segunda-feira, 25 de abril de 2011

Que tal um aumento?

Quando escuto as discussões atuais sobre o orçamento federal dos Estados Unidos, a mensagem que percebo é mais ou menos a seguinte: precisamos tomar medidas drásticas imediatamente! E precisamos manter os impostos baixos, se não cortá-los ainda mais!
Seria de imaginar que, dada a gravidade da situação, talvez o melhor fosse elevar os impostos, e não reduzi-los.
Minha descrição quanto ao debate orçamentário não é de maneira alguma um exagero. Considerem a proposta orçamentária do deputado Paul Ryan, que todas as Pessoas Muito Sérias nos garantiram ser corajosa e importante. A proposta começa pelo alerta de que uma "grande crise de dívida é inevitável", a menos que enfrentemos o problema do deficit. E em seguida, pede não por um aumento mas sim por novo corte de impostos, que conduziria os impostos pagos pelos norte-americanos mais ricos ao seu mais baixo patamar desde 1931.
E devido a esse grande corte de impostos, a única forma pela qual a proposta Ryan pode ao menos alegar que reduziria o deficit envolve cortes severos de gastos, que incidiriam primordialmente sobre as pessoas mais pobres e vulneráveis. (Uma avaliação realista sugere que a proposta de Ryan na realidade conduziria a uma elevação do deficit.)
A proposta do presidente Obama é muito melhor. Pelo menos apela por uma elevação dos impostos que incidem sobre as rendas mais altas ao patamar vigente no governo Clinton. Mas preserva os demais cortes de impostos adotados no governo Bush -cortes que originalmente foram justificados como maneira de eliminar um grande superavit orçamentário. E, como resultado, a proposta orçamentária do presidente também continua a depender pesadamente de cortes de gastos, ainda que não chegue de fato a resultar em um orçamento balanceado.
Assim, por que ninguém está oferecendo uma proposta que reflita a realidade de que os cortes de impostos de Bush foram um imenso erro, e sugerindo que elevar a arrecadação assuma papel importante para a redução do deficit? Na verdade, há quem defenda essa proposta, e retornarei a isso em breve. Primeiro, porém, vamos conversar sobre o estado atual do sistema tributário norte-americano.
Com base no tom de boa parte das discussões sobre o orçamento, seria de pensar que estamos cambaleando ao peso de níveis esmagadores e nunca vistos de tributação. A realidade que é a alíquota efetiva da tributação federal sobre todas as faixas de renda caiu significativamente nos últimos 30 anos, especialmente nas faixas de renda mais elevadas. E, acima de tudo, os impostos norte-americanos são muito inferiores aos da maioria dos demais países ricos, como proporção da renda nacional.
O fato é que não estamos sendo pesadamente tributados, quer sob os padrões históricos, quer em comparação com outras nações. Portanto, se você está realmente horrorizado com o deficit orçamentário, por que não propor um aumento de impostos como parte da solução?
Esperem: há mais. O cerne da proposta Ryan é um plano para privatizar e reduzir as verbas do plano de saúde federal Medicare. Mas isso nada faria para reduzir o deficit ao longo dos 10 próximos anos, o que explica por que todos os cortes em curto prazo vêm de reduções brutais na assistência aos necessitados e de cortes não especificados em verbas optativas. Aumentos de impostos, por outro lado, podem funcionar como um remédio rápido para tirar as contas do vermelho.
E é por isso que a única das grandes propostas orçamentárias em discussão que oferece um percurso plausível para equilibrar o orçamento é a que inclui aumentos de impostos significativos: o "Orçamento do Povo" proposto pela bancada progressista do Congresso. Diferentemente da proposta de Ryan, que consiste de ideologia direitista ortodoxa acompanhada por certa dose de raciocínio mágico, a proposta dos progressistas é genuinamente corajosa, porque pede por sacrifícios compartilhados.
É verdade que a arrecadação cresceria em parte devido à imposição de tributos substancialmente mais altos sobre os ricos, uma ideia popular em toda parte exceto em Washington. Mas a proposta também envolve aumento na contribuição previdenciária, o que resultaria em alta dos impostos pagos por cerca de 6% dos trabalhadores. Além disso, ao rescindir muitos dos cortes de impostos de Bush, não apenas aqueles que afetam os mais ricos, a proposta resultaria em modesta elevação até mesmo nos impostos da classe média.
Tudo isso, somado a cortes de gastos concentrados nas despesas com a defesa, resultaria em orçamento balanceado por volta de 2021. E a proposta torna esse resultado possível sem desmantelar o legado do New Deal e do programa Great Society, que nos deu o Medicare e o Medicaid.
Mas se a proposta dos progressistas tem todas essas virtudes, por que não está recebendo atenção nem ao menos comparável ao projeto de Ryan, muito menos sério? É fato que ela tem pouca chance de conquistar aprovação em curto prazo. Mas o mesmo vale para o plano de Ryan.
A resposta, lamento em dizer, é a insinceridade de boa parte dos integrantes da linha dura orçamentária. A preocupação deles com o orçamento não é tão importante quanto seu desejo de fazer exatamente aquilo que o Orçamento do Povo evita, a saber, rasgar nosso contrato social e recuar o calendário em 80 anos, sob a alegação de que isso é necessário. Eles não querem que ninguém lhes diga que uma virada radical à direita não é realmente necessária.
E não é, como a proposta orçamentária dos progressistas demonstra. Precisamos reduzir o deficit, ainda que não estejamos diante de uma crise imediata. A maneira pela qual escaparemos do vermelho, porém, é questão de escolha, e ao tornar aumentos de impostos parte da solução, podemos evitar cortes devastadores para os pobres bem como medidas que solapariam a segurança da classe média.

Paul Krugman

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