em biologia: cientistas de Princeton (EUA) criaram 1 milhão de proteínas artificiais e conseguiram provar que algumas delas funcionam em organismos vivos. Melhor: demonstraram que elas podem salvar a vida de bactérias marcadas para morrer.
É um grande feito da biologia sintética, nova moda no campo das biotecnologias. Esse ramo de pesquisa se dedica a projetar e construir componentes e sistemas biológicos que não existem na natureza. Coisas como a bactéria "sintética" anunciada por Craig Venter em maio do ano passado, na realidade um carcaça de bactéria na qual se injetou todo um genoma (coleção de genes de uma espécie ou indivíduo) construído em laboratório.
A nova façanha, realizada pelo grupo de Michael Hecht, fez coisa diferente. Enquanto Venter se limitou, em grande parte, a copiar sequências de genes existentes na natureza, Hecht construiu DNA com conteúdo inteiramente inédito. Usou, no entanto, conhecimento acumulado por sua equipe para fazê-lo de modo que as proteínas resultantes se enovelassem de forma previsível e se tornassem funcionais.
Uma explicação se faz necessária neste ponto. Se você tem boas noções de biologia molecular, pode pular os próximos quatro parágrafos, em itálico.
Proteínas são moléculas que carregam o piano da vida. Não há organismo que não dependa delas para construir um corpo e realizar as funções que o mantêm vivo. Essas substâncias são compostas por arranjos sequenciais de subcomponentes chamados aminoácidos.
Existem 20 aminoácidos na natureza. Cada proteína tem sua identidade e função caracterizadas por um número deles, centenas ou milhares, arranjados numa certa ordem (sequência). A especificação dessa ordem se encontra no DNA (genes).
Organelas especiais da célula, chamadas ribossomos, conseguem traduzir a sequência de DNA em sequência de aminoácidos. Assim se fabricam as proteínas necessárias num determinado momento.
O "colar" de aminoácidos que sai do ribossomo, no entanto, só adquire sua função depois que a proteína começa a se enrolar sobre si mesma, obedecendo a certas afinidades eletroquímicas entre suas partes. É o processo de "enovelamento", no jargão dos biólogos moleculares (ou "folding", em inglês).
Agora, de volta ao assunto principal. Vale dizer, as proteínas milagrosas do Dr. Hecht e sua trupe de sintetizadores aminoácidos.
Eles partiram de uma constatação matemática trivial: a combinatória de 20 aminoácidos arranjados às centenas ou milhares resulta num número de proteínas possíveis muito maior do que se encontra na natureza. A espécie humana, por exemplo, emprega uma centena de milhares. O time de Princeton, sozinho, criou 1 milhão, e nada impede que venha a criar vários milhões.
A pergunta seguinte já era uma hipótese: Será que algumas das proteínas possíveis, mas não encontradas no mundo vivo, funcionaria tão bem quanto as naturais? Elas só não estão por aí porque a seleção natural não teve a chance de testá-las. Outras chegaram primeiro e deram conta do recado.
Uma analogia pode ajudar a entender o raciocínio de Hecht. Pense na disposição de teclas Qwerty inventado em 1873 pelo americano Christopher Latham Sholes. Adotada nas máquinas de escrever Remington, disseminou-se pelo mundo e até hoje predomina em computadores. Mesmo que alguém invente um teclado mais funcional, vai ser complicado substituir o Qwerty.
Para selecionar quais proteínas artificiais funcionariam, em meio ao milhão de sequências inventadas, a equipe de Princeton partiu para tentativa e erro. Contaram para isso com a ajuda de 27 cepas de bactérias "marcadas para morrer", mutantes que careciam de proteínas cruciais para sobreviver em determinadas condições de cultivo.
O passo seguinte foi testar as proteínas, uma por uma. Encontraram quatro capazes de salvar a vida das bactérias deficientes. (Quem quiser ou precisar de detalhes científicos pode encontrá-los no artigo que o grupo publicou no periódico científico "PloS One".)
"Isso nos diz que kit de peças moleculares para a vida não precisa se limitar às peças - genes e proteínas - que já existem na natureza", afirma Hecht em comunicado da universidade. "Nosso trabalho sugere que a construção de genomas artificiais capazes de sustentar vida celular pode estar ao nosso alcance."
Não vai demorar muito para alguém falar, em tom de reprovação, que eles estão brincando de Deus (sempre achei essa expressão tremendamente poética).
Por mim, tudo bem. Só vou começar a me preocupar quando esses caras da biologia sintética começarem de fato a produzir micro-organismos com funções escolhidas e quiserem liberá-las no ambiente.

Marcelo Leite

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Crise de abstinência!



Blog de Josias de Souza

Uma esmolinha vitalícia, pelo amor de Deus!



Blog de Josias de Souza

Ataques contra o Brasil

As editoras Penguin e Companhia das Letras colocaram na praça um dos mais vivos e impressionantes relatos sobre parte importante da história brasileira. Trata-se do livro "O Brasil holandês", organizado pelo historiador pernambucano Evaldo Cabral de Mello.
Centenas de correspondências de holandeses que invadiriam o Brasil e de luso-brasileiros usurpados no Nordeste relatam não só os aspectos das invasões e escaramuças nas "praias e matos" de Olinda e Recife.
Há também descrições precisas e inventários pormenorizados da produção açucareira à época, do número de engenhos, das facilidades de transporte das riquezas da terra e dos costumes da gente.
A Zuikerland (terra do açúcar), como se referiam a Pernambuco, foi invadida e ocupada pelos holandeses entre 1630 e 1654.
Antes, os mesmos inimigos tiveram uma experiência fracassada na Bahia. Entraram em 1624 e saíram corridos um ano depois.
As invasões foram levadas a cabo pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, uma espécie de sociedade anônima capitalista que contrastava tremendamente à época com a organização econômica primitiva de outras potências marítimas como Espanha e Portugal.
A maior parte das informações é descrita pelos próprios protagonistas de então, em cartas e documentos organizados por Cabral de Mello.
O que mais impressiona nessa empreitada é não só o diagnóstico feito à época pelos invasores, com cálculos minuciosos de custos e de lucros potenciais, mas a descrição crua e invejosa das riquezas que o Brasil detinha: açúcar, pau brasil, imensas áreas cultiváveis, bom tempo e uma enorme variedade de frutas e peixes que impressionavam os invasores.
"Enfim, esta é uma terra onde não se pode morrer de fome", diz um dos documentos...
Enquanto o organizador nos conduz por aquele período, também nos faz pensar sobre outros "argumentos favoráveis ao ataque contra o Brasil".
380 anos depois, vemos que o Brasil ainda vai mal. E que hoje é alvo de "conquistadores" ainda piores, pois internos. Totalmente imunes a qualquer tipo de punição ou Justiça e sem o menor medo de cadeia.
A maioria deles, de conterrâneos com legitimidade política, eleitos pelo próprio povo que usurpam com aposentadorias, nepotismo e outros desvios escandalosos.
Tudo isso largamente documentado, nos jornais do dia, não em cartas centenárias.
O livro de Cabral de Mello traz a descrição de um oficial holandês de como eram tratados seus próprios conterrâneos se, terminado o período de saques autorizados, fossem apanhados pilhando. No caso, foram quatro soldados que furtaram vinho de uma adega:
"(Um deles, filho de pais respeitáveis e abastados em Leipzig) foi então condenado à morte e, para escarmento de outros demasiadamente amantes do vinho de Espanha, enforcado; e os outros três foram violentamente açoitados sobre um alto poste de pedra."

Fernando Canzian

O mito da competitividade

O mote do novo governo é o mesmo mote de governos passados. Antes de pronunciar seu discurso anual sobre o estado da União, o presidente Obama já indicou qual será o tema: a competitividade. O Conselho Consultivo da Casa Branca para a Recuperação Econômica passará a se chamar Conselho de Emprego e Competitividade. E em discurso no rádio, sábado, o presidente declarou que "somos capazes de superar qualquer país do planeta em termos de competitividade".
Pode ser uma manobra política astuta. Seria possível alegar que Obama decidiu recorrer a um velho clichê em defesa de uma boa causa, como forma de justificar um aumento muito necessário dos gastos públicos, diante de um eleitorado que vem sendo intensamente doutrinado quanto à postura de que gastos governamentais são sempre um mau negócio.
Mas é melhor falar sério: discursar sobre "competitividade" como objetivo representa um erro fundamental de orientação. Na melhor das hipóteses, essa posição representa um diagnóstico incorreto de nossos problemas. Na pior, pode conduzir a políticas baseadas na falsa ideia de que aquilo que é bom para as grandes empresas norte-americanas é bom para os Estados Unidos.
Quanto ao erro de diagnóstico: que sentido faz encarar nossos problemas atuais como resultado de uma falta de competitividade?
É verdade que teríamos mais empregos se exportássemos mais e importássemos menos. Mas Europa e Japão o fazem, e mesmo assim estão com suas economias deprimidas. E não temos como exportar mais e importar menos a não ser que encontremos outro planeta ao qual vender. Sim, podemos exigir que a China reduza seu superavit comercial -- mas se um confronto com a China é a proposta de Obama, ele deveria declará-lo abertamente.
Além disso, embora os Estados Unidos venham registrando deficit comerciais, eles são menores do que os existentes antes do início da Grande Recessão. Seria útil que os pudéssemos reduzir ainda mais. Mas, em última análise, estamos nessa situação desagradável porque passamos por uma crise financeira, e não porque as companhias norte-americanas perderam a capacidade de competir com rivais estrangeiros.
Mas não haveria alguma utilidade em pensar em nosso país como se fôssemos a Cia. Estados Unidos, concorrendo no mercado mundial? Não.
Reflita: um líder empresarial que amplie os lucros de sua empresa ao reduzir seu número de funcionários é visto como bem-sucedido. Bem, foi ou menos isso que aconteceu nos Estados Unidos recentemente: o emprego caiu consideravelmente mas os lucros vêm batendo recordes. Quem, exatamente, considera a situação como um sucesso econômico?
Ainda assim, seria possível alegar que debater competitividade ajuda Obama a aquietar as alegações de que ele é hostil aos interesses das grandes empresas. Muito bem, desde que o presidente perceba que os interesses de grandes empresas nominalmente "norte-americanas" e os interesses do país, que jamais foram os mesmos, estão hoje ainda menos alinhados que no passado.
Um exemplo é a General Electric, cujo presidente-executivo, Jeffrey Immelt, recentemente foi indicado para o conselho de assessoria presidencial cujo alteração de nome mencionei acima. Nada tenho contra Immelt ou a GE. Mas, já que menos de metade de seus empregos estão nos Estados Unidos e menos de metade de suas receitas provém de suas operações norte-americanas, os resultados da GE pouco têm a ver com a prosperidade norte-americana.
Aliás, houve quem elogiasse a indicação de Immelt sob a alegação de que ele ao menos representa uma companhia que produz coisas, em lugar de ser apenas mais um mago das finanças. Lamento discordar, mas hoje em dia a GE gera mais receita com suas operações financeiras do que com suas operações industriais -- de fato, a GE Capital, que recebeu garantia governamental a suas dívidas, foi uma das maiores beneficiárias do resgate a Wall Street.
Assim, o que a adoção da retórica da competitividade pelo governo significa em termos de política econômica?
A interpretação favorável, como eu disse, é a de que se trata apenas de uma embalagem para uma estratégia econômica cujo pivô seria o investimento público -- um investimento cujo objetivo seria de fato criar empregos agora e preparar o crescimento em longo prazo. A interpretação desfavorável seria a de que Obama e seus assessores realmente acreditam que a economia está em crise porque foram duros demais para com as empresas, e que os Estados Unidos precisam agora é de reduções nos impostos empresariais e desregulamentação generalizada.
Meu palpite é o de que o objetivo principal é camuflagem, nesse caso. E se o presidente propuser aumento sério nos gastos com infraestrutura e educação, ficarei satisfeito.
Mas mesmo que proponha boas medidas, o fato de que Obama sinta a necessidade de embalá-las em más metáforas representa um triste comentário sobre a situação do debate nacional.
A crise financeira de 2008 poderia ter sido um momento de aprendizado, uma lição prática sobre o que pode acontecer de errado caso uma economia de mercado receba a atribuição de se regulamentar sozinha. E não devemos esquecer que economias altamente regulamentadas, como a da Alemanha, se saíram muito melhor que a nossa em manter o nível de emprego depois da crise. Por qualquer que seja o motivo, porém, o momento de aprendizado chegou e se foi sem que aprendêssemos coisa alguma.
Obama pode se sair bem, em termos pessoais: seus índices de aprovação estão subindo, a economia mostra sinais de vida e suas chances de reeleição parecem boas. Mas a ideologia que causou o desastre econômico de 2008 está por cima uma vez mais -- e parece provável que isso continue até que novo desastre seja caus.

Paul Krugman

domingo, 23 de janeiro de 2011

De boca em boca, vai-se à boquinha vitalícia: pen$ão!



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Águas de janeiro!



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Luto!



Blog de Josias de Souza

A meteorologia em nossas vidas

O brasileiro nunca deu muita bola para a meteorologia, que, nos países verdadeiramente temperados, chega a ser uma obsessão nacional. A diferença se explica. Por aqui, a previsão climática é quase monótona: há o tempo seco e o chuvoso, o período de calor escaldante e o suportável. A vida não muda radicalmente quer estejamos num ou noutro. Já nas nações de altas latitudes, a estação dita o ritmo de nossas existências: o que se pode fazer no inverno é muito diferente das atividades de verão, e isso afeta desde os esportes que podem ser praticados até os estados de espírito.
No período do frio, a vida se volta para ambientes internos, a luz solar escasseia, cada incursão ao mundo exterior exige preparativos, sendo, portanto, revestida de solene gravidade. Por contraste, o verão ganha uma ligeireza quase institucional: um autêntico "midwestern" norte-americano se vestirá de bermudas e camiseta em meados de setembro mesmo que a temperatura atinja 5ºC ao cair do dia. Afinal, ainda é verão.
Por aqui, são necessário eventos catastróficos como o da região serrana do Rio de Janeiro para nos fazer lembrar da importância do clima. É claro que a quantidade de chuva é apenas um dos ingredientes da tragédia. O bom Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) já havia observado que as consequências de desastres naturais são em larga medida determinadas pelos homens. Como escreveu o genebrino a respeito do grande terremoto de Lisboa (1755), não foi a natureza que, numa área relativamente exígua "reuniu 20 mil casas de seis ou sete andares". Ele vai ainda mais além e pergunta-se "quantos infelizes pereceram neste desastre, porque quiseram pegar, um suas roupas, outro, sua papelada, outro, seu dinheiro?".
Não sei se a Defesa Civil tem um patrono, mas, se não tem, deveria pegar logo Rousseau. Até onde sei, é ele que, com essas reflexões, inaugura a moderna abordagem sociológica desse tipo de evento. É claro que o fez num contexto um pouco diferente, que já explorei antes neste espaço. O bom Jean-Jacques disse o que disse em meio a uma disputa teológica. Ele se contrapunha a Voltaire (1694-1778), que, em seu "Poema sobre o Desastre de Lisboa", utilizara o sismo para introduzir o problema da teodiceia: se existe um Deus benevolente, onisciente e onipotente, como pode permitir o sofrimento de tantos inocentes? Rousseau, na ânsia de isentar a Providência de qualquer responsabilidade, preferiu lançar a culpa sobre os homens.
Deixemos, porém, o Criador de lado e nos concentremos na interação natureza-sociedade. Seria uma insanidade pretender, contra Rousseau, que erros na política de ocupação do solo e comportamentos temerários não são capazes de magnificar os efeitos de calamidades naturais. Mas é importante observar que só as chamamos de "naturais" porque há variáveis geológicas e atmosféricas envolvidas. O peso de cada qual é uma questão aberta --e com proporções que variam bastante conforme o evento.
De um modo geral, eu diria que, especialmente no Brasil, onde a meteorologia não goza de grande Ibope e onde a tradição acadêmica valoriza as chamadas forças históricas em detrimento de fatores humanos, geográficos e mesmo do bom e velho acaso, o clima acaba sendo um pouco menosprezado.
Existem, é claro, escolas alternativas. O melhor exemplo talvez seja o do geógrafo Jared Diamond, que, em seus livros "Armas, Germes e Aço" e "Colapso", coloca a geografia e o clima como explicações centrais para determinar surgimento, expansão e desaparecimento de civilizações.
Na mesma linha de pesquisa vão Raymond Fisman e Edward Miguel que, em "Economic Gangsters: Corruption, Violence, and the Poverty of Nations" (gângsteres econômicos: corrupção violência e a pobreza das nações), atribuem boa parte dos desastres da África aos caprichos do clima. Eles analisaram a relação entre secas e guerras civis e concluíram que o fator climático explica os conflitos até melhor do que as divisões étnicas e religiosas. Para esses economistas, uma queda de 5% no PIB, comum em vários países nos anos de seca, eleva em 50% (de 20% para 30%) o risco de ocorrer uma guerra civil nos 12 meses seguintes. Saindo da abstração dos números, para o sujeito que vive ali, cada vez que vem as chuvas falham, a chance de ocorrer um conflito no ano subsequente é de uma em três. E vale lembrar que a África é a região tropical do planeta com maior propensão a estiagens. É comum no continente que um país tenha de dois a três anos secos por década.
Fisman e Miguel também acharam correlações mais improváveis, como aquela entre a falta de chuvas e o maior número de mulheres assassinadas por bruxaria na Tanzânia. De novo, a deterioração das condições econômicas leva as famílias a sacrificar alguns de seus membros. A escolha acaba recaindo sobre as "bruxas", isto é, as duplamente vulneráveis: mulheres mais idosas. Nós, no conforto de nossos supermercados, já nos esquecemos de que, durante a maior parte de sua existência, os homens tiveram de apelar para infanticídios, parricídios, matricídios e vários outros "cídios" em momentos de extrema privação. Parte da humanidade ainda vive nessa era neolítica.
E essas ponderações sobre o clima nos levam à questão fundamental: de quem é a culpa pela tragédia? É a natureza/Deus ou as autoridades/cidadãos? Para responder a isso precisamos recorrer à ideia de percepção do risco, conceito onde se materializam as reações humanas diante das incertezas naturais.
E essa é uma disciplina na qual tiramos nota zero. Somos bons para fugir dos perigos que a natureza inscreveu em nossos genes: cobras, altura, plantas amargamente venenosas. Aí, a reação é imediata e nem precisamos ter certeza de que "aquela cobra" não é um simples graveto antes de sair correndo.
A questão é que esses perigos antigos são quase inexistentes nos ambientes urbanos em que vivemos hoje. Riscos modernos mais verossímeis são enchentes e outros cataclismos, acidentes automobilísticos, e venenos saborosos, como charutos e picanha. Não estamos programados para sair correndo cada vez que avistamos uma casa construída em morro nem para fugir de motocicletas. Pior ainda, corremos (e pagamos) para entrar numa churrascaria. É só através de operações intelectuais que tomamos ciência do perigo envolvido nessas situações. E, infelizmente, nem sempre reagimos a essas abstrações. Embora a cultura seja a outra via pela qual moldamos nosso comportamento, ela não é tão eficiente quanto os medos viscerais. O resultado é que ocupamos áreas de risco sem nem pestanejar. A pobreza é decerto um ingrediente a determinar quem habita onde, mas não é tudo. Mais de 90% da população norte-americana vive gostosamente em regiões onde o risco de grandes terremotos é de moderado a alto.
Um jeito de mudar essa equação seria multiplicar nossa expectativa de vida por 1 milhão. Para um ser humano que vivesse 70 milhões de anos, o ato de atravessar uma rua seria percebido como mais perigoso do que mergulhar num tanque cheio de tubarões brancos em jejum. O tempo é a chave quando pensamos em risco, isto é, em frequências relativas.
Não é de meu feitio defender autoridades públicas, mas o argumento das chuvas excepcionais não é tão estúpido. Se esperarmos o tempo necessário, é uma fatalidade aritmética que, num dado verão, o volume de água precipitada supere a capacidade da melhor engenharia de resistir a enchentes e sobrevenha uma catástrofe. Vale lembrar que, por definição, cada estação chuvosa tem uma chance em 500 de produzir a pior enchente dos últimos 500 anos. Ou uma em cem de produzir a cheia do século. Você escolhe.
Só o que podemos fazer é melhorar constantemente nossas defesas, para tentar reduzir o número de vítimas e estragos que essa "tempestade perfeita" é capaz de produzir. Nesse sentido, é mais do que legítimo que aproveitemos tragédias como a atual para pressionar as autoridades a tomar atitudes. Cobranças políticas, ainda que "injustas", são menos abstratas do que tabelas de sinistralidade. Tendem, portanto, a produzir resultados mais concretos.

Hélio Schwartsman

A China vai a Nixon

Por conta da atual visita do presidente chinês Hu Jintao aos Estados Unidos, a mídia está repleta de histórias sobre o poderio econômico chinês. E essas histórias são totalmente verdadeiras: embora a China continue a ser um país pobre, está crescendo rapidamente e, considerado seu imenso tamanho, já avançou bastante em seu esforço para se equiparar aos Estados Unidos como superpotência econômica.
O que é igualmente verdade, porém, é que a China se envolveu em uma trapalhada monetária que está se agravando a cada mês. Além disso, a resposta do governo chinês ao problema -- em meio à paralisia decisória provocada pela deferência aos interesses especiais, à falta de clareza intelectual e ao uso de táticas de acusação torna claro que não podemos contar com atitudes decisivas e efetivas de parte da liderança chinesa. Na verdade, na atual situação os chineses estão agindo de modo bem parecido ao nosso.
Até que ponto as coisas se complicarão? Os alertas de alguns analistas de que a China pode causar nova crise mundial parecem exagerados. Mas o fato de que haja pessoas dizendo esse tipo de coisa é indicação de até que ponto a situação parece descontrolada.
A raiz das trapalhadas chinesas é a política de uma cotação cambial fraca para a moeda do país, que alimenta um superavit comercial artificialmente elevado. Como já enfatizei em passadas colunas, essa política prejudica o resto do mundo, e eleva o desemprego em muitos outros países, entre os quais os Estados Unidos.
Mas uma política econômica pode ser ruim para nós sem que por isso seja boa para a China. De fato, a política cambial chinesa é um sistema sob o qual todos saem perdendo, porque ela a um só tempo deprime o emprego nos Estados Unidos e produz uma economia superaquecida e propensa à inflação na China.
Uma maneira de compreender aquilo que está acontecendo é considerar a inflação como no caminho do mercado para desfazer a manipulação cambial. A China vem usando uma moeda fraca para manter seus preços e salários baixos em termos de dólares; as forças de mercado reagem forçando alta desses preços e salários, o que reduz a vantagem competitiva artificial. Algumas estimativas que vi sugerem que, ao ritmo atual de inflação, a subvalorização chinesa pode desaparecer dentro de dois ou três anos -o que não seria suficientemente rápido, mas ainda assim viria antes do que muita gente espera.
Os líderes chineses, no entanto, estão tentado impedir esse desfecho, não apenas para proteger os interesses dos exportadores mas porque a inflação é ainda mais impopular na China do que em outros países. Um grande motivo é que a China na prática já explora seus cidadãos por meio da repressão financeira (e de outras formas de repressão, também, mas elas não são relevantes para o tema). As taxas de juros sobre os depósitos bancários ficam limitadas a apenas 2,75%, ou seja, abaixo da taxa oficial de inflação -- e quase todo mundo acredita que a inflação real chinesa seja substancialmente mais alta do que o governo admite.
Preços em alta rápida, ainda que acompanhados por aumentos de salários, agravarão ainda mais essa exploração. Não admira que o público chinês esteja zangado com relação à inflação e que os líderes do país desejem detê-la.
Mas por qualquer que seja o motivo -- o poder dos interesses exportadores, a recusa em fazer qualquer coisa que indique concessão diante de exigências norte-americanas ou simples incapacidade de pensar com clareza --, eles não estão dispostos a lidar com a causa essencial, permitindo uma alta de sua moeda. Em lugar disso, tentam controlar a inflação elevando as taxas de juros e restringindo o crédito.
Isso é destrutivo do ponto de vista mundial: já que boa parte da economia mundial continua deprimida, a última coisa de que necessitamos são agentes econômicos importantes promovendo políticas monetárias rígidas. Ainda mais importante, no que tange à China, porém, é que essas medidas não estão funcionando. É difícil impor restrições ao crédito, e injeções de hot money vindas do exterior ajudam a solapá-las ainda mais.
Já que os esforços para desaquecer a economia não estão funcionando, a China vem tentando limitar a inflação por meio de controles de preços -- uma política que raramente funciona. É uma medida que fracassou de maneira especialmente dolorosa na última vez em que foi tentada nos Estados Unidos, durante o governo Nixon. (E sim, isso significa que agora é a China que está vindo a Nixon.)
Que possibilidades restam, portanto? Bem, a China vem recorrendo à tática da acusação, e alega (falsamente) que a responsabilidade é do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), por estar imprimindo dinheiro demais. Mas embora culpar o Fed possa fazer com que os líderes chineses se sintam melhor, isso não vai mudar a política monetária dos Estados Unidos, ou ajudar a deter o monstro inflacionário chinês.
Será que isso pode se tornar uma crise grave? Se eu não conhecesse história econômica, consideraria a ideia implausível. Afinal, a solução das trapalhadas monetárias chinesas é tão simples quanto óbvia: basta permitir que o câmbio suba, o mais rápido possível.
Mas conheço história econômica, o que significa que sei que governos muitas vezes se recusam, ocasionalmente por anos, a fazer o óbvio -- especialmente quando há taxas de câmbio envolvidas. Em geral, eles tentam manter suas taxas de câmbio artificialmente fortes, e não artificialmente fracas, mas as duas coisas podem causar grande estrago.
Assim, a mais recente superpotência econômica parece mesmo estar a caminho de uma crise econômica, que causará danos colaterais ao mundo inteiro. Será que precisamos disso?

Paul Krugman

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Tribunal de (faz de) Contas da União!



Blog de Josias de Souza

Desguarnecido!



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Num cinema de Brasília...!



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São os seus olhos

"iPhone é uma seita" --diz minha mulher em um misto de despeito e ironia-- "cheia de clubes, códigos e séquitos". Não se pode negar a ela certa razão. Desde seu surgimento, já se suspeitava que o aparelhinho da Apple que foi lançado como um celular e explorado como smartphone pertencia, na verdade, a uma categoria diferente de hardware. A demora dos fabricantes de telefones, câmaras digitais, GPS e, principalmente, consoles portáteis de videogames em perceber isso custou-lhes uma fatia considerável de mercado.
As transformações proporcionadas pelo iPhone foram tamanhas que não causa espanto o fato de que até hoje, quase 4 anos depois de seu lançamento, ele próprio ter mudado muito pouco. Descontados alguns pequenos ajustes estruturais e melhorias em processadores, o aparelho continua praticamente o mesmo. Mesmo assim seus fãs (são poucos os que podem ser classificados simplesmente como "usuários") só aumentam. Até mesmo a câmera, que até o lançamento do iPhone 4 era tão ruim quanto qualquer outra câmara de celular, teve sua glória. Até hoje ela ainda é responsável pela maioria dos mais de cinco bilhões de fotos armazenadas no Flickr.
Mas até há bem pouco tempo, essa câmera não era mais do que uma câmera de bolso. Já estava mais do que na hora de alguém reunir as características de geolocalização (leia-se: FourSquare), redes sociais (Facebook), microblogging (Tumblr) e mensagens curtas (Twitter) em um aplicativo fácil, bonito e divertido de usar. Foi mais ou menos isso que o pessoal do Instagram fez. O resultado não poderia ser mais impressionante: lançado em Outubro, o aplicativo atingiu um milhão de usuários em dois meses e meio. E só vem crescendo.
Se você acompanha o Twitter ou o Facebook, talvez já tenha reparado em links para um tal de http://instagr.am --que, a princípio parece mais um daqueles repositórios de fotos, embora seja muito mais do que isso. O Instagram é um dos novos serviços sociais dificílimos de explicar para quem não está familiarizado com a rede (aquele que antigamente chamaríamos de seu avô, depois seu pai e hoje bem pode ser seu irmão, colega, filho, sobrinho ou neto). Como, afinal, definir um aplicativo de sociogeolocalização fotográfica que coloca efeitos especiais em fotos e as compartilha, integrando-as com o Flickr, o Facebook, o Twitter e o Foursquare?
Sua mecânica não poderia ser mais simples: o "fotógrafo" tira uma foto ou a seleciona entre as que tem armazenadas no telefone; aplica sobre ela, se quiser, alguns efeitos especiais que simulam câmeras e processos de revelação antigos, escreve uma mensagem curta para descrevê-la e a coloca online. As pessoas que o seguem podem marcar que gostaram da foto e colocar comentários curtos sobre ela.
O que ele tem de especial, afinal? Nada. E tudo. O Instagram mostra o olhar particular que se tem de cenas, a princípio, corriqueiras. Se for um exercício frequente, o acervo pode, com o tempo, mostrar um ponto de vista bem particular e autoral. Essa é a riqueza das redes sociais instantâneas, categoria que não existia há cinco anos e que hoje se transforma, cada vez mais, em um acumulado de visões de mundo.
Por enquanto o serviço só está disponível para iPhone. Espero que ele lance logo uma versão para outros aparelhos. A brincadeira sempre fica melhor quando mais gente participa.

Luli Radfahrer

Notícias de lá e de cá

Parece que a questão já está resolvida. O técnico da seleção da Itália, Massimo Barbolini, não vai aceitar o convite para dirigir o Galatasaray, time turco e maior rival do Fenerbahce, da levantadora Fofão e do técnico Zé Roberto Guimarães. A Federação Italiana vetou. O argumento? Não quer o técnico da seleção com dupla função. Barbolini não gostou, até argumentou: "Por que no basquete o técnico pode comandar dois times e no vôlei não?" Mesmo assim, vai ter que se conformar.
O argumento dele é o seguinte: neste período de campeonatos nacionais, as seleções ficam paradas. Seria uma chance que ele teria de um novo trabalho e de se aperfeiçoar. Mas não teve jeito. O técnico Zé Roberto, por exemplo, trabalha com a seleção brasileira e neste período competições de clubes dirige o Fenerbahce.
Aliás, uma boa notícia para a seleção brasileira feminina foi a divulgação do novo ranking mundial da Federação Internacional de Vôlei. O Brasil, mesmo tendo perdido a final do Campeonato Mundial, está em primeiro lugar. Os Estados Unidos estão em segundo, seguidos por Japão, Itália, Rússia, China, Polônia e Cuba.
No masculino, a liderança no ranking também é do Brasil, atual tricampeão mundial. A Rússia, mesmo com o decepcionante quinto lugar no Mundial, permanece em segundo lugar. A Sérvia está em terceiro, seguida por Cuba, a sensação do último Mundial. Os cubanos, com uma nova geração liderada pelo garoto prodígio Wilfredo Leon, de 17 anos, foram vice-campeões mundiais, subiram no ranking e derrubaram os Estados Unidos, que caíram para o quinto lugar.

Cida santos

Austrália testa mosquito antidengue

Não é nova a ideia de modificar mosquitos transmissores de moléstias como dengue e malária para que parem de fazê-lo e, assim, possibilitar o controle dessas doenças. No Brasil, por exemplo, Margareth de Lara Capurro pesquisou mosquitos anofelinos transgênicos para combater malária.
Agora, na Austrália, pesquisadores se preparam para testar uma bactéria excêntrica na luta contra a dengue, sem lançar mão de controversas modificações genéticas. Eles contam com ajuda de pelo menos um brasileiro, Luciano Moreira, do Instituto de Pesquisas René Rachou (MG), da Fiocruz (se você é assinante, leia aqui reportagem de Reinaldo José Lopes na Folha sobre a pesquisa, publicada um ano atrás).
A proposta é tornar os insetos resistentes ao parasita causador da doença. No caso da dengue, um flavivírus; no da malária, micro-organismos do gênero Plasmodium. Se o corpo do mosquito se torna um ambiente inóspito para o agente, a doença fica sem vetor e a transmissão se interrompe.
A bactéria alistada na Austrália se chama Wolbachia pipientis. De início, explica reportagem de Martin Enserink no periódico "Science", a ideia era empregá-la para contrabandear para dentro do mosquito genes que o tornasse refratário ao vírus.
Aí se descobriu que a mera infecção do inseto pela bactéria de tipo normal, tal como encontrada na natureza, fazia emergir nele resistência à partícula viral. Ficou desnecessário recorrer a genes estranhos. De veículo portador de armamento, a Wolbachia passou a ser vista pelos estudiosos como a própria arma capaz de decidir a guerra.
Apesar de microscópica, a bactéria tem lá suas semelhanças com uma bomba atômica. Ela infecta mais ou menos metade de todas as espécies de insetos existentes na Terra. E possui uma capacidade incrível de se espalhar pela população desses artrópodes.
É a candidata ideal para atingir o número astronômico de mosquitos chupadores de sangue que há por aí, como pode experimentar qualquer paulistano na própria pele. O micróbio passa de uma geração para outro pegando carona nos ovos dos insetos. Em outras palavras, toda a prole de uma fêmea infectada carrega a sua Wolbachia. Uma vez introduzida na espécie, não demora em se tornar onipresente.
O problema é que a Wolbachia não está presente em populações naturais de anofelinos (malária) nem de Aedes aegypti, que transmite a dengue. O grupo de Scott O'Neill com que Luciano Moreira colaborou, na Universidade de Queensland (Austrália), conseguiu introduzir a bactéria no mosquito, injetando-a em seus embriões.
Sua proposta agora é liberar mosquitos infectados e resistentes ao vírus da dengue em duas localidades da região tropical australiana, onde a dengue está presente. Seriam em princípio dez insetos por semana para cada domicílio, por 12 semanas seguidas.
O'Neill acha que a infecção se espalhará na velocidade de 10 km/ano, mas precisa ter certeza disso para calibrar o tamanho da esquadrilha antidengue. O passo seguinte, segundo seu planejamento, seria conseguir permissão do Vietnã e da Tailândia para experimentos de maior escala.

Marcelo Leite

A Alemanha, olho no olho

Quando você ouve a palavra Alemanha, o que vem à cabeça? Volkswagen, com certeza. Toda uma geração de brasileiros foi introduzida ao mundo do automóvel graças ao "carro do povo". Futebol, também. Ainda mais agora que um brasileiro com cara e cor de brasileiro, o Cacau, é integrante da seleção alemã.
Mas é bom começar a pensar em mais coisas às quais vincular a Alemanha. Nos próximos meses, a diplomacia alemã fará uma pesquisa para saber qual é a percepção do brasileiro sobre o país.
São os preparativos para o "Ano da Alemanha no Brasil", que está nos planos do governo e cujo lançamento oficial depende apenas do sinal verde do Itamaraty --que certamente será dado.
Os eventos ocorrerão no segundo semestre de 2013, primeiro de 2014. Cobrirão um panorama de 360 graus, de política/instituições à ciência e tecnologia, de economia à cultura. E a intenção não é a de chegar com o prato pronto, mas construir a programação junto com os brasileiros.
A iniciativa tem como um de seus principais objetivos dar carne à parceria estratégica entre Brasil e Alemanha, para evitar que se torne rótulo oco.
Afinal, parcerias estratégicas têm sido anunciadas a três por dois, entre os mais diferentes países. O Brasil é parceiro estratégico dos Estados Unidos, da União Europeia, da Argentina, além da Alemanha, para ficar em apenas alguns exemplos.
O embaixador Wilfried Grolig pretende que a parceria estratégica signifique que os dois países sentem-se, olho no olho, para discutir todos os pontos não só da relação bilateral mas da agenda planetária.
A propósito: a diplomacia alemã acha que o Brasil tem, sim, que envolver-se em assuntos que parecem excessivamente distantes, como o eterno conflito no Oriente Médio ou a situação no Irã. É uma visão contrária à que tem sido reiteradamente exposta por setores diplomáticos dissidentes da condução anterior do Itamaraty e também por alguns jornais.
Se alguém se interessa por saber, eu também acho que o Brasil está no mundo e, portanto, tudo o que acontece no mundo lhe diz respeito.
No caso específico da Alemanha, parece bom negócio dar à parceria estratégica um caráter que vá além do rótulo (imponente, mas desgastado pelo excesso de uso).
Primeiro porque é o parceiro ideal para lutar pela reforma da governança global, em especial do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o coração do sistema multilateral. Nem Brasil nem Alemanha fazem parte do CS, mas são os candidatos naturalíssimos da América Latina e da Europa, respectivamente, se e quando houver a reforma de que tanto se fala.
Juntos, terão mais força para fazê-la avançar, como é óbvio.
Segundo porque é de estrito sentido comum a tese da chanceler Angela Merkel de que o setor financeiro deve ajudar a pagar a conta do estrago global pelo qual foi o principal responsável. O Brasil, vítima por tabela da crise, tem mostrado simpatia por essa tese, mas uma simpatia remota, porque o sistema financeiro brasileiro não teve nem tem os problemas que afetaram ou ainda afetam bancos dos Estados Unidos e da Europa.
Nem vou falar de comércio, que é, nos tempos modernos, componente essencial de qualquer parceira. Mas falo, sim, de um ponto que sempre me incomoda: a Alemanha não planta um só pé de café, mas é grande exportadora de café solúvel. Milagre? Nada. Importa o grão (não só do Brasil), processa-o e exporta o produto, já com maior valor agregado.
Não está na hora de o Brasil passar, ele próprio, a agregar valor a seus produtos básicos? Se a Alemanha quer mesmo ser parceira estratégica, olho no olho, pode ajudar nessa tarefa.

Clóvis Rossi

domingo, 16 de janeiro de 2011

Continua o impasse sobre o PSPN

Apesar da intensa luta dos trabalhadores em educação, o Poder Público brasileiro insiste em manter o descaso em relação ao cumprimento da Lei 11.738. Na esfera Executiva, o MEC, novamente, não publicou nenhuma Portaria (tampouco orientação) indicando o índice de reajuste do PSPN. Em âmbito do Judiciário, mantém-se inalterada a pauta de julgamento da ADI 4.167, a qual gerou o imbróglio com relação à eficácia de todos os dispositivos da Lei do Piso - não obstante o STF ter ratificado a vigência dos itens não alcançados pela Adin, inclusive o que define critério de reajuste anual. Por último, o Congresso Nacional mostrou-se muito mais interessado em garantir o esdrúxulo aumento de 62% para seus membros a aprovar o PL 3.776/08 que definiria fórmula consensual para o reajuste do PSPN, a partir de 2011.
A não aprovação do PL 3.776/08 evidenciou o descaso do Governo e das Lideranças partidárias, que não se importaram em manter o impasse sobre o critério de reajuste do Piso durante o ano de 2011. Assim sendo, uma vez inalterado o texto da Lei 11.738, a correção do PSPN, na visão da CNTE, é de 21,71% (mesmo percentual de reajuste do Fundeb em 2011). Aplicando-se à quantia do Piso em 2010 (R$ 1.312,85), tem-se o valor atualizado de R$ 1.597,87.
Porém, caso o MEC mantenha a sugestão da Advocacia Geral da União de aplicar ao Piso o aumento per capita do Fundeb dos últimos dois anos (ao arrepio da Lei), neste caso, o PSPN seria reajustado em 15,29%, passando de R$ 1.024,67, em 2010, para R$ 1.181,34, em 2011.
Ante o comportamento do Governo e do Parlamento, que pouco ou nada se importaram em resolver o problema do reajuste do PSPN - apesar dos esforços da Confederação junto ao MEC e à Câmara dos Deputados para ver aprovado o PL 3.776 -, a CNTE reitera que a Lei 11.738 está em pleno vigor, razão pela qual convoca suas afiliadas a lutar por sua correta aplicação. Outra frente de mobilização consiste em manter a pressão junto ao STF para julgamento do mérito da ADI 4.167, ação essa essencial para efetivar os princípios da valorização profissional contidos na norma federal.

CNTE

Início chuvoso!



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Flagelo suprapartidário!



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Dilma cobra ética da equipe na 1ª reunião ministerial



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Infeliz Ano Velho!



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O dedo de Deus

Logo que fui morar no Rio, nos anos 90, quis muito conhecer a tão famosa região serrana, e bastou a chegada do primeiro verão de verdade, quando as temperaturas cariocas alcançam fácil os 40 graus, para que procurasse o frescor das montanhas. O conjunto de cidades incrustadas na serra distante pouco mais de duas horas da capital é a pedida quando se quer aliviar um pouco o forno em que se converte a Cidade Maravilhosa entre novembro e março.
O destino era Teresópolis (cujo nome homenageia dona Tereza Cristina, mulher de D. Pedro 2º), que já me encantava à distância: nos dias claros e límpidos, era possível ver desde o Rio o contorno recortado das montanhas, com o pico Dedo de Deus espetando o céu com seu desenho único, atingindo mais de 1.600 metros de altitude.
E assim foi que poucas horas depois de contornar a Baía de Guanabara, seguir pelo começo do interior do Estado do Rio, ali estava a Serra dos Órgãos (na verdade um trecho da Serra do Mar) com toda a sua majestade. A estrada que sobe a serra corre praticamente rente ao conjunto de pedras que formam o maciço em que reina a rocha pontuda como um indicador apontando o caminho que todos os crentes imaginam para si depois da morte. Ver aquela escultura natural gigantesca assim tão de pertinho foi absolutamente emocionante, é e será sempre inesquecível.
Assim como não se há de olvidar os caminhos sinuosos de vales e morros e sulcos profundos entre as rochas que compõem a geografia daquela região, ligando Teresópolis a Araras a Petrópolis e a outras localidades encantadoras, frescor garantido no verão, inverno "europeu" nos meses frios.
Arquitetura, vegetação, clima, tudo lembra mesmo certas regiões da Europa. Como a estradinha que sai de Teresópolis e vai por entre vales e morros até Itaipava e que ostenta durante um longo trecho milhares e milhares de hortênsias em flor. Cenário de filme, a estradinha estreita e calma e o desfile de flores brancas, azuis, lilases...
Não há como impedir que lembranças tão bucólicas, que remetem tanto a paz e harmonia, venham emotivamente à mente diante da tragédia, do caos, do horror desses dias.
A maior tragédia natural da história do país tinha que acontecer logo ali, naquela montanha encantada?
Por que o Dedo de Deus não empurrou as nuvens assassinas para outras plagas, mais planas, onde causariam menos dor? Por que o dedo do homem estava ali para garantir a desgraça?
Talvez. Ou certamente, e isso deve ser tema de muita discussão, sem duvida.
Mas, por hora e por respeito, fica aqui apenas a lembrança carinhosa daquelas terras, a oração aos que se foram e a solidariedade aos que sofreram perdas tão terríveis.

Luiz Caversan

Pregando para lobos

Tomo café da manhã, em geral, com o jornal "El País" à mesa, porque, nessa hora, minha mulher está lendo a Folha e eu não sou louco de tomar o jornal dela.
A manchete da sexta-feira me choca: 'O melhor Obama surge do horror do Arizona'. A abertura do texto choca ainda mais: 'Barack Obama logrou o milagre de converter o sangue em esperança com seu discurso de quarta-feira em Tucson [Arizona], no qual lançou uma mensagem contra o ódio na política que definirá o resto de seu mandato'.
Depois, leio Andrea Murta, na Folha, e ela confirma, embora da forma sóbria que é mais adequada para tratar de discursos presidenciais (seja quem for o presidente), que a fala de Obama agradou até aos republicanos.
Foi, portanto, um sucesso de público. De crítica, nunca duvido que o seja porque se trata de um orador tremendamente hábil, brilhante mesmo, concordemos ou não com suas teses.
Sou, no entanto, obrigado a discordar desse consenso, ainda que seja sempre arriscado marchar com o passo errado.
Do meu ponto de vista, Obama era o homem certo, no lugar certo, com o discurso certo mas para o público errado.
Breve retrospectiva: o discurso foi motivado pelo tiroteio da semana passada em que Jared Lee Loughner, um jovem de 22 anos, feriu gravemente a deputada Gabrielle Giffords (democrata do Arizona) e matou seis pessoas, entre elas uma menina nascida no 11 de setembro (de 2001), o dia dos atentados às Torres Gêmeas de Nova York.
De imediato, surgiu a suposição de que a retórica incendiária usada pelo grupo ultra batizado de 'Tea Party' havia, no fundo, armado a mente e a mão de Jared. Afinal, a mais vistosa líder do grupo, Sarah Palin, que foi a candidata derrotada à vice-presidência em 2008, havia colocado Giffords como alvo, durante a campanha do ano passado para a eleição parlamentar.
Palin alega que o alvo deveria ser alvejado com votos, não com balas.
Mas, se não houvesse a suposição, Obama não teria ido ao Arizona. 'Serial killers' são uma espécie de tradição nos Estados Unidos e os presidentes de turno não se abalam a fazer discursos, históricos ou não, a cada um desses atentados.
É óbvio que não há como demonstrar o nexo entre a ação de Loughner e a retórica do 'Tea Party'. Mas, haja ou não, o discurso de Obama não serve para comover os fanáticos.
Pode, sim, ter convencido a parte democrata do país, o que, de resto, nem era necessário. Pode ter convencido também a fatia republicana digamos normal. Mas o 'Tea Party' é um grupo de fanáticos que espalha, frequentemente, a falsa tese de que Obama não é americano nem cristão, mas muçulmano.
Como acreditar, pois, em um discurso que é uma pregação de valores cristãos?
Digamos que não haja mesmo o tal nexo e que Loughner não passe de um lunático, desses que acreditam realmente que o governo dos Estados Unidos (seja qual for) conspira contra os cidadãos.
As teorias conspiratórias contra o governo que parecem ter parcialmente inspirado Loughner têm longa tradição nos Estados Unidos. Teorias conspiratórias podem ser um fenômeno globalizado, mas a paranoia particular de Loughner é puramente americana', escreve Kathryn Olmsted, professora de História da Universidade da Califórnia, em Davis.
Não são discursos presidenciais, por brilhantes que sejam, que mudam esse tipo de mente atormentada.
A professora Olsmsted acrescenta que essa paranoia pode ter sido exacerbada pelo ambiente em que vive Loughner. O Arizona 'é um Estado politicamente polarizado, no qual políticas do governo federal, da saúde à imigração, foram descritas por políticos das correntes principais como uma conspiração tirânica contra a liberdade'.
Se é assim - e parece ser - o discurso pacificador de Obama tende a ser encarado como mais uma peça no complô, por absurdo que pareça a mentes normais.
Em resumo, Obama pregou para os conversos, quando o alvo, de resto inatingível, eram os lobos que ajudam a disseminar essas ou outras paranóias.

Clóvis Rossi

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Armistício!



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Pemedebização!



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Exorcismo!



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Enquanto isso, no Guarujá...



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Nossa Casa, nossa vida!



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Deveres com os animais

Não é sempre que concordo com o colunista João Pereira Coutinho, que escreve às terças-feiras na Ilustrada. Diria, aliás, que se torna cada vez mais raro. Hoje (leia aqui seu texto “Homens e animais”), contudo, faço-o decididamente, ou melhor, só com um grãozinho de sal.
O raciocínio de Coutinho é límpido: touradas e outras formas de tortura (maus-tratos) contra animais devem ser abolidas não porque os bichos tenham direitos, mas porque nós homens temos deveres para com eles. É uma maneira inteligente de afirmar a ampliação da esfera moral advogada por Peter Singer sem enredar-se nas malhas problemáticas da atribuição de direitos às bestas.
Escrevi não faz muito no caderno Ilustríssima, da Folha, a respeito desses dilemas, mais especificamente no contexto do vegetarianismo e do que se poderia chamar de gourmética, ou gourmetiqueta, para cunha neologismos. Leia “A dor dos moluscos” aqui.
O grão de sal vai para o argumento de Coutinho contra reconhecer direitos aos animais: eles não têm deveres, portanto não podem ter direitos. Entendo o que quer dizer, e posso concordar com a leitura de que a impossibilidade decorre de não serem os animais sujeitos morais, pelo menos não no sentido em que nós homens o somos.
Vejo dois senões, porém. Alguns estudos recentes indicam que pelo menos nossos parentes primatas têm rudimentos de uma ética, reciprocidade, senso de justiça ou coisa assim. Não existiria, assim, essa separação categorial tão rígida quanto parece supor o colunista.
O outro senão é o vínculo, de sabor excessivamente conservador para este progressista, entre direitos e deveres. Direitos são direitos, não dependem de o sujeito ter, reconhecer ou cumprir com deveres.

Marcelo Leite

A tragédia da irresponsabilidade

A tragédia na região serrana do Rio mistura a catástrofe natural com a irresponsabilidade pública e a ignorância --é, aliás, algo comum nas catástrofes brasileiras. Basta ver o que fala o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio (CREA-RJ).
A entidade afirma que há pelo menos dois anos adverte as cidades da região serrana sobre as ocupações irregulares, mas, na maioria das vezes, sem nenhum efeito. Nem resposta tiveram.
Falta, segundo a entidade, qualquer planejamento urbanístico, o que contraria interesses econômicos de condomínios de alto luxo. Ou a disposição de arrumar briga com os mais pobres.
Soma-se a isso a ignorância: prefeituras, de acordo com o CREA-RJ, não teriam profissionais qualificados para evitar a construção de casas em áreas de risco.
Daí se vê, como sempre, como o descaso é uma tragédia permanente no Brasil.

Gilberto Dimenstein

Dilma e seu estilo

Aos poucos, a presidente Dilma Rousseff vai sinalizando como será sua administração. Não deseja gastar seu capital com temas que, avalia, exijam um elevado custo político e demandem uma energia monstruosa para aprovar. Elenca nessa lista a reforma da Previdência. Pragmática, prefere tocar a reforma tributária. Não uma reforma em bloco, mas fatiada. Para tornar mais fácil aprovar projetos que considera prioritários.
A decisão da presidente não deve agradar nem um pouco os especialistas da área previdenciária. Praticamente todos recomendam uma reforma no setor para evitar um desequilíbrio nas contas que bancam o pagamento dos aposentados. Dilma, porém, avalia que o assunto é polêmico o suficiente que deve elevar, e muito, o custo político de sua aprovação.
Ou seja, tudo indica que a presidente petista não quer ter uma dependência tão elevada do Congresso. E avalia que, se é para comprar brigas no Legislativo, que seja para enfrentar os temas que considera essenciais para tocar o seu projeto. Que envolve aumentar e acelerar os investimentos públicos e privados no país.
Daí que, em sua avaliação, torna-se prioritário aprovar alguns projetos pontuais que possam aumentar a competitividade e a produtividade dos setores privado e público brasileiro. Por isso já reuniu sua equipe, no início de seu governo, para analisar os projetos de reforma tributária que encaminhará ao Congresso. E pretende enviá-los logo em fevereiro.
Na lista está a desoneração da folha de pagamento. Também vai propor cortar impostos de investimentos. E tentará unificar a legislação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). São medidas que considera fundamentais para dar ao empresariado nacional melhores condições para competir com seus concorrentes externos e expandir sua produção.
Ainda no campo da análise dos custos políticos a enfrentar, Dilma está decidida a mudar, até onde for possível, o padrão das indicações políticas para as estatais e autarquias federais. Sabe que compra uma briga política com seus aliados. Sabe também que tem certos limites a serem observados. Na medida necessária para evitar uma rebelião dentro do Congresso, como a que o PMDB chegou a ensaiar.
Mas ela quer mudar o perfil das nomeações. Espera colocar nas principais estatais nomes técnicos. Podem até ser ligados e indicados por políticos, mas que preencham muito mais as qualificações que ela considera fundamentais para que as empresas públicas participem de seu projeto de governo.
No setor elétrico, por exemplo, quer mudar o perfil do sistema Eletrobras. Deseja que a estatal trabalhe dentro do modelo de governança adotado pela Petrobras. Não quer deixar que suas subsidiárias trabalhem com autonomia, como vira e mexe acontece. Seguindo muito mais os interesses dos grupos políticos que indicam seus presidentes, e não o do sistema como um todo.
Vai dar certo? A base aliada vai topar? Perguntas que serão respondidas ao longo do seu governo. Dilma, porém, parece realmente disposta a dar uma mexida nesse mundo do fisiologismo. O ideal, sinceramente, seria banir totalmente a relação entre o mundo político e o setor estatal. Isso, contudo, está fora da realidade política do momento. Nesse cenário, o estilo Dilma pode representar um avanço.
Um estilo que, dando certo, será fundamental diante do modelo que a presidente vai adotar em sua administração. Afinal, ela já deixou claro, bem antes de virar presidente, que defende um Estado forte, indutor do crescimento da economia brasileira. Nesse caso, um Estado forte dominado completamente pelo mundo da fisiologia seria um atraso. A conferir.

Valdo Cruz

13 (discretos) dias de Dilma

Olhando daqui de Trancoso, o início do governo Dilma traz um grande alívio: governo quem?
A discrição inicial da nova presidente (como é bom usar este feminino pela primeira vez na história do país) não podia contrastar mais positivamente com a necessidade de adulação e reconhecimento de seu antecessor e mentor.
Em meio a tanto continuísmo, o perfil discreto até aqui da presidente é até aqui a maior qualidade de seu governo infante.
O lulismo eleitoreiramente mitômano queria (quer) acorrentar o país todo às barbas de Lula, pai dos pobres, mãe dos ricos, dono da maior aprovação da história, sua trajetória, o verdadeiro milagre brasileiro.
Lula, de fato, é (foi) um milagre. Sua soberba e auto-adulação foram um preço pequeno a pagar pelo consenso seminal que ele estabeleceu ao abraçar a economia de mercado e anular o lado B (de burra) da esquerda brasileira. No processo, colocou os pobres no centro da ação pública do país. E desabrochamos com essa jabuticaba: o sucesso do capitalismo turbinando partidos de discurso anticapitalista.
Vai entender esse país.
Daqui do sul da Bahia, vendo a miséria persistente num cenário luxuriante, salários mínimos servindo salários máximos, é fácil sentir o quanto andamos e o quanto temos de andar.
O verão brasileiro é propício ao ócio, mas eu tenho de voltar amanhã a São Paulo. A tristeza de deixar a praia, o mangue e o Quadrado neste verão opulento só se dissipa porque no cenário paulistano, cosmopolita, dinâmico, nervoso epicentro do boom de vida no Brasil de hoje, não há quem não tenha planos e oportunidades para engajar-se e engajar-lhe.
Que o governo Dilma nos ajude e não nos atrapalhe. Ela começa bem menos interessada do que Lula em nossos corações e mentes e mais interessada em planilhas e resultados.
Ufa!
O Brasil não é um país normal. Assim como os Estados Unidos, temos direito a reivindicar excepcionalidade. Mais do que isso, temos o dever de desenvolvê-la.
O Brasil não é um país normal, mas normalidades (e banalidades) têm enorme utilidade por aqui. Nosso milagre econômico, tão parecido com os de outros emergentes, deve tudo à normalidade (e a banalidade) econômica consolidada nesses 16 anos da dualidade FHC-Lula.
O fim da era Lula foi o fim do recomeço, da retomada. Dilma inaugura, se tudo der certo, um Brasil maior que qualquer governo ou liderança, cujos méritos (e deméritos) serão antes de tudo dos brasileiros.
O bom-sensismo discreto de Dilma e Palocci pode ser o moderador ideal para o novo Brasil. O esfriamento das relações com o regime iraniano já é um alvissareiro começo.
Todo mundo já sabe o que falta fazer no país, o que se pode fazer e o que não se deve fazer. A nova velha tragédia das chuvas no Rio que o diga.
Mais do que nunca, precisamos de bom senso.
Dilma pode ser a cara. Palocci, a barba.
Sucesso para eles.

Sérgio Malbergier

sábado, 8 de janeiro de 2011

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Porta da e$perança!



Blog de Josias de Souza

Lulabajur!



Blog de Josias de Souza

Vivaldices e espertezas

OK. O capitalismo triunfou. Pelo menos nas experiências históricas que temos, economias planificadas, com funcionários estáveis e com remuneração fixa, não funcionam porque, podendo fazê-lo sem ônus econômicos e sociais, a maioria de nós prefere não trabalhar (ou, sendo um pouco mais generoso para com a natureza humana, fazê-lo em doses homeopáticas) a empenhar-se com todas as forças na consecução de tarefas muitas vezes aborrecidas e sem apelo intelectual.
Um dos problemas do Brasil é que, embora operemos sob a égide de um sistema econômico baseado na livre concorrência, não resistimos à tentação de pegar uma carona na autoridade do Estado para colher os lucros do capitalismo sem a necessidade de correr riscos ou conquistar o mercado pela qualidade dos produtos oferecidos e dos serviços prestados.
Faço essas reflexões a propósito de uma série de espertezas privadas que, de tão acostumados que estamos a ser tungados e ludibriados, já não nos tiram do sério infelizmente.
A mais recente dessas vivaldices é o aumento na taxa da inspeção veicular ambiental que o prefeito de São Paulo, Gilbero Kassab (DEM), concedeu ao consórcio que realiza o serviço. Não me conto entre os defensores da poluição do ar. Acho que o poder público precisa mesmo regular a emissão de gases do transporte individual e é mais do que justo que cada proprietário de veículo pague pelas despesas daí decorrentes.
O que não me parece correto é que o reajuste ocorra sem que a ele corresponda um aumento de custos demonstrado. Trata-se, afinal, de uma concessão, uma atividade regulada pelo Estado cujo objetivo é a manutenção da qualidade do ar. Como o risco para a empresa que presta o serviço é mínimo (estamos todos obrigados por lei a nos submeter anualmente à inspeção), o lucro precisa ser pequeno: o suficiente para assegurar a viabilidade do negócio e remunerar o capital investido. Se assim não for, a inspeção deixa de ter o caráter público que a motivou e se torna um mecanismo de transferir renda da coletividade para firmas privadas. A coisa só fica mais suspeita quando se constata que algumas das empresas metidas no consórcio doaram dinheiro para o partido de Kassab na última campanha municipal.
Faço aqui um pequeno parêntese para acrescentar que, no capítulo qualidade do ar, a lista de pecados do poder público é bem maior. Como escrevi há pouco na versão impressa da Folha, é meio absurdo que a Petrobras, uma empresa que, por ser majoritariamente estatal, deveria colocar o interesse da sociedade à frente dos lucros, venha há anos procrastinando de modo até mesmo ilegal a introdução de combustíveis mais limpos no país. Outro ponto complicado é a política fiscal da maioria dos Estados que, ao contrário do que ocorre no mundo civilizado, não sobretaxa os veículos mais poluentes.
Voltando ao capitalismo à brasileira, o caso das inspeções está muito longe de ser o mais grave. Os pequenos golpes contra o bolso e a paciência do cidadão se sucedem em ritmo e variedade impressionantes. A troca das tomadas, por exemplo, foi, é preciso reconhecê-lo, uma jogada brilhante. Numa única canetada os fabricantes de plugues e adaptadores criaram "ex nihilo" todo um novo mercado. Mais interessante ainda, conseguiram um raro equilíbrio: a mudança causa um inconveniente que não é grande o suficiente para provocar mobilizações e protestos, mas basta para gerar lucros fabulosos.
No mesmo nível de genialidade eu só me lembro da iniciativa das autoridades de trânsito (as quais, aliás, operam um dos mais profícuos balcões de negócios do país) que alguns anos atrás obrigou todos os motoristas a adquirir e carregar para cima e para baixo um pedaço de gaze, um rolo de esparadrapo e um par de luvas de látex. Com isso, queriam nos fazer crer, estávamos prontos a atender a emergências médicas viárias.
Mais recentemente, esses mesmos impolutos administradores públicos impuseram a todos os compradores de carros a obrigação de pagar por um chip de localização e bloqueio, agora exigido em todos os veículos novos, mas que é totalmente inútil a menos que o proprietário seja cliente de uma seguradora. Até podemos discutir se faz ou não sentido exigir que todos os condutores tenham seguro total, como ocorre em vários países, mas, uma vez que isso não ocorre no Brasil, a nova regra constitui um enorme benefício às seguradoras difícil de justificar de um ponto de vista republicano.
Essa mania de tentar sequestrar a autoridade do Estado para gerar benefícios privados não é uma prática exclusiva de algumas grandes empresas e uns poucos administradores. Infelizmente, o buraco é mais embaixo. A ideia está profundamente enraizada em nossa cultura, afetando também indivíduos e categorias profissionais.
Os advogados, por exemplo, conseguiram criar dezenas de mecanismos legais que obrigam o cidadão a contratar seus serviços mesmo que não o desejem. É um contrassenso econômico e lógico. Se o sujeito não tem competência para fazer-se representar em juízo, tampouco a tem para nomear um causídico como seu "bastante procurador".
Os médicos vão agora no mesmo caminho com a chamada regulamentação do ato médico que, para desespero de dentistas, psicólogos, fisioterapeutas etc., está prestes a ser aprovada no Congresso. A peça cria uma série de procedimentos que passariam a ser exclusivos dos médicos. Foram com tanta sede ao pote que acabaram incorrendo em piada involuntária, ao tornar o sexo uma zona restrita. De acordo com o art. 4º, pár. 4º, III, do PL nº 7.703/06, "a invasão dos orifícios naturais do corpo" é prática exclusiva da classe.
Diga-se em favor dos médicos que não foram eles que criaram todas essas restrições. Eles só reproduziram dispositivos constantes das regulamentações profissionais das categorias que agora combatem com afinco esse projeto.
E a coisa é bem mais disseminada. O Brasil é uma espécie de país das corporações. Indivíduos e categorias profissionais, em vez de firmar-se pela excelência, preferem sempre tentar criar uma boquinha para tornar sua atividade exclusiva quando não obrigatória.
Como observei numa coluna recente, tramitam no Congresso Nacional dezenas e dezenas de projetos que regulamentam, entre outras, as profissões de modelo de passarela (PL 4983/09), designer de interiores (PL 4525/08), detetives (25 PLs diferentes), babás (PL 1385/07), escritores (PL 3034/92), demonstrador de mercadorias (PL 5451/09), cerimonialista (PL 5425/09), educador social (PL 5346/09), fotógrafo (PL 5187/09), depilador (PL 4771/09). Já resvalando no reino da fantasia, busca-se também regulamentar a ocupação de astrólogo (PL 6748/02) e terapeuta naturista (PL 2916/92).
O problema é que qualquer grupo que tenha um mínimo de organização obtém sucesso senão em todos os pleitos ao menos em parte deles. O resultado é uma miríade de leis e regulamentos que, afora atender às demandas corporativas, só servem para frustrar direitos e dificultar a vida.
Se vamos ser capitalistas, como nos impõem o momento histórico e quem sabe até a biologia, deveríamos pelo menos tentar jogar o jogo direito. O poder do Estado deve ser usado para garantir a ordem e proteger a coletividade, não para garantir benefícios privados.

Hélio Schwartsman

domingo, 2 de janeiro de 2011

BOM ANO NOVO! Felizes lutas antigas!

2010 chegou ao fim constatando um grande avanço na economia de Pernambuco e mais: no apagar das luzes o Estado abriu os braços para duas montadoras, ampliando as expectativas positivas.
Contudo, o final do ano viu a educação pernambucana continuar praticamente no mesmo lugar. Os fogos soltados pelo Governo não melhoraram nossos salários, nem superaram os estragos produzidos pela Lei Complementar 154. Ao contrário, em dezembro fomos surpreendidos com os ataques à Gestão Democrática através da prorrogação dos mandatos dos diretores escolares. Naquele mês, ainda ecoaram as orientações de várias GRE, inviabilizando matrículas na Educação de Jovens e Adultos e no Ensino Médio Regular, inclusive nos horários diurnos, produzindo fechamento de turmas e turnos, bem como ferindo direitos da comunidade escolar, principalmente dos professores e estudantes-trabalhadores.
Sabendo que a educação almejada será uma conquista, sigamos nós, trabalhadores em educação, sonhando e lutando por uma educação pública de boa qualidade social. Escolas que acolham as pessoas de todas as idades, raças, credos, gêneros e sem preconceitos. Uma escola com dignas condições para o processo de ensino-aprendizagem, com trabalhadores bem remunerados e que seja prazerosa.
Diante disso, desejamos que em 2011 tenhamos Felizes Lutas, até porque essa categoria carrega no DNA as lutas de Frei Caneca, Padre Roma, Zumbi, das Mulheres de Tejucupapo e tantas outras.
Aliás, do futuro também somos “a crença, a esperança...a fonte da vida e da história/Desse povo coberto de glória”.

Sintepe

Primeiro ato!



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Hasta la vista, Dilma!



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2011 será difícil para Dilma

Dilma Rousseff ganhou a Presidência e assumiu embalada no maior crescimento econômico em um quarto de década. Chegou sua hora de pagar a conta.
Neste início de 2011, parte importante dos indicadores macroeconômicos do país estão em deterioração.
A inflação sobe, o dólar retomou trajetória de queda, as contas externas pioraram e a economia para pagar a dívida pública diminuiu.
Ainda em janeiro, no dia 19, o Banco Central poderá se ver obrigado a aumentar os juros para conter a inflação.
Isso pode ter novos impactos negativos sobre a dívida pública (que aumenta com juros maiores) e sobre o dólar (que se desvaloriza quando mais moeda entra no país atrás do juro pago pelo BC, hoje em 10,75% ao ano).
Mas a prioridade do Banco Central é com a inflação.
Em 2010, até novembro, o IPCA (índice oficial de preços) subiu 5,25%. Ele deve fechar o ano passado perto do teto da meta do BC (6,5%).
Já o IGP-M, que reajusta a maioria dos contratos de financiamentos imobiliários e de bens, assim como de aluguéis, subiu 10,56%.
Na virada do ano, Lula assinou medida provisória fixando o salário mínimo em R$ 540 a partir de 1º de janeiro.
O reajuste foi de 5,88%. Pela primeira vez desde 2003, o mínimo corre o risco de ficar sem aumento real. Com isso, seu impacto direto sobre as contas (e o deficit) da Previdência será menor.
No início de dezembro, o BC também retirou R$ 61 bilhões da economia elevando os depósitos compulsórios que impõe aos bancos.
Isso já fez subir os juros para os consumidores e reduziu prazos de financiamentos para bens e veículos.
As duas medidas foram as primeiras na transição Lula-Dilma para tentar conter a aceleração da inflação e o aumento dos gastos públicos.
O descontrole nas despesas do governo (o gasto da União cresceu quase 25% entre janeiro e novembro em relação a 2009) está na raiz de muitos dos atuais indicadores negativos.
A deterioração se deu para que a economia pudesse ter o forte desempenho no ano eleitoral de 2010, com o PIB (Produto Interno Bruto) crescendo cerca de 7,5%.
Na média, segundo o boletim Focus do BC, o mercado espera um PIB bem menor em 2011, ao redor de 4,5%. Mas várias consultorias já revisam projeções para baixo.
A expectativa é de uma economia mais fria por conta de gastos públicos crescendo menos e do BC subindo o juro básico para conter a inflação.
A tarefa de Dilma de conter o ritmo do crescimento da despesa estatal, porém, é um desafio considerável.
Em 2010, a economia efetiva (sem malabarismos contábeis) que o governo fez para pagar a dívida pública foi a menor dos anos Lula.
Dilma promete economizar bem mais para reverter a deterioração dos vários indicadores. Mas o espaço de manobra ficou pequeno por conta dos gastos crescentes.
Só cerca 8% do gasto não financeiro da União (excluindo juros da dívida pública) são passíveis de corte caso o governo não queira reduzir ainda mais os investimentos em infraestrutura (que hoje somam menos de 1% do PIB).
Com a atividade econômica bastante mais fraca 2011, o governo também terá receitas em impostos menores para pagar suas despesas correntes e obrigatórias.
Se a conta de juros também tiver de subir, 2011 trará um novo começo bastante difícil ao país e para Dilma.

Fernando Canzian