As células que estão entre as principais suspeitas de espalhar o câncer
pelo organismo estão na mira de um estudo do Hospital A.C. Camargo, em
São Paulo.
Pesquisadores da instituição vão fazer um mapeamento genético das
chamadas CTCs (células tumorais circulantes), para tentar entender seus
pontos fortes e fracos.
Com isso, seria possível, por exemplo, saber que tipo de quimioterapia
teria efeito contra o câncer que está se espalhando pelo corpo. "É a
aplicação mais direta possível da medicina personalizada", resume
Marcello Ferretti Fanelli, diretor de oncologia clínica do hospital.
Se tudo der certo, o projeto do A.C. Camargo, que começa em breve e deve
durar dois anos, trará pistas importantes sobre o papel das CTCs no
avanço do câncer.
Fanelli conta que a circulação dessas células pela corrente sanguínea é
conhecida há mais de um século. "Mas ficou um hiato, ninguém sabia muito
bem o que fazer com elas", afirma.
A partir de 2005, no entanto, trabalhos nos Estados Unidos e em outros
lugares, inicialmente com tumores de mama, passaram a mostrar que havia
uma correlação entre a quantidade de tais células no sangue e a evolução
da doença nas mulheres.
Quanto mais CTCs, maior a chance da chamada metástase o espalhamento do
câncer para outros tecidos e órgãos, distantes dos locais onde a doença
apareceu pela primeira vez, supostamente por meio de células do tumor
original que caem na corrente sanguínea e são transportadas para longe.
Com novos estudos, a mesma relação apareceu para outros tumores, como os que afetam cólon e reto (intestino grosso) e próstata.
vilãs raras
Raríssimas, as CTCs correspondem a uma fração muito pequena do sangue
-no caso de tumores de mama, algo como cinco células por 7 ml de sangue,
quando outros tipos celulares podem chegar a vários milhares de
"indivíduos" no sangue normal.
"A questão é que os trabalhos que mostravam a importância das CTCs
ficavam na contagem. E a mera contagem, embora desse uma ideia sobre o
prognóstico, não trazia mais informação para os médicos do que uma
tomografia ou outros exames de sangue já usados", diz o especialista do
A.C. Camargo.
O próprio papel das células no surgimento de metástases não está
totalmente certo. Além das células circulantes, também existem células
"dormentes" que poderiam ter impacto importante para o espalhamento da
doença.
Por isso, a equipe do hospital pretende traçar um perfil mais detalhado
das CTCs. A ideia é acompanhar 230 pacientes, afetados por tumores de
pâncreas, pulmão, cólon e reto e com metástases.
Os pacientes vão receber a quimioterapia hoje indicada para seus casos,
mas as CTCs identificadas pelos exames de sangue terão seu DNA avaliado
em detalhe. Com isso, deverá ser possível saber se elas carregam genes
que as ajudam a resistir aos quimioterápicos, por exemplo.
QUEBRANDO A RETRANCA
Sabendo disso, os oncologistas poderiam escolher medicamentos capazes de
furar o bloqueio das CTCs e, assim, evitar que a doença continue se
espalhando pelo corpo.
Já existem outros estudos usando a genética dos tumores para tentar prever a evolução da doença.
"A diferença, no nosso caso, é que nós vamos ter uma visão muito mais
direta disso, sabendo se o tratamento está indo bem ou mal em tempo
real", diz Fanelli.
O projeto está recebendo US$ 700 mil em financiamento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
REINALDO JOSÉ LOPES
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