domingo, 28 de novembro de 2010

Capitães Nascimento

"Tropa de Elite" é um filme interessante. Coloca o dedo na ferida em alguns pontos, como o da corrupção política e policial. Escorrega ao idealizar o policial honesto, mas torturador. Mas o mais importante é lembrar que se trata apenas de um filme pura diversão para alguns, crítica social para outros.
A vida real é mais complicada. A crise do Rio, então, muito mais. A histórica ação na Vila Cruzeiro, com o poder público reconquistando um território do narcortráfico, não é "Tropa de Elite". Parte da imprensa está batizando os policiais da operação de quinta-feira (25/11) de "Capitães Nascimento". Corremos perigo indo por aí. O Nascimento da ficção não é um bom modelo. Pelo contrário.
Os policiais militares que estão colocando a vida em risco cotidianamente merecem respeito, apoio, melhores salários etc. No entanto, a sociedade não pode dar carta branca para o uso indiscriminado da violência _a população mais pobre que vive nas áreas nas quais os criminosos se refugiam sabe o custo disso. Mesmo em situações extremas, como a que vive o Rio hoje, policial não pode agir como bandido. O Nascimento da ficção atuou muitas vezes assim.
Em "Tropa 2", "o sistema" é maior culpado. Na Vila Cruzeiro, "o sistema" deu uma resposta. Mostrou que o poder público está vivo no Rio de Janeiro.
Segurança Pública é assunto complicado demais para jornalista ficar dando opinião como especialista. O risco de falar bobagem se torna enorme. Não é o caso.
Por isso, este texto reflete impressões. O Bope é importante para o Rio de Janeiro, mas muito menos pelo lado "Capitão Nascimento" e muito mais pela faceta José Mariano Beltrame, o secretário da Segurança Pública do Estado.
Há questionamentos sobre a política de Beltrame, bancada a ferro e fogo pelo governador Sérgio Cabral. Mas é justo reconhecer que, se existe uma pessoa para a mídia tratar como um Eliot Ness dos nossos tempos, essa pessoa é Beltrame.
Ela é a vítima
Já que estamos num texto de impressões, mais uma.
Uma obviedade necessária: a privacidade dos políticos não é a mesma do cidadão comum. No caso de uma presidente eleita, saber fatos de toda a sua vida tem interesse público. Nesse sentido, a vitória da Folha no STM (Superior Tribunal Militar) é uma vitória do direito à informação. O jornal teve acesso a documentos da Justiça Militar do tempo em que Dilma esteve presa pela ditadura de 1964.
Há controvérsia sobre a publicação de informações obtidas sob tortura. O critério é um só: interesse público. Mas se trata de uma linha tênue. O jornal tem tratado o assunto com responsabilidade.
Mas não devemos esquecer de um detalhe fundamental. No caso, Dilma é a vítima, não a algoz.
Ingenuidade e ambição
Todas as vezes em que tentou fazer articulação política, Henrique Meirelles se deu mal. Ao exigir autonomia para ficar com Dilma, perdeu o apoio até de Lula para permanecer no Banco Central. Hoje, a embaixada do Brasil em Washington é o prêmio de consolação aventado pela presidente eleita. Ele prestou serviços importantes.
Vilão de plantão
Com a fama que tem, o PMDB é um difícil de ser defendido. Virou símbolo da sede por cargos e verbas dos partidos que sempre que dão apoio ao presidente de plantão.
Dependentes do suporte peemedebista no Congresso, FHC e Lula sabem o preço que pagaram pela chamada governabilidade. Confederação de caciques regionais, o PMDB é um legenda que exige acertos praticamente caso a caso.
Tudo isso é verdade. Mas o PMDB tem sido apresentado como o bicho-papão do governo Dilma, como se fosse o único partido com interesse em indicar o maior número possível de ministros e de dominar os principais postos no Congresso. Isso é uma meia-verdade.
O PT, partido da presidente eleita, Dilma Rousseff, não parece disposto a abrir mão de seus espaços para abrigar aliados que cresceram nas eleições, como o PSB. Por que o PMDB deveria fazê-lo? O PT apresenta a mesma voracidade pelo poder _voracidade cada vez mais explícita e cada vez mais distantes dos valores da fundação da sigla em 1980.
A disputa por espaços no governo é legítima. Cabe a Dilma estabelecer os critérios para barrar biografias suspeitas. Há partidos piores do que o PMDB. Aos trancos e barrancos, o presidente da sigla, o vice-presidente eleito Michel Temer, conseguiu dar alguma unidade à legenda. Mas é uma unidade com limite.

Kennedy Alencar

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