quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O segredo dos olhos dela

Sou fã de Soledad Villamil há muitos anos.
No cinema, revi algumas vezes os principais filmes em que atua, "O Mesmo Amor, a Mesma Chuva" (1999) e "O Segredo de Seus Olhos" (2009). Em ambos ela contracena com o onipresente Ricardo Darín e é dirigida por Juan José Campanella. O segundo filme levou um Oscar em 2010.
Na música, onde Villamil estreou em 2007, com "Soledad Villamil Canta", eu conhecia apenas seu disco mais recente, "Morir de Amor" (2009), que mistura tangos célebres com algumas composições suas.
Sempre me impressionaram sua elegância e seu talento. Apesar de a atriz ser com frequência identificada com seu parceiro Darín, por conta de um modo parecido de incorporarem seus personagens com uma mistura de humor e drama e por representarem, de certo modo, sua geração no cinema argentino.
Porém, diferentemente de Darín, que é uma celebridade por aqui e já foi reconhecido internacionalmente, Villamil leva a carreira artística com mais discrição. Tanto que o primeiro prêmio cinematográfico importante que ganhou foi em 2010, um Goya de atriz "revelação", ainda que, à época, ela já tivesse mais de 40 anos...
Lembrei de meu colega e amigo Álvaro Pereira Júnior, que já escreveu que Villamil é uma "divindade argentina", quando a vi subir ao palco, na noite do último sábado, no Centro Cultural Torquato Tasso, no bairro portenho de Santelmo.
Isso porque os homens a olhavam encantados, pareciam estar num transe comum. Nós, mulheres, empacamos numa tímida admiração e, por que não, uma pontadinha de inveja.
Villamil, 42, mãe de duas meninas, está inteira e muito vigorosa. É magra, alta, tem cabelos escuros e olhos verde-água. Não é um protótipo da argentino. Destoa do geral das mulheres locais. Talvez isso aumente o impacto de sua presença.
O show encerrava uma temporada de um mês de Villamil e sua banda naquele local. Agora, a atriz viaja para se apresentar nos EUA e depois volta aos estúdios para terminar o terceiro disco e se dedicará a promover seu novo filme, em que contracena com Viggo Mortensen.
A Argentina tem uma tradição de produzir atrizes que são também cantoras. O exemplo mais conhecido é o de Tita Merello (1904-2002) que teve uma larga carreira cinematográfica seus primeiros filmes são dos anos 30, o último, de 1985. Pode-se vê-la cantando um de seus principais sucessos, "Se Dice de Mi", aqui.
Merello é evocada por Villamil, que a homenageia no show e dela canta justamente essa faixa. A noite é variada e a atriz percorre tangos, milongas, rancheiras, chimarritas e boleros.
Antes de entonar o tradicional tango "Volvé" (de Nacha Guevara), Villamil faz um alerta quanto ao machismo da letra. "Não concordo com nenhuma palavra dessa canção, mas vou cantar", diz, fazendo a plateia rir. A letra, realmente, como é tradicional no gênero, é bastante machista. Villamil aponta o verso que considera o mais revoltante: "Volvé, mirá, volvé y engañame no más/ No te molestaré, con celos jamás", em que a mulher, desesperada, admite a traição se esse for o preço para que o amado volte a seus braços: "quantas das mulheres aqui cantaria algo assim hoje em dia?", pergunta, teatral.
O show se completa com a bela "Biromes y Servilletas", do uruguaio Leo Masliah, uma homenagem à cidade de Montevidéu, e "Vendrás Alguna Vez", de Alfredo Malerba e Luis César Amadori.
Villamil esteve no Brasil para shows em espaços pequenos, passou quase despercebida, à exceção, talvez, de uma entrevista que deu a Jô Soares, em 2010, no qual o apresentador também só faltou ajoelhar a seus pés.
Por ora, os brasileiros cinéfilos a conhecem apenas por contracenar com Darín. Resta deixar a dica para alguma gravadora se animar a lança-la como cantora por aí. Por ora, Soledad Villamil é a mais forte candidata a ser a Tita Merello do século 21.

Sylvia Colombo

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