sábado, 14 de maio de 2011

Turismo na favela (ou quando a realidade supera a ficção)


Presidente dos EUA, Barack Obama, se empolga com a capoeira em Cidade de Deus (Pablo Martinez Monsivais -20.mar.11/AP)
Com a sua formação sociológica bastante característica (e lamentável, dadas as disparidades sociais brasileiras), as favelas são tão famosas que viraram um substantivo universalmente conhecido.
Ele foi até importado, vejam só, para Paris e Londres, cidades nas quais o bar Favela Chic dá um verniz, digamos, ficcional, à realidade.
Mas o Brasil é um país onde a realidade quase sempre supera a ficção.
Percebendo isso, o Conselho de Assuntos Hemisféricos (Coha, na sigla em inglês) lançou ontem um extenso relatório intitulado “Favela Tourism: Stranger than Fiction” (“Turismo na Favela: mais estranho que a ficção”, em tradução livre), em que tenta destrinchar a relação entre o turismo “underground” e essas habitações brasileiras.
(Claro, a preocupação do órgão independente não é à toa: vem no bojo da criminalidade da capital fluminense ante a Copa do Mundo, em 2014, e dois anos depois, das Olimpíadas. Cita até o passeio de Obama pela Cidade de Deus, conforme a foto logo abaixo.)
O panorama delineado, entretanto, não é tão pessimista assim. Exalta o crescimento desse nicho de turismo são 4.500 visitantes estrangeiros anualmente em uma das companhias que oferecem o serviço, e o aponta como forma de espalhar o espírito empreendedor dos residentes de favelas.
A partir da fabricação das “lembranças” como chaveiros, camisetas, etc., a troca entre moradores das favelas e turistas faz com que os primeiros tenham senso de negócios, além de ser uma forma de iniciar a incursão no mercado de trabalho além do local no qual residem.
É o caso da Rocinha Tourism Workshop, entidade tocada por Rejane Reis que recruta adolescentes para serem guias turísticos com salário, aulas de inglês e geografia como contrapartida.
“Pela integração de gerações mais novas nos passeios, Reis está estimulando a mudança dentro das favelas”, diz o texto da Coha). “Desse modo, jovens aprendem o valor do trabalho, e todo esforço é feito para compensá-los apropriadamente por suas contribuições.”
O Coha diz ainda que a interação com turistas estrangeiros dá aos jovens acesso a novas perspectivas e culturas e mostra àqueles as melhores facetas da vida em favelas, ajudando o país a se movimentar no seu plano de desenvolvimento.
Depois do “rolê” a pé, os turistas também são incentivados a contribuir com melhorias voltadas para a comunidade.
Claro que há críticas que caracterizam esse tipo de turismo como uma “exploração” das mazelas sociais de cada local.
“Além disso”, lembra o relatório, “o turismo na favela pode até não ser sustentável. Se os turistas estão indo para favelas do Rio com o objetivo de ver habitantes mais necessitados da cidade, e não para ter um panorama de profundidade histórica, os moradores teriam de continuar a viver na pobreza a fim de atrair novos visitantes. O turismo só pode se alimentar a partir de um ciclo prolongado de empobrecimento para os residentes.”
O Coha evita emitir uma avaliação final sobre o turismo na favela, contudo. Afirma até que a redução da taxa de criminalidade e o aumento de emprego nas favelas só poderão ser mensurados, talvez, em 2014 ou 2016.
Ainda assim, dá uma observação positiva: os atuais esforços das esferas governamentais na pacificação das comunidades algo que, consequentemente, vai incrementar o número de visitantes.
E, é claro, o Coha lembra da antiga, porém fundamentalmente válida, cantilena que sempre ouvimos: “o Governo Federal brasileiro deve combater ativamente os deficits em educação, sistema de saúde e infraestrutura, a fim de apressar os avanços sociais”.

Marina Lang

Nenhum comentário:

Postar um comentário