quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Faça a coisa certa

Nasce um jovem em um bairro pobre com altos índices de violência e resiste à pressão para se marginalizar. Não se torna drogado, assaltante ou auxiliar de traficante. Não se evade da escola. Estuda duro e fica sempre entre os cinco melhores alunos da classe.
Deixa a mãe feliz. Mas não terá muitas oportunidades para ganhar mais que três salários-mínimos, quando entrar no mercado de trabalho. Ele não chegará a uma boa faculdade ou sequer ao terceiro grau, pois não terá o mesmo nível educacional da classe média. E não terá acesso a quem dirige as empresas.
Não há política pública específica que o apoie por se destacar. Ele está praticamente só.
Quase não temos políticas que estimulem quem faz a coisa certa. Há muitos projetos para quem entra no desvio: o egresso da prisão, o drogado, aquele que se atrasou na escola. Está certo. Mas, se o cidadão realizou o que a sociedade esperava dele, nada.
A meritocracia é valor importante. De uma forma ou outra, é aplicada em muitas empresas. Na universidade, há poucos programas de incentivo para quem se destaca. Porém, os melhores alunos acabam nos melhores empregos. Os melhores do Capão Redondo, da Vila Cruzeiro, da favela de Salvador, não.
Dizer que quem faz a coisa certa apenas cumpre com a obrigação é papo- furado. Todo o mundo precisa de reconhecimento, carinho e incentivo pelos gols marcados. Ainda que naturais.
No mundo de hoje, carente de indivíduos honestos e dedicados, repleto de frustrações com a ética, por que não incentivar quem faz a coisa certa?
O jovem dos Jardins que se destaca na escola é premiado pela família ou por cursinhos ávidos em propagandear o índice de sucesso na aprovação em faculdades de grife. Por que não dar bolsa para curso pré-vestibular aos que se destacam nas escolas públicas em regiões carentes? Por que não bancar bolsa completa para a faculdade aos primeiros colocados dessas escolas?
O mesmo ocorre com quem paga impostos. Os sonegadores sempre têm um perdão e um Refis (Programa de Recuperação Fiscal) à disposição. Os que pagam impostos em dia não recebem qualquer desconto. Desconto que seria crescente se continuassem a pagar em dia, tornando-se um investimento do Estado nos bons pagadores.
Mas não. Para eles, só a lei dura e crua. Se atrasarem uma prestação, multa. Se passarem mais dez anos em dia, nada.
O Estado é pai para transgressores e padrasto para quem é correto. E seguimos a lamentar os malfeitos que jorram pelo noticiário.
Não faz sentido. Está na hora de premiar os que se destacam pela virtude. Principalmente os mais pobres.

PROPOSTA DE POLÍTICA: MILHAGEM DA FAMÍLIA

Pesquisas de opinião pública ressaltam: cada vez mais, o lugar sagrado de refúgio para as pessoas é a família.
É a reação ao mundo hostil.
A família deve ser a base prioritária de programas que incentivem quem faz coisas certas. Ir ao encontro do movimento natural das pessoas garante raízes mais profundas. Com isso, certeza de continuidade.
Proponho um programa do tipo milhagem, de companhias aéreas. Coordenado pela mãe, sempre a âncora mais provável na estabilidade da casa.
Conforme os membros da família, em especial os filhos, forem realizando ações que o Estado tenha interesse em estimular, receberão pontos. O acúmulo de pontos dará direito a produtos concretos para a educação das crianças. A mãe escolhe livremente aquele que quiser.
O que daria pontos? Vacina, atenção à saúde, frequência e desempenho escolares,pagamento em dia de impostos, por exemplo.
Com X pontos, a mãe ganharia uma bolsa para o cursinho vestibular do filho, um computador pessoal ou livros. Conforme os pontos, as crianças alcançariam, no futuro, bolsas parciais ou integrais, em boas faculdades privadas. E outras tantas coisas que estimulem sempre uma educação melhor.
Uma família de classe média pode fazer poupança e investir na formação do filho, como reservar dinheiro para um MBA no exterior. Pobres, não. Eles se sentem impotentes. Têm que ralar única e exclusivamente para a sobrevivência. Se, com ações do cotidiano, puderem investir nos filhos, irão se sentir com poder e felizes.
Existe política melhor?
A ideia pode ser aprimorada. Se os governos a adotarem, irão fazer um bem danado a quem precisa.

DICAS PARA LEITURA

Para quem gosta de planos: textos sobre o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, cujo lema era '50 anos em cinco'. No Google.
Para quem gosta de metodologias, ferramentas e programas de qualidade: livro "Excellence in Government", de David K.Carr e Ian D. Littman (Library of Congress Catalog Number 90-084020 - Coopers & Lybrand). Para saber, pode verificar pelo Google.
Para quem gosta de textos mais acadêmicos: "Burocracia e Elites Burocráticas no Brasil", de Gilda Portugal Gouvêa, que com modificações foi tese de doutorado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. Editora Paulicéia.

SUGESTÕES DOS LEITORES

Entre várias contribuições, relaciono:
Mauro Silveira -RJ - sobre Gestão Transversal, destacando a falta de transversalidade nos programas de governo. Discutirei mais adiante.
Augusto Souza -SP - com várias sugestões sobre transporte público e engenharia de tráfego.

José Luiz Portella

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