segunda-feira, 20 de junho de 2011

Ou a banca ou a democracia

Não se iluda nem se distraia: o que está em jogo na crise da Grécia não é apenas o calote ou não, a sobrevivência ou não do euro nem mesmo a repetição da catástrofe que se seguiu à quebra do banco Lehman Brothers, em 2008. O que está em jogo é a democracia, se entendida como o governo do povo, pelo povo e para o povo, com perdão por enfatizar o óbvio.
Não é por acaso que, nas colossais manifestações de massa dos "indignados" espanhóis no domingo, gritava-se: "Não há democracia se governam os banqueiros".
Que a rua grite dessa forma não chega a surpreender: os mortais comuns acham que estão pagando pela crise gerada pelas aventuras do que os argentinos chamam de "pátria financiera", que, não obstante, determina o que os governos devem fazer para sair do buraco que o cassino criou.
O que chama a atenção é que o grito da rua começa a ecoar com mais força nos salões civilizados da academia, não da academia contestatária, o que seria natural, mas do establishment.
No "El País" desta segunda-feira, a jornalista e escritora Irene Lozano lamentava "a hegemonia desses entes fantasmagóricos chamados mercados, que não se apresentam em eleições, não prestam contas aos cidadãos nem explicam seus programas, mas ostentam a faculdade de impor a visão de mundo que lhes é mais favorável".
A escritora sacou do baú da memória o grande ícone do liberalismo, Adam Smith, para quem "a mesquinha rapacidade e espírito de monopólio dos mercadores não são nem devem ser os governantes da humanidade".
Ah, Adão, se você soubesse que, séculos depois de sua sentença, os mercadores governariam a humanidade.
O problema da dívida grega é, na verdade, um problema dos bancos (gregos, sim, mas também alemães e franceses), que "concederam grandes empréstimos [aos gregos], quando não deveriam ter concedido nenhum", como escrevia ontem outro acadêmico ícone do establishment, Timothy Garton Ash, catedrático de Estudos Europeus da legendária Oxford University De outra grife da academia, a Escola de Gerência do MIT, vem a voz de Simon Johnson, para dizer que "a falta de capital capaz de absorver perdas nos grandes bancos europeus é um escândalo de primeira ordem que deveria derrubar governos".
Derrubar porque se recusaram a governar, o que implicava impor limites ao jogo financeiro, para impedir que emprestassem o que não podiam sem ter reservas para responder por prejuízos quando chegasse o inverno, como chegou.
Aliás, Johnson tem um estudo que demonstra o porquê de a "pátria financiera" estar com as alavancas de controle na mão: seis conglomerados financeiros controlam ativos equivalentes a 60% da economia dos Estados Unidos, três vezes mais que porcentagem de meados dos anos 90.
É ou não para concordar com a rua quando grito que "não há democracia se governam os banqueiros"?

Clóvis Rossi

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