Não adianta assobiar, olhar para o outro lado e achar que os indignados da Grécia (os aganaktismeni do título) não têm a ver com você. A crise grega é um dos componentes de um cenário global cada dia mais desagradável, que vai levar a uma não menos desagradável desaceleração do crescimento econômico em todo o mundo, Brasil inclusive.
A mais recente avaliação da EIU (Economist Intelligence Unit, o braço de pesquisas da revista "The Economist") reduziu para 4,1% o crescimento do mundo contra 4,3% no mês passado e bem abaixo dos promissores 5% de avanço, registrados na saída da recessão, em 2010.
Para o Brasil, a previsão é de apenas 4%, pouco mais da metade dos luminosos 7,5% do ano passado. Na vizinhança, de interesse direito, o crescimento se reduzirá dos 6% em 2010 para 4,5% este ano.
O pior é que a crise grega está se transformando em uma tormenta perfeita, para a qual não se encontra guarda-chuva minimamente adequado.
O fato é que a Grécia não pode pagar a sua dívida, por mais ajuda que a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional aportem.
Reconhece, por exemplo, Daniel Gross, diretor do Centro para Estudos de Política Europeia (Bruxelas): "Pela maioria das medidas, a Grécia está insolvente, no sentido de que provavelmente não será capaz de gerar os amplos superávits fiscais que se requerem para servir sua dívida no longo prazo".
À impossibilidade técnica, soma-se o impasse político: para receber a ajuda da UE/FMI, o governo grego está sendo obrigado a adotar sucessivos pacotes de austeridade, que arrancam a pele de parcela substancial da população.
Diz, por exemplo, Apostolia Kyrioudi ao jornal francês "Le Figaro", que a encontrou na praça Syntagma, o marco zero de Atenas e o local em que se concentram os indignados há três semanas: "A austeridade nos arruinou, psicológica e economicamente. Não temos mais nada a perder doravante".
De fato, a taxa de desemprego na Grécia, que era de 11,7% no primeiro trimestre de 2010, às vésperas do primeiro pacote de austeridade, pulou para 15,9% no primeiro trimestre deste ano. E só pode aumentar porque o novo plano de austeridade, para o período 2012-2015, prevê defenestrar 150 mil dos 700 mil funcionários públicos.
É natural, nesse cenário, que recente pesquisa publicada pelo jornal "Kathimerini" mostre que 87% do público acha que o país está indo na direção errada.
Na prática, está se dando um rompimento do contrato social entre governantes e governados, diz, também ao "Figaro", Jens Bastian, pesquisador do instituto Eliamep. "O Estado diz Bastian não tem mais dinheiro para distribuir às pessoas. E os indignados estão prontos para lutar com unhas e dentes para proteger o que resta de seus direitos sociais".
Em meio ao drama (drama, aliás, é invenção dos gregos), União Europeia e FMI são incapazes de se pôr de acordo sobre como ajudar a Grécia, porque continuam fugindo de algum tipo de calote, inevitável em qualquer situação de insolvência, conforme já exposto na janela do dia 8 ("Calote já não é palavrão").
Clóvis Rossi
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