terça-feira, 25 de outubro de 2011

O Brasil e a inflação

O economista de Harvard Kenneth Rogoff (ex-FMI e ortodoxo) foi um dos primeiros a pregar a solução. Ela ganha a praça, de propósito ou não.
Esgotada a munição convencional na atual crise, a ideia seria viver com um pouco mais de inflação. Usá-la para corroer a dívida de famílias e governos. De quebra, tentar estabilizar os preços dos imóveis nos países ricos.
A ideia é heterodoxa, assim como os tempos atuais.
Inflação é deletéria e pode provocar efeitos colaterais enormes. Especialmente em países com histórico de preços altos (e indexação) como o Brasil.
A inflação acumulada em 12 meses nos EUA bateu em 3,9% em setembro. Há um ano, era de 1,1%. Em tempos normais, algo acima de 2% provocaria reação do Fed (o BC dos EUA).
Na zona do euro, os preços anualizados até setembro subiram 3% (1,9% há um ano).
Não há sinais, nos EUA e na Europa, de movimentos para interromper isso.
O motor da inflação no mundo rico é a estratégia dos bancos centrais norte-americano e europeu.
O Fed e o BCE inundam há meses seus mercados com dólares e euros. Que são emprestados a famílias e empresas a custo zero ou negativo.
Isso estimula as pessoas a gastar. Tendo à frente a perspectiva de que tudo ficará mais caro no futuro (com a inflação), os consumidores também tendem a antecipar o consumo.
Outro efeito de mais inflação é que ela corroeria as dívidas das famílias e governos. Dívidas que são a causa e que estão no centro da atual crise.
Se os EUA tiverem, digamos, três anos de inflação na faixa de 5% ao ano, uma família que hoje deve US$ 10.000 passará a dever US$ 8.400 em termos reais em 36 meses.
O mesmo ocorre com as dívidas dos governos. Isso alivia a carga sem que seja necessário um rigoroso ajuste fiscal, que só afundaria mais a economia.
Mais inflação também ajudaria a estabilizar o valor dos imóveis no mundo rico. Se há uma perspectiva de alta nos preços mais à frente, eles deixariam de cair agora.
Problema 1: a inflação deprime o poder de compra. Seriam necessários ajustes salariais para compensar. Mas argumenta-se que deixar os preços correr um pouco mais soltos seria melhor do que travar a atividade com alta de juros.
Problema 2: se para os países ricos a estratégia tem riscos mas parece válida, ela pode ser explosiva para o Brasil. O país não ficará imune à alta dos preços no mundo rico.
Contratos de aluguel, tarifas e mensalidades permanecem indexados a índices de preços por aqui. Além disso, 29% do total da dívida pública está indexada à inflação.
Desde fins de agosto nosso BC aposta em reduzir o juro básico (a Selic) acreditando que a inflação cederá por conta da crise internacional.
A atual leniência dos países ricos com os preços complica essa estratégia.

Fernando Canzian

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