quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

A Alemanha, olho no olho

Quando você ouve a palavra Alemanha, o que vem à cabeça? Volkswagen, com certeza. Toda uma geração de brasileiros foi introduzida ao mundo do automóvel graças ao "carro do povo". Futebol, também. Ainda mais agora que um brasileiro com cara e cor de brasileiro, o Cacau, é integrante da seleção alemã.
Mas é bom começar a pensar em mais coisas às quais vincular a Alemanha. Nos próximos meses, a diplomacia alemã fará uma pesquisa para saber qual é a percepção do brasileiro sobre o país.
São os preparativos para o "Ano da Alemanha no Brasil", que está nos planos do governo e cujo lançamento oficial depende apenas do sinal verde do Itamaraty --que certamente será dado.
Os eventos ocorrerão no segundo semestre de 2013, primeiro de 2014. Cobrirão um panorama de 360 graus, de política/instituições à ciência e tecnologia, de economia à cultura. E a intenção não é a de chegar com o prato pronto, mas construir a programação junto com os brasileiros.
A iniciativa tem como um de seus principais objetivos dar carne à parceria estratégica entre Brasil e Alemanha, para evitar que se torne rótulo oco.
Afinal, parcerias estratégicas têm sido anunciadas a três por dois, entre os mais diferentes países. O Brasil é parceiro estratégico dos Estados Unidos, da União Europeia, da Argentina, além da Alemanha, para ficar em apenas alguns exemplos.
O embaixador Wilfried Grolig pretende que a parceria estratégica signifique que os dois países sentem-se, olho no olho, para discutir todos os pontos não só da relação bilateral mas da agenda planetária.
A propósito: a diplomacia alemã acha que o Brasil tem, sim, que envolver-se em assuntos que parecem excessivamente distantes, como o eterno conflito no Oriente Médio ou a situação no Irã. É uma visão contrária à que tem sido reiteradamente exposta por setores diplomáticos dissidentes da condução anterior do Itamaraty e também por alguns jornais.
Se alguém se interessa por saber, eu também acho que o Brasil está no mundo e, portanto, tudo o que acontece no mundo lhe diz respeito.
No caso específico da Alemanha, parece bom negócio dar à parceria estratégica um caráter que vá além do rótulo (imponente, mas desgastado pelo excesso de uso).
Primeiro porque é o parceiro ideal para lutar pela reforma da governança global, em especial do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o coração do sistema multilateral. Nem Brasil nem Alemanha fazem parte do CS, mas são os candidatos naturalíssimos da América Latina e da Europa, respectivamente, se e quando houver a reforma de que tanto se fala.
Juntos, terão mais força para fazê-la avançar, como é óbvio.
Segundo porque é de estrito sentido comum a tese da chanceler Angela Merkel de que o setor financeiro deve ajudar a pagar a conta do estrago global pelo qual foi o principal responsável. O Brasil, vítima por tabela da crise, tem mostrado simpatia por essa tese, mas uma simpatia remota, porque o sistema financeiro brasileiro não teve nem tem os problemas que afetaram ou ainda afetam bancos dos Estados Unidos e da Europa.
Nem vou falar de comércio, que é, nos tempos modernos, componente essencial de qualquer parceira. Mas falo, sim, de um ponto que sempre me incomoda: a Alemanha não planta um só pé de café, mas é grande exportadora de café solúvel. Milagre? Nada. Importa o grão (não só do Brasil), processa-o e exporta o produto, já com maior valor agregado.
Não está na hora de o Brasil passar, ele próprio, a agregar valor a seus produtos básicos? Se a Alemanha quer mesmo ser parceira estratégica, olho no olho, pode ajudar nessa tarefa.

Clóvis Rossi

Nenhum comentário:

Postar um comentário