O esgoto do Panamby vai para o rio Pinheiros sem tratamento. Cai assim, sem cerimônia, nem vergonha, in natura, como ninguém pensava que acontecesse.
Ao lado do parque Burle Marx, o Panamby é um conjunto de apartamentos de luxo que podem custar até R$ 5 milhões, como reportou Giba Bergamin Jr., na Folha. Bem longe de ser uma favela ou desses bairros que surgem por ocupação desenfreada, na periferia, a acolherem os habitantes carentes que precisam trabalhar na cidade.
O projeto foi, inexplicavelmente, aprovado entre 1988 e 1990, sem rede de tratamento. Alguém deveria responder por isso. Mas, o pior é que a matéria afirma que o local "continua ganhando empreendimentos luxuosos". Então, o problema segue presente. Se for assim, é grave. Os moradores, segundo a vice-presidente da Associação do Panamby, nem faziam ideia do problema. Então, agora, sabem.
Não é só eles que não sabem. Do rio para a rua.
Em pleno Dia das Mães, com fluxo concentrado de veículos, interditou-se toda a região em torno do Ibirapuera, com ampla repercussão, por conta de uma corrida com fins nobres. Ela não poderia ser em outro dia?
A av. Gabriel Monteiro da Silva também foi interditada, no sábado, para a festa da Moët & Chandon. Atrapalhou os moradores. O local era a melhor escolha?
E, de repente, surge a proposta para derrubar uma área verde do Itaim, que caberia como modelo para o resto da cidade, onde há UBS (Unidade Básica de Saúde), creche, EMEI, a Biblioteca Anne Frank, teatro e Apae. Mais grave, ali vigora um conceito: a escola-parque. Conceito trazido pela figura de maior referência da educação no Brasil: Anísio Teixeira. É uma ideia-relíquia de 1947 que se consolidou muito depois no Itaim e que coloca as crianças em contato com a natureza e o saber, em conjunto. Melhor coisa de uma época em que a educação ambiental virou necessidade imprescindível.
Não sabia que tínhamos um lugar assim. Perdê-lo é inaceitável.
Além da poluição trazida pelos veículos 30 vezes maior que o aceitável.
Tudo isso ocorre como se fossem coisas comuns, sem significado maior. Lá se vão esgoto afora, a céu aberto, nossos escassos equipamentos, nosso patrimônio.
Por trás, a falta de olhar para a cidade como lugar que deva dar às pessoas vida melhor; a falta de se ter uma diretriz filosófica de como São Paulo deve ser; a falta de um planejamento global que enxergue o todo.
Será difícil ter um calendário completo de eventos que observe todas as datas e harmonize eventos, locais, impactos e benefícios?
Observa-se, com pesar, que a cidade vira fonte de esgotamento de seus recursos, mesmo quando os objetivos são nobres e alguns o são, uma forma de exploração que remonta ao início da colonização do Brasil, de modo a exaurir o solo e recursos naturais, sem preocupação com as consequências.
O certo seria pensar a cidade que se deseja, definir o que ela precisa para chegar onde queremos. Depois, com base nesse plano, realizar, com energia, todas as ações.
Constrange ver que fazemos o inverso. Mesmo que antiga, vale pegar carona com John Kennedy: "Em vez de sabermos o que pode ser extraído de São Paulo, está na hora de olhar para o que podemos construir na cidade".
Sair do esgoto a céu aberto. Deixar as crianças permanecerem numa escola com as árvores que ainda restam.
Domingo publicarei um complemento da coluna, o Tira Córrego, uma sugestão de transição para este problema.
José Luiz Portella
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