quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

A grande chance de Dilma

A nova nova ordem mundial está tomando forma. Esse acelerado rearranjo geoeconômico e geopolítico é a maior oportunidade para o Brasil se colocar no centro do poder mundial pela primeira vez na história deste país. E esse pode ser um dos maiores legados do governo Dilma.
É um momento definidor para a nossa diplomacia, e, alívio geral, ela parece estar mudando rapidamente sob Dilma e o chanceler Patriota.
A crise econômica global foi muito mais do Hemisfério Norte capitalista. O dinamismo e a resistência dos "emergentes" (termo antigo, já emergimos) após o colapso de Wall Street apressou o futuro, escreveu o colunista do "Financial Times" Martin Wolf.
Mas se há oportunidades nesse cenário, há também riscos.
Em artigo na revista "Foreign Affairs" intitulado "O Mundo do G Zero", o economista Nouriel Roubini, sempre pessimista, e Ian Bremmer, da consultoria Eurasia Group, afirmam que o novo concerto das nações regido pelo fragmentado G-20 deve gerar muito mais conflito do que cooperação global.
Eles sustentam que nenhum país ou grupo de países têm apetite ou poder suficientes para criar/impor consensos e harmonia. Caminhamos para o G-Zero.
Os EUA ainda estão atordoados pela crise, a Europa tenta salvar o euro, o Japão está paralisado política e economicamente.
Já China, Índia e Brasil estão tão focados em seu desenvolvimento interno que sobra pouca energia para o xadrez global.
E um G-2, com China e EUA definindo rumos, esbarraria nessa aversão de Pequim em assumir o fardo da liderança global.
Nessa fértil confusão, e diante de uma revolução econômica e tecnológica que sobrepassa fronteiras e acelera a globalização, a diplomacia é mais fundamental.
Dilma percebeu a camisa-de-força que a troika lulo-petista (Celso Amorim-Samuel Pinheiro Guimarães-Marco Aurélio Garcia) enfiou no país. Antes mesmo de assumir, ela destruiu o inexplicável alinhamento brasileiro com a teocracia iraniana e acenou com a transformação das relações com os EUA.
Maturou o Brasil, mudaram os EUA. O enfraquecimento político e econômico do país e o aumento da influência chinesa na América Latina forçaram Washington a olhar para a região e as possibilidades de uma renovada aliança com o Brasil.
Sob Lula, esse avanço bilateral óbvio ficou inviável por causa do ideologismo retrô que levou o presidente e seu governo a cutucarem os EUA até os 48 minutos do segundo tempo.
A poucos dias de deixar o cargo, Lula chegou a dizer que era "gostoso terminar o mandato vendo os Estados Unidos em crise".
A posse de Dilma possibilita uma transformação radical. Sua discrição de resultados será mais adequada do que o posturismo estéril do modelo anterior.
Não é à toa que porta-vozes da administração Obama falam abertamente de um novo momento bilateral. O presidente Barack Obama finalmente visitará o Brasil, em março. Seu secretário do Tesouro, Tim Geithner, esteve aqui preparando uma agenda comum com seu colega e até então desafeto ministro Guido Mantega. Isso tudo em menos de 40 dias no cargo.
Onde Lula preferia criar dissenso, colocando a espinhosa questão cubana no centro das relações bilaterais, por exemplo, Dilma busca acordo, resultado.
A agenda comum é abrangente e convergente: câmbio chinês, desenvolvimento global e regional, estabilidade regional, defesa da democracia nas Américas, combate ao narcotráfico, biocombustíveis, regulação de commodities.
Os cabos do Wikileaks revelam que Dilma é especialmente entusiasta de uma parceria EUA-Brasil para implantar o etanol na América Central e possivelmente na África.
É uma boa idéia.
Países centro-americanos gastam parte substancial do PIB importando energia. O etanol pode ser a saída, com apoio de EUA e Brasil, os dois maiores produtores mundiais, interessados em sua internacionalização.
O projeto aumentaria nossa projeção hemisférica e diminuiria a influência de Hugo Chávez, que subsidia petróleo para atrair países como República Dominicana, Nicarágua e El Salvador.
As possibilidades bilaterais são enormes, inclusive um acordo aduaneiro.
Os EUA são o país mais parecido conosco, pois Portugal que não o seria. O Brasil também pode reivindicar excepcionalidade entre as nações. Também somos caldeirão de culturas e circunstâncias únicas. Também somos capitalistas diante de um país imenso e cheio de oportunidades.
Renovando a aliança com nossos tradicionais aliados americanos e europeus, o Brasil será a melhor ponte entre o Norte e o Sul.
Ficamos muito tempo caolhos, só olhando para um lado do globo. Abrimos o segundo olho, finalmente.
Estamos no início do nosso salto. Se fizermos alianças corretas, iremos muito mais longe. A crise econômica derrubou as peças do tabuleiro: é hora de se mexer.

Sérgio Malbergier

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