sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Somos como dizem que somos?

Janela para o mundo

Informa Vinícius Queiroz Galvão, na Folha desta quinta-feira, que a agência nacional de turismo do Reino Unido divulgou guia em que diz que os brasileiros sempre chegam atrasados, vestem-se de maneira provocativa para qualquer ocasião, interrompem as conversas a todo instante e costumam dar beijos e abraços indiscriminadamente.
Além disso, teríamos "noção de espaço pessoal menor do que outras culturas", o que, francamente, não sei o que quer dizer.
É evidente que o guia comete um erro primário, o da generalização. Se a ciência parece ter comprovado que não há um único ser humano igual a outro, é impossível, cientificamente, que todos os brasileiros sejam iguais uns aos outros --e, por extensão, nos comportemos todos da mesma forma.
Eu, por exemplo, neto de italiano, não posso ter o mesmo comportamento dos meus vizinhos, de ascendência japonesa. Até gostaria porque os dois, o Paulo e a Xica, são maravilhosos.
É de se imaginar, portanto, que a imagem que os britânicos formaram dos brasileiros deve-se ao comportamento de uma maioria, não de todos eles.
Ainda assim, é justo dizer que a maioria dos brasileiros sempre se atrasa? Ou é apenas um estereótipo? Francamente, eu não sei responder, talvez por ter verdadeira obsessão pela pontualidade.
As brasileiras vestem-se provocativamente em qualquer ocasião? Minha resposta é não. Ou, mais exatamente, nem mais nem menos do que mulheres de idades equivalentes de qualquer outra tribo, menos as muçulmanas.
Afinal, a tal de globalização levou a uma uniformidade até chata em um montão de coisas. O vestir é uma das mais padronizadas de todas as coisas. Não é que todo mundo se vista da mesma maneira, como é óbvio. Mas há uma certa padronização entre tribos. Posto de outra forma: descolados ingleses vestem-se mais ou menos como descolados brasileiros ou venezuelanos ou dinamarqueses. Bregas também observam uma certa uniformidade, independentemente da nacionalidade.
Damos beijos e abraços indiscriminadamente? Quando eu era jovem, séculos atrás, não dávamos. Era aperto de mão, abraço no máximo. Hoje, o jeito de saudar é mesmo um beijo no rosto. Mas todas as tribos o fazem.
Lembro-me até hoje de uma entrevista com Iasser Arafat, o líder palestino, em seu QG de Gaza, uns 16 anos atrás. Quando fui a ele apresentado pelo rabino Henry Sobel, Arafat tascou-me um beijo no rosto.
Interrompemos a conversa a todo instante? Só os chatos o fazem, sejam brasileiros, ingleses, italianos, argentinos ou venusianos.
Por fim, é bom ressalvar que a imagem que os brasileiros damos aos estrangeiros tem duas vertentes: uma, a dos turistas, que, nestes tempos de câmbio favorável, andam aos bandos por toda a parte. Outra, a dos brasileiros que vivem no exterior. São, pela mais recente conta do Itamaraty (setembro passado), 3 milhões, quase a metade (1,2 milhão) nos Estados Unidos. A propósito: no Reino Unido, que confeccionou o guia, há o maior contingente de brasileiros que vivem na Europa (180 mil em um total de 800 mil).
Para estes e também para os turistas, um aviso: a Flórida, objeto de desejo de tantos brasileiros, pode adotar uma legislação ainda mais dura que a do Arizona. O procurador-geral, Bill McCollum, também candidato nas primárias do Partido Republicano para escolher quem disputará o governo do Estado em novembro, está defendendo uma legislação que obrigaria a polícia local a comprovar se as pessoas que são detidas estão legal ou ilegalmente no país.
No Arizona, a lei autoriza essa investigação arbitrária. Na proposta McCollum, obriga.
Se os brasileiros, residentes ou turistas, se comportarem da maneira extravagante relatada no guia britânico, serão fatalmente vítimas disso que, no jargão local, se chama de "racial profiling" --ou seja, desconfiar de alguém pela sua aparência (preto ou latino é sempre suspeito).

Clóvis Rossi

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