quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Balas perdidas na Rocinha

Entenda-se o "balas" do título não no sentido literal, físico, mas como oportunidade perdida para discutir questões de fundo a respeito do narcotráfico, crime organizado etc, que foram, afinal, os motivos que impulsionaram a retomada da Rocinha.
Surpreende que a maior parte dos jornais do mundo que noticiaram a operação se surpreenderam com o fato de que não foi disparado um único tiro. Pudera: dez dias antes, as autoridades avisaram da reocupação, o que deu tempo aos traficantes de fugir tranquilamente.
Posto de outra forma: o objetivo da operação era recuperar território. Ponto. Não era desasrticular as quadrilhas instaladas nas três comunidades invadidas. É óbvio que, nessas circunstâncias, o narcotráfico continuará vivinho da silva, até porque o consumo está longe de diminuir.
A primeira oportunidade perdida é, pois, a de discutir a política de combate às drogas, que não está dando resultados. É sintomático que o juiz Marcelo Semer tenha comentado o assunto, mas ao tratar de outro fato recente em que as drogas foram o eixo (a prisão de estudantes da USP que fumavam maconha, ao que se seguiu a ocupação da reitoria e o que mais se sabe).
Semer diz que aquele episódio "mostra também o esgotamento da política de guerra contra as drogas, cujos paradigmas fazem água por todos os lados. A farta criminalização não vem trazendo qualquer alento à saúde pública que supostamente busca proteger".
Pior, sempre segundo Semer: "O consumo aumenta, independentemente da proibição. E ao invés de investir em saúde, o Estado gasta em repressão".
Difícil discordar do diagnóstico. O problema é que não há clareza a respeito de qual seria, então, a política alternativa.
Admito que sou simpático à tese da descriminalização das drogas, a partir de um raciocínio que reconheço ser empírico e, talvez, simplista demais: liberada a venda, estar-se-ia tirando o negócio da clandestinidade e, por extensão, reduzindo ou eliminando a violência a ele associada inexoravelmente hoje em dia.
Mais ou menos como bebida alcoólica, que é também droga. O consumo é elevado, há mortes e doenças a ele vinculados, mas ninguém mata ninguém para ficar com os pontos de venda. Repito: pode ser simplismo, falta o teste da realidade, o único que de fato conta, mas é preciso discutir alternativas.
Já tratei desse assunto lá atras, o que despertou comentários em quantidade dos leitores, pelo que remeto o interessado a comentário anterior.
O segundo ponto que se deveria discutir é o papel das Forças Armadas no combate ao crime organizado. Ficou patente, acho eu, tanto no episódio da Rocinha como, antes, no Complexo do Alemão, que a polícia por si só não tem capacidade bélica para defenestrar os traficantes.
Recorre, então, aos fuzileiros navais e fica-se no limiar da violação constitucional, que veda às Forças Armadas desempenhar o papel de polícia.
É outra discussão delicada mas que tem que ser encarada se é para restabelecer o controle do Estado sobre todo o território nacional e não apenas nas zonas sul e centro do Rio de Janeiro o que não deixa, em absoluto, de ter seus méritos, mas é pouco, muito pouco.

Clóvis Rossi

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