domingo, 28 de novembro de 2010

Pirometrópole!



Blog de Josias de Souza

Palossauro!



Blog de Josias de Souza

É hora de ser carioca

O Rio de Janeiro é minha segunda cidade, ali morei durante todos os anos 90, dirigindo a equipe de jornalistas que atua na sucursal desta Folha. E para lá retorno sempre que posso, para matar saudades, rever amigos e desfrutar de uma das cidades mais bonitas do mundo.
Essa vivência permitiu conhecer muitas nuances desta cidade partida entre o bem e o mal, entre os bandidos e mocinhos, entre o certo e o errado.
Nem tudo ali é tão claramente do bem ou do mal, totalmente certo ou completamente errado, tampouco os mocinhos são sempre mocinho e os bandidos os fora da lei.
Uma vez, o grande jornalista Janio de Freitas, eu recém chegado ao Rio, disse o seguinte: "Qualquer noite dessas, repara numa favela. Você vai ver que quando começa a chegar 10, 11 horas da noite, as luzes vão se apagando e à meia noite quase todas as casas estão às escuras. Sabe por quê? Porque a maioria dos moradores precisa acordar cedo no dia seguinte para trabalhar..."
Era e ainda é o óbvio de que se esquece: que a imensa maioria dos moradores das favelas é composta de trabalhadores, sem os quais a cidade "do asfalto" não funciona.
Essa proximidade e essa convivência tem suas vantagens e seus defeitos. O Rio talvez seja a cidade mais miscigenada do Brasil, se é que se pode chamar assim a mistura não apenas entre raças, mas entre pessoas de condições sociais distintas. Porém, essa convivência, ao longo dos anos, produziu também muitas excrescências, uma tolerância que deveria ser apenas do bem (entre as classes sociais distintas) tornou-se perniciosa (a tolerância ao crime).
O crime que começou pequenininho, com todo mundo achando normal ter uma banca de jogo de bicho ali ao lado, um caça níqueis no boteco da esquina, camelôs na calçada da frente de casa, flanelinhas praticamente morando no seu portão... Daí a boca-de-fumo na entrada da favela, que passou a vender o papelote de cocaína, que começou a ostentar o homem armado, que foi dominada pelo bando de outra favela, que tornou-se caso de segurança pública.
Do garoto da favela que vendia fumo chegou-se rapidamente ao "movimento" armado, violento, sem cara e sem nada a perder.
Claro que nada foi tão simples e veloz, mas aconteceu mais ou menos assim, e aconteceu sob o nariz da população, contando com sua conivência, apatia ou medo.
Portanto, neste momento em que a polícia ocupa um importante território que era dos bandidos, é hora de os cariocas se mobilizarem para reocupar os espaços que são seus. É preciso ser carioca de fato e de direito e exercer essa cidadania tão bacana e invejável, proporcionada, ainda e sempre, por uma cidade ímpar, deslumbrante, musical, acolhedora, com uma vocação inigualável para a felicidade e que tantas coisas boas já proporcionou a este país.
A cantora Claudinha Telles, em seu perfil do Facebook, conclama: "Chega de passividade Rio de Janeiro, vamos segurar o tranco, cariocada linda!".
É isso aí.
Esta não é a primeira e provavelmente não será a última vez em que o Rio tenta reagir ao crime que se instalou feito um câncer em suas colinas.
Mas algo me diz que agora é um excelente momento para se começar uma mobilização de verdade que permita ao Rio voltar a ser a cidade que aprendemos a amar.

Luiz Caversan

Capitães Nascimento

"Tropa de Elite" é um filme interessante. Coloca o dedo na ferida em alguns pontos, como o da corrupção política e policial. Escorrega ao idealizar o policial honesto, mas torturador. Mas o mais importante é lembrar que se trata apenas de um filme pura diversão para alguns, crítica social para outros.
A vida real é mais complicada. A crise do Rio, então, muito mais. A histórica ação na Vila Cruzeiro, com o poder público reconquistando um território do narcortráfico, não é "Tropa de Elite". Parte da imprensa está batizando os policiais da operação de quinta-feira (25/11) de "Capitães Nascimento". Corremos perigo indo por aí. O Nascimento da ficção não é um bom modelo. Pelo contrário.
Os policiais militares que estão colocando a vida em risco cotidianamente merecem respeito, apoio, melhores salários etc. No entanto, a sociedade não pode dar carta branca para o uso indiscriminado da violência _a população mais pobre que vive nas áreas nas quais os criminosos se refugiam sabe o custo disso. Mesmo em situações extremas, como a que vive o Rio hoje, policial não pode agir como bandido. O Nascimento da ficção atuou muitas vezes assim.
Em "Tropa 2", "o sistema" é maior culpado. Na Vila Cruzeiro, "o sistema" deu uma resposta. Mostrou que o poder público está vivo no Rio de Janeiro.
Segurança Pública é assunto complicado demais para jornalista ficar dando opinião como especialista. O risco de falar bobagem se torna enorme. Não é o caso.
Por isso, este texto reflete impressões. O Bope é importante para o Rio de Janeiro, mas muito menos pelo lado "Capitão Nascimento" e muito mais pela faceta José Mariano Beltrame, o secretário da Segurança Pública do Estado.
Há questionamentos sobre a política de Beltrame, bancada a ferro e fogo pelo governador Sérgio Cabral. Mas é justo reconhecer que, se existe uma pessoa para a mídia tratar como um Eliot Ness dos nossos tempos, essa pessoa é Beltrame.
Ela é a vítima
Já que estamos num texto de impressões, mais uma.
Uma obviedade necessária: a privacidade dos políticos não é a mesma do cidadão comum. No caso de uma presidente eleita, saber fatos de toda a sua vida tem interesse público. Nesse sentido, a vitória da Folha no STM (Superior Tribunal Militar) é uma vitória do direito à informação. O jornal teve acesso a documentos da Justiça Militar do tempo em que Dilma esteve presa pela ditadura de 1964.
Há controvérsia sobre a publicação de informações obtidas sob tortura. O critério é um só: interesse público. Mas se trata de uma linha tênue. O jornal tem tratado o assunto com responsabilidade.
Mas não devemos esquecer de um detalhe fundamental. No caso, Dilma é a vítima, não a algoz.
Ingenuidade e ambição
Todas as vezes em que tentou fazer articulação política, Henrique Meirelles se deu mal. Ao exigir autonomia para ficar com Dilma, perdeu o apoio até de Lula para permanecer no Banco Central. Hoje, a embaixada do Brasil em Washington é o prêmio de consolação aventado pela presidente eleita. Ele prestou serviços importantes.
Vilão de plantão
Com a fama que tem, o PMDB é um difícil de ser defendido. Virou símbolo da sede por cargos e verbas dos partidos que sempre que dão apoio ao presidente de plantão.
Dependentes do suporte peemedebista no Congresso, FHC e Lula sabem o preço que pagaram pela chamada governabilidade. Confederação de caciques regionais, o PMDB é um legenda que exige acertos praticamente caso a caso.
Tudo isso é verdade. Mas o PMDB tem sido apresentado como o bicho-papão do governo Dilma, como se fosse o único partido com interesse em indicar o maior número possível de ministros e de dominar os principais postos no Congresso. Isso é uma meia-verdade.
O PT, partido da presidente eleita, Dilma Rousseff, não parece disposto a abrir mão de seus espaços para abrigar aliados que cresceram nas eleições, como o PSB. Por que o PMDB deveria fazê-lo? O PT apresenta a mesma voracidade pelo poder _voracidade cada vez mais explícita e cada vez mais distantes dos valores da fundação da sigla em 1980.
A disputa por espaços no governo é legítima. Cabe a Dilma estabelecer os critérios para barrar biografias suspeitas. Há partidos piores do que o PMDB. Aos trancos e barrancos, o presidente da sigla, o vice-presidente eleito Michel Temer, conseguiu dar alguma unidade à legenda. Mas é uma unidade com limite.

Kennedy Alencar

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Musica Romantica deixo - Ivete Sangalo

Respirar fundo e meditar

Desencarnando!



Blog de Josias de Souza

Carnaval fora de época! Hu



Blog de Josias de Souza

Santos, mártires e heróis

O comportamento é disseminado e atinge indistintamente fiéis e guerrilheiros, filósofos e soldados. Estou falando da disposição de morrer por uma ideia. Praticamente todas as religiões têm seus mártires, que foram assassinados por defender sua fé. Não é apenas a confiança numa outra --e melhor-- vida que move os candidatos a santo. O fenômeno, afinal, ocorre também em esferas mais seculares, como exércitos, e mesmo ateias, como movimentos revolucionários de esquerda. Até a ciência cultiva seus heróis. De minha parte, acho que não há nada mais estúpido do que morrer por uma ideia, seja ela religiosa ou laica, mas avancemos com um pouco mais de calma.
Ainda bem que ninguém mais lê vidas de santos. Se querem entupir o Monteiro Lobato de notas por ter empregado linguagem racista, que cautelas não teríamos de adotar antes de permitir que crianças lessem, por exemplo, a história de santo Eustáquio, que, segundo reza a lenda, preferiu ser cozinhado vivo junto com sua mulher e filhos a oferecer sacrifício a deuses pagãos. Será que um alerta do tipo "não tente fazer isso em casa" bastaria?
O ponto central é que as vidas de santo, as histórias de martírio e gestos de heroísmo são repetidos aos quatro cantos justamente porque alguém vê neles um valor a ser imitado. Aqui, a nota acabaria com o propósito mesmo do relato hagiográfico. OK. Admitamos que deixar-se cozinhar num caldeirão é um caso extremo, que ninguém em sã consciência defenderia nos dias de hoje. Será?
Mesmo reconhecendo que existem níveis de dor que dobram qualquer um, olhamos com desconfiança para o ex-guerrilheiro que, sob tortura, teria dado com a língua nos dentes. A própria Constituição do pacífico Brasil prevê a pena de morte em caso de guerra, ou seja, para aqueles que, orientando-se no mais justificável bom senso, se recusarem a lutar (a maior parte das guerras ocorre por motivos bem imbecis, é bom lembrar).
De todo o panteão de santos e heróis, fico com Galileu Galilei, que, muito sensatamente, não teria hesitado antes de abjurar a teoria heliocêntrica para poder continuar vivendo.
Cuidado. Não estou aqui afirmando que é uma tolice cultivar alguns princípios e defender ideais. Só o que digo é que existe um limite máximo até onde levar a luta: a vida. Não sou apenas eu que penso assim. Trago em meu socorro Charles Darwin, cuja teoria mundialmente famosa preconiza que devemos sobreviver a quase qualquer custo e fazer muito sexo. Se, em determinadas circunstâncias, ainda faz sentido que nos sacrifiquemos para salvar um ou mais parentes (idealmente, dois irmãos ou oito primos), fazê-lo em favor de uma abstração é um beco sem saída evolutivo. Prova-o o fato de ninguém até hoje viu nenhum animal além do homem defendendo uma ideia até a morte.
E, se estamos diante de um comportamento exclusivamente humano, bem disseminado (quase um universal) e que aparentemente não faz muito sentido biológico, trata-se de algo que vale a pena investigar melhor.
A primeira pergunta a se fazer é: para que diabos a vocação para mártir serve? Temos aqui duas possibilidades, ou bem ela é uma adaptação humana obtida por seleção natural ou é apenas um efeito colateral resultante da forma como nossos cérebros estão montados. Seria relativamente fácil demonstrar que o altruísmo radical, embora faça mal ao indivíduo que o comete, serve aos propósitos do grupo em que ele vive. O incentivo ao heroísmo, afinal, tende a produzir soldados mais valentes e sociedades mais coesas, como se vê nos movimentos nacionalistas. A seleção aqui não ocorreria no nível do indivíduo (ou dos genes, como quer Richard Dawkins), mas do grupo.
E aqui nós entramos num dos terrenos mais pantanosos do neodarwinismo. Os biólogos mais puristas, se não rejeitam, consideram a seleção de grupo extremamente complicada. O problema básico é que ela não é lá muito estável. Para começar, o sujeito que se sacrifica tem maiores chances de não deixar descendentes, extinguindo junto consigo os genes responsáveis pela propensão a colaborar. Para secundar, sempre valeria a pena para indivíduos egoístas pegar uma carona na coesão grupal sem dar sua justa contribuição. Eles teriam maior sucesso reprodutivo, espalhando genes egoístas. Seria assim muito difícil fixar num 'pool' genético qualquer as características que favorecem o grupo.
Parece mais promissor imaginar a vocação para mártir como um subproduto de outras funções cerebrais. Uma analogia válida é o uso recreativo de drogas como maconha e álcool. Ninguém --espero-- vai sugerir que a capacidade de sentir barato e ficar bêbado representam uma adaptação humana. O efeito que drogas têm sobre nós é mais bem descrito como um acidente: são substâncias que exploram, de forma por vezes parasítica, os centros de prazer e recompensa do cérebro, cujas finalidades primordiais são o aprendizado e a fixação de hábitos que satisfaçam necessidades vitais, como engordar e fazer sexo.
Quais seriam as estruturas cognitivas que o martirismo explora? Aqui não podemos fazer muito mais do que especular. Uma possibilidade é que ele funcione de forma parecida com a elaboração do luto. Originalmente, serviria mais para tentar dar um sentido à morte de entes queridos que tombaram em conflitos do que para convencer os sobreviventes a meter-se no mesmo caminho. Seria uma forma meio esquisita de aplacar nossa ânsia por transcendências. O instinto de preservação, que costuma ser forte, já funcionaria como um freio a interpretações excessivamente literais do autossacrifício.
Num momento posterior, religiões, Estados e dirigentes de células revolucionárias descobriram o poder que a vocação para o heroísmo exerce sobre alguns indivíduos e decidiram explorá-la em favor dessas organizações. Vale lembrar que aqui nós já não estamos mais falando de seleção de grupo no sentido clássico, pois, ao contrário de um clã de caçadores perdido na floresta, uma igreja ou um país não dependem mais da fixação de um 'pool' de genes para sobreviver. Essas superestruturas, ou memes, para utilizar o vocabulário neodarwinista, desde que tomem o cuidado de não esgotar rapidamente os recursos humanos à sua disposição, podem perfeitamente explorar indivíduos.
A crer nessa chave hermenêutica, religião, ideologia, nacionalismo e cerca de 3/4 da literatura têm um substrato comum, que se aproveita da inclinação natural de nossas mentes por histórias de heroísmo. Como ocorre com as drogas, o fenômeno é legítimo até o ponto em que nos proporciona prazer e preenche alguns vazios existenciais. Deixa de sê-lo quando passa a nos impor ônus despropositados. Se há um verdadeiro crime contra a natureza, ele não está em formais mais imaginativas de fazer sexo, mas em exigir que alguém dê a própria vida por uma ideia abstrata --e, em geral, carente de comprovação.

Hélio Schwartsman

Senna revisitado

É um paradoxo: quanto mais você perceber que está equivocado, menos equivocado você estará.
Foi o que aconteceu comigo quando vi "Senna" no cinema outro dia.
Era daqueles espíritos de porco, esse sentimento nada kasher, que achavam Ayrton Senna um alienado, que só falava em Deus e namorava loiras inteligentes, quando poderia estar usando sua proeminência para avançar debates relevantes no Brasil.
Saí de "Senna" convicto de que Senna foi um brasileiro enorme, avançado, que tem muito mais a ver com o Brasil de hoje, confiante e ambicioso, do que o país de sua época, sem rumo.
O filme traz cenas de enorme tensão na Fórmula 1, dentro e fora das pistas. Os produtores tiveram acesso a cenas inéditas dos bastidores da F1. O mito Senna despontou no auge da TV, num esporte global obcecado por detalhes e por registro de imagens.
Tudo foi filmado, das trocas de farpas entre Senna e seu rival Alain Prost a conflagradas reuniões de pilotos e dirigentes do esporte a passeios pelas praias de Angra dos Reis.
Os depoimentos das pessoas que acompanharam Senna aparecem apenas em áudio. Vemos na tela só uma sucessão de imagens de arquivo dos fatos eletrizantes da vida do piloto: sua obsessão pela liderança, sua confiança, sua ousadia, seu humanismo. Um espírito animal que hoje se vê em muitas empresas e empresários brasileiros disputando e liderando mercados pelo mundo.
E que delícia rever o Brasil do anos 1980. Xuxa recebendo o piloto em seu programa infantil no auge do namoro das duas celebridades, ele falando alguma obscenidade no ouvido dela, com cara de malandra, exibido no programa infantil líder de audiência entre os baixinhos.
Aliás, não faltam cenas de Senna com mulheres muito bonitas. O que me deixa mais constrangido ainda: uma das ridículas convicções nossas, espíritos de porco da época, era que Senna não gostava de mulheres, falávamos até em premiar quem trouxesse uma reportagem consistente sobre a sexualidade do piloto.
Perdão, Senna. E, não contem a ninguém, chorei no filme. Durante as cenas emocionantes de sua primeira vitória num GP Brasil, em Interlagos. No beijo que dá em seu pai nessa hora. Nas cenas que antecederam a sua morte.
O documentário ainda vai matar a ficção. Enquanto a ficção está exaurida, sem boas histórias a inventar, o documentarista tem como matéria-prima um mar de imagens e sons que não parará nunca de crescer. Hoje registramos imagens de tudo, e isso ainda vai aumentar. Basta um bom roteiro e uma boa edição para transformar essa Babel imagética em grande obra cinematográfica.
Foi isso o que aconteceu com "Senna", o filme. Assista.

Sérgio Malbergier

O estranho mundo dos senhores do dinheiro

Estranho mundo esse que nos toca viver. Comecemos com a descrição feita nesta quinta-feira pelo jornal francês "Le Monde" do "modus vivendi" (e "operandi") dos banqueiros irlandeses até a crise de 2008, que aleijou o país:
Aos clientes, alguns nem sempre solventes, eram oferecidos empréstimos hipotecários equivalentes a 100% [do valor dos imóveis], às vezes até mais, sem que lhes fosse exigido nem mesmo um hollerit.
À frente dos bancos, uma nova geração de dirigentes megalomaníacos substituiu os banqueiros prudentes de antigamente. A Irlanda era pequena demais para eles; precisavam do Reino Unido, da América, da Ásia. Abriam-se sucursais luxuosas em todos os cantos do globo. Na medida em que a distribuição de gordos dividendos estivesse assegurada, os acionistas nada tinham a dizer sobre as anomalias dos balanços, sobre os prêmios maravilhosos de fim de ano, sobre o modo de vida faustoso dos senhores do dinheiro".
Detalhe nada secundário: essa descrição vale para o modo de vida dos "senhores do dinheiro" em incontáveis outros países.
Aí vem a crise, os bancos quebram, o Estado entra em seu auxílio, fica igualmente quebrado e os senhores do dinheiro saem ao ataque contra a Irlanda, obrigando seus sócios no euro a correrem para socorrê-la.
Nessa altura, surge uma certa Angela Merkel, que vem a ser a chanceler (primeira-ministra) da Alemanha, não pertence nem remotamente à esquerda revolucionária, e sugere que os detentores de títulos dos países em crise com suas dívidas paguem sua parte da conta, no caso de impossibilidade ou dificuldade insanável para que o Tesouro público honre totalmente os papéis.
Está, na prática, insinuando que só um calote, ao menos parcial, põe fim à ciranda da crise em que está envolvida a Europa.
Traduzindo para o português comum e corrente, Merkel está dizendo o seguinte aos corsários da banca: "Vocês ganharam muito dinheiro com os títulos do Tesouro, muito bem remunerados, então é hora de que assumam os riscos".
Perfeito. Politicamente, o que a chanceler está invocando é "a primazia da política sobre os mercados financeiros". De novo, perfeito.
Das palavras aos atos: o governo alemão está para aprovar legislação que permite dividir os custos entre o Tesouro (o dinheiro de todos os cidadãos, na verdade) e os banqueiros.
Se você acha que a avaliação de Merkel mereceu os aplausos devidos por sua sensatez, é um ingênuo irremediável. O que se lê nas melhores publicações ocidentais, de direita, de centro ou até de esquerda, é que ela só agravou a crise irlandesa com suas declarações. Os donos de títulos ficaram assustados e passaram a cobrar ainda mais do que já vinham cobrando, preventivamente.
Seria duplamente escandaloso, portanto, não fosse a anestesia que tomou conta dos governos e da opinião pública. Tanta anestesia que o projeto alemão se de fato vier a ser implementado só valerá a partir de 2016, quando a Irlanda já estiver completamente exangue.
Aliás, podem estar também os outros dois países na mira dos corsários, pela ordem, Portugal e Espanha.
Mas, atenção, se a Espanha entrar na roda, a crise dificilmente será contida nos limites do euro. Sua economia tem o dobro do tamanho das de Grécia, Irlanda e Portugal somadas.
Haverá dinheiro para amparar a Espanha, depois dos pacotes de ajuda à Grécia e à Irlanda e, eventualmente, Portugal?
Não seria mais que justo que saísse pelo menos em parte de quem, como diz Merkel, tanto ganhou na bonança?

Clóvis Rossi

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Rio 40 graus!



Blog de Josias de Souza

Fôlego de lobo!



Blog de Josias de Souza

Fabulações!



Blog de Josias de Souza

Conto-da-República!



Blog de Josias de Souza

Decifrando Dilma Rousseff

Dilma Rousseff, a presidente eleita, tem sido econômica em suas falas públicas. Tem evitado antecipar seus passos no governo que se avizinha. Num momento em que se dedica a montar sua equipe, tal comportamento faz sentido. Só que gera campo fértil para especulações. Daí que muito tem se falado sobre os desejos da futura presidente, mas até o momento não é possível saber se batem com a realidade.
Vejamos o que vem acontecendo no campo da economia. A principal dúvida do momento versa sobre o funcionamento do Banco Central durante o governo dilmista. Hoje, não falta quem diga que Dilma quer porque quer reduzir os juros logo no seu primeiro ano de governo. Que ela não vai aceitar o discurso ortodoxo em vigor no BC, que teme reduções drásticas nos juros e até acena, para o próximo ano, com uma elevação na taxa.
Tal visão bate com o pensamento da ex-ministra da Casa Civil, mas não necessariamente com o da presidente eleita. Há quem diga exatamente o inverso. Que Dilma Rousseff, na condição de chefe de governo, não deseja reduzir os juros na "canetada". E que, mesmo a contragosto, entenderá uma elevação dos juros logo no início de sua administração para evitar uma alta da inflação.
É nesse cenário que se discute a sucessão no BC. A leitura mais apressada aponta que uma saída de Henrique Meirelles significará uma mudança na política atual. Apesar de lógico, não bancaria esse raciocínio antes de ela começar a governar de fato. Durante a campanha, Dilma sinalizou que manteria a autonomia operacional do BC. Garantiu isso publicamente e em conversas reservadas. Será que está prestes a abandonar esse discurso? Essa a dúvida que tanto incomoda o mercado nessa fase de transição.
O fato é que, no caso de Meirelles, Dilma está muito irritada com o atual presidente do BC. Ela não vai convidá-lo a ficar no BC. Não gostou nem um pouco de ouvir que ele impunha condições para seguir no comando do banco, como a manutenção da autonomia da instituição. Do seu lado, Meirelles diz, reservadamente, que foi alvo de uma operação para desgastá-lo vinda da parte de seus inimigos no governo. Pegaram uma posição conhecida sua, a defesa da autonomia operacional do BC, para passar a imagem de que estava colocando a presidente eleita contra a parede.
Do lado dos aliados de Dilma, mas inimigos de Meirelles, a versão é outra. A de que o presidente do BC, sabendo que não seguiria no governo, vazou para a imprensa as condições em que aceitaria permanecer no cargo. Tudo para criar um fato consumado e sair com o discurso de que deixou o banco por não ter recebido as garantias de liberdade de trabalho.
Nos próximos dias, Dilma vai divulgar sua equipe econômica e tudo ficará mais claro. Prevalecendo o que andaram falando seus assessores mais próximos, o Banco Central terá um novo comandante. A dúvida sobre a condução da política monetária no governo dilmista pode, porém, persistir. A conferir.
A cara de quem?
Lula já disse e repetiu que o ministério de Dilma Rousseff terá a cara dela. Desde então, o que mais se lê é que o presidente pediu à sua sucessora para manter esse, aquele e outro ministro do atual governo. Como Dilma tem se mantido em silêncio sobre sua equipe, é impossível saber se ela acatará todos os pedidos de Lula. Num caso, já decidiu. Manteve Guido Mantega na Fazenda.
A dúvida que fica, contudo, é se tudo aquilo que é divulgado como pedido de Lula é, de fato, um desejo do atual presidente. Ele pode muito bem estar fazendo um discurso para os amigos e, outro, para Dilma. Em outras palavras, pode estar fazendo questão de vazar que desejaria manter esse e aquele ministro somente para dizer que fez sua parte.

Valdo Cruz

O lado lixo da internet

A ombudsman da Folha, Suzana Singer, no domingo, e o especialista bielorrusso radicado nos Estados Unidos, Evgeny Morozov, na segunda, disseram sobre a internet o que eu há muito tinha vontade de dizer, mas estava esperando vozes mais autorizadas.
Suzana, sob o sugestivo título "Comente com moderação", cita cartas publicadas nesta Folha.com que são lixo puro, para emendar: "A rede, com o seu manto protetor do anonimato, libera o lado mais perverso e raivoso, como se viu recentemente na onda antinordestina que surgiu depois da vitória de Dilma Rousseff".
Quase perfeito, cara Suzana. Quase porque esse lado "perverso e raivoso" vem sendo liberado faz muito mais tempo.
Menos mal que a ombudsman puxou também para o seu texto comentário de uma leitora não identificada que diz: "Os comentários na Folha.com me fazem sentir vergonha de pertencer à raça humana". Bem-vinda ao clube, cara leitora, embora tema que sejamos muito solitários nele.
Na segunda-feira, Morozov ia um pouco na mesma linha mas apontando problemas ainda mais graves.
Primeiro problema: "Alguns governos autoritários estão fazendo experimentos com propaganda ideológica e se tornarão muito ativos na internet. Nada na rede dificulta espalharem sua mensagem com mais ressonância do que nunca".
Segundo problema: "Operações sigilosas em que se pagam blogueiros ou se subsidiam sites para tentar mudar a opinião pública".
O especialista citou o Kremlin e o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, mas, na recente campanha eleitoral brasileira, ficou evidente que havia blogueiros pagos para destilar veneno.
Aliás, um dos problemas da internet é que você nunca sabe se este ou aquele blogueiro é apenas um legítimo interessado em participar do debate público ou é financiado por alguém com objetivos propagandísticos ou piores.
É desanimador verificar, nos comentários à colunas e blogues, a predominância de dois tipos de atitudes, ambas calhordas: uma é xingar, em vez de argumentar.
A outra é mais canalha: o remetente atribui um rótulo a quem faz um comentário como forma de desqualificar o interlocutor, em vez de responder a seus argumentos.
Funciona mais ou menos assim: João dos Anzóis Carapuça critica o Corinthians. Vem alguém e diz que João é palmeirense ou sãopaulino. Fica, por isso, dispensado de discutir os argumentos do João.
Vale na política, na economia, na religião, até no debate sobre meio-ambiente.
Um caso com algum parentesco com o exemplo acima é a polêmica sobre a premiação a Chico Buarque com o "Jabuti", tido como o principal prêmio literário do Brasil.
A premiação de "Leite Derramado", definida pelo público, foi contestada pela Editora Record, que deixou no ar o mesmo tipo de alegação já mencionado: Chico teria sido premiado por ter feito campanha por Dilma Rousseff, afinal tão popular que acabou eleita presidente da República. Não seria, portanto, pelo seu talento literário.
Todo o mundo tem o direito de gostar ou de odiar o livro. Eu ainda não li, mas li o anterior, "Budapeste", delicioso, daqueles que você pega e não consegue largar. Para o meu gosto, portanto, o talento de Chico está comprovado --e não só pelas suas músicas-- desde sempre. Talento reconhecido durante a ditadura, que o censurava, pela democracia antes de Lula chegar ao poder e depois também. Não há portanto motivos para colocar um fator político à frente da discussão de seu valor como escritor.
Claro que todo o mundo pode --e até deve-- discutir tudo o que Chico escreve, músicas ou livros. Mas que tal manter a discussão no âmbito da literatura ou da música, sem meter no meio outros fatores, como simpatias políticas? Vale para os comentários a textos de colunistas e blogueiros.

Clóvis Rossi

Ditadores que vão

Havia uma época em que eles existiam aos montes pela América Latina. Hoje, exceção feita ao regime que vigora em Cuba, felizmente eles não existem mais. Apesar de alguns arroubos autoritários de certos governos, a verdade é que o típico ditador latino-americano dos séculos 19 e 20, personagem que alimentou grandes obras da literatura e da não ficção da região (leia mais abaixo), desapareceu.
Nas últimas semanas, eventos trouxeram à lembrança dois deles. Apesar de ignoradas no Brasil, duas notícias trataram de acrescentar capítulos à amarga história dos ditadores da região.
Na Argentina, no último dia 8, morreu Emilio Eduardo Massera, aos 85 anos. O almirante, com os generais Jorge Rafael Videla e Orlando Ramón Agosti, formou a junta que tomou o poder após o golpe de Estado que derrubou a viúva de Perón, Maria Estela Martinez, em março de 1976.
Massera era o chefe da Armada, e portanto responsável por tudo o que se passava na temida ESMA (Escuela Mecánica de la Armada), um dos principais centros de detenção ilegal de prisioneiros políticos. Ali se deram roubos de bebês, torturas e mortes. De lá também partiram condenados a serem arremessados de aviões no Rio da Prata. Como se sabe, o regime militar argentino, que perdurou até 1983, deixou um saldo de 30 mil desaparecidos, segundo estimativas de grupos de direitos humanos.
Em 1985, durante o primeiro governo democrático pós-ditadura, o do presidente Raúl Alfonsín, Massera foi julgado e condenado a prisão perpétua por crimes contra a humanidade. Porém, recebeu indulto durante a gestão do peronista Carlos Menem, em 1990.
Voltou a ser processado, mas, em 2002, sofreu um derrame cerebral e foi declarado incapaz. Em 2005, já durante o governo do também peronista Néstor Kirchner (1950-2010), a Corte Suprema do país declarou anuladas as leis de Obediência Devida e Punto Final, e, em 2009, seu indulto foi declarado inconstitucional. Ou seja, Massera, mesmo sem ter consciência disso, morreu condenado.
Já na República Dominicana, o fantasma a voltar à tona foi o do ditador Rafael Leonidas Trujillo (1891-1961), que governou o país oficialmente entre 1930 e 1938 e depois entre 1942 e 1952, mas mantendo seu poder tirânico até sua morte, em 1961. A ditadura de Trujillo é conhecida como uma das mais sangrentas da América Latina.
Pois uma juiz acaba de determinar a proibição do lançamento de um livro de autoria de uma das filhas do ditador, "Trujillo, Mi Padre y Mi Memória", além de vetar também a abertura de uma filial da Fundação Rafael Leónidas Trujillo na República Dominicana.
A família acusa a justiça de estar agindo contra a liberdade de expressão e quer, além de lançar o livro e abrir o tal museu, repatriar os restos mortais de Trujillo, hoje na Espanha.
A ocasião é boa para lembrar alguns clássicos latino-americanos que refletem sobre esses períodos de trevas. Sobre Trujillo, justamente, o melhor romance já escrito é "A Festa do Bode" (Arx), de Mario Vargas Llosa (olha ele de novo), que reconstrói a era e o episódio de seu assassinato.
Sobre ditaduras na Argentina, um livro fundamental que acaba de ser lançado no Brasil pela Companhia das Letras é "Operação Massacre", de Rodolfo Walsh. Este não é de ficção. Trata-se de uma longa reportagem sobre um assassinato de civis pela polícia em 1956, durante o governo do general Pedro Eugenio Aramburu.
A tradição de usar a literatura como meio de refletir sobre governos autoritários é já antiga na América Latina. Pode-se dizer que começou em 1851, com "Amalia", de José Marmol. O livro narra uma história de amor destruída por Juan Manuel de Rosas.
Mas essa prática se tornou comum mesmo ao longo do século 20, com a proliferação dos regimes ditatoriais e, paralelamente, da produção de nossos autores.
Em 1946, o guatemalteco e vencedor do prêmio Nobel, Miguel Angel Asturias, lançou "O Senhor Presidente", em que construiu um ditador inspirado na figura real do presidente Manuel Estrada Cabrera.
Nos anos 70, surgiram várias obras. "O Recurso do Método", de Alejo Carpentier, retrata um ditador caribenho fictício baseado em exemplos reais. "O Outono do Patriarca", de Gabriel García Marquez, acompanha a decadência de um líder. E "Eu, o Supremo", de Augusto Roa Bastos, narra a vida do ditador paraguaio José Gaspar de Francia, em forma de diário.
Em momentos em que alguns ditadores saem de cena por razões naturais, como Massera, ou voltam a ser discutidos, como Trujillo, vale evocar as letras para entender a história.

Sylvia Colombo

Bacalhau, atum e cia.

Do jeito que a coisa vai, todo mundo vai ter de virar vegetariano. Não por opção, mas por falta dela. Mesmo quem andava pensando em escapar da carne vermelha, em favor do peixe, vai precisar rever posição, mais dia menos dia, com a crise dos estoques de pescado.
Carne vermelha, para esta coluna, é bovina, suína ou galinácea. Bichos criados em escala industrial, o que ocasiona um monte de problemas ambientais --destruição de florestas (o rebanho brasileiro que mais cresce é o da Amazônia) à contaminação de mananciais com efluentes (esterco). Oxalá ovinos e caprinos tenham menos impacto, rogam os mais crédulos.
Mesmo frangos, que já foram considerados carne "branca" e saudável, são para lá de problemática. O jeito como são criados nas grandes granjas costuma ser aterrador, para quem se dá ao trabalho de buscar saber de onde vem a comida. Mesmo sem simpatia pelo bicho em si, dá para compadecer-se diante da informação de que os bicos são decepados para impedir automutilação.
Peixes são outros 500. Não têm exatamente patas, cara, cintura. Locomovem-se de forma ondulatória, algo impossível de imaginar como remotamente humano. Repare como parece canhestro o nado de sereias e tritões no cinema.
São vertebrados como nós, mas é como se não fossem. Para o filósofo Peter Singer, qualificam-se como animais capazes de sentir dor, mas qualquer um pode perceber que são inferiores a coelhos e leitões. Para melhorar, levam a fama de ser carne saudável, cheia de ômega-3, sabe-se lá o que mais. Apesar da aparência e da reputação, não são menos problemáticos.
Considere os acepipes bacalhau e o atum. São também duas das variedades de pescado com maior interesse comercial e, por isso, capturadas em excesso. O atum do Mediterrâneo já foi para o saco. Idem o bacalhau do Atlântico, antes pescado aos borbotões a leste do Canadá e dos EUA, agora disponível em quantidades sustentáveis só no mar de Barents, em gélidas águas norueguesas e russas.
(A situação do bacalhau deu ensejo a uma pequena controvérsia na página Tendências/Debates da Folha, que pode ser lida por assinantes do jornal e do UOL aqui e aqui. Até o crítico de culinária Josimar Melo se mostrou sensível, aqui, ao conflito entre o alto custo do bacalhau, fruto de sua escassez, e o benefício de uma carne de sabor, cor e textura inesquecíveis.)
Nada menos que 70% dos estoques pesqueiros comerciais estão ameaçados, afirma o relatório "Living Planet", do WWF. Bacalhau e atum, dois grandes predadores, foram as primeiras estrelas a cair do firmamento submerso, mas as frotas pesqueiras --itas movidas mais a subsídios do que combustível e mercado--oltaram seus esforços arrasadores para o pescado miúdo, de sardinhas e lulas a camarões e krill, o impalatável crustáceo antártico.
Sobrou até para os tubarões. Um quilo de barbatana, consumido como iguaria na Ásia, pode custar cem dólares. Azar dos cabeças-de-martelo, abatidos à taxa de 4 milhões de exemplares por ano.
A coisa mais difícil do mundo é pôr os países de acordo sobre como freios a essa atividade predatória. Segundo o WWF, 3 bilhões de pessoas --quase a metade da população global-- dependem do pescado para suprir pelo menos 15% da proteína em suas dietas.
Os oceanos compõem um exemplo de manual do que a literatura ambiental consagrou como o problema dos "commons". Nessas áreas de exploração coletiva, cada agente econômico se vê incentivado a extrair o máximo de rendimento do recurso comum, o que termina por esgotá-lo. Água, solos férteis e ar limpo vão pelo mesmo caminho.
Engana-se quem achar que a piscicultura e a modificação genética dos peixes --como já se faz com salmões-- é a solução mágica para a exaustão dos estoques. Se chegarem a produzir na mesma escala com que se pesca nos mares, hoje, acarretarão fatalmente problemas ambientais similares aos da criação industrial de bois, porcos e frangos.
A carcinicultura (produção de camarões em cativeiro), por exemplo, já leva à destruição de mangues no mundo todo, inclusive no Brasil. Variedades artificiais de salmão ameaçam substituir a população dos primos selvagens. Tucunarés transpostos para represas fora da bacia amazônica, como no Estado de São Paulo, estão destruindo a fauna aquática local com sua voracidade.
O mar não está para peixe, nem os rios, lagoas e açudes. Um dia todo mundo vai virar vegetariano, por necessidade e não virtude. A única coisa boa de ter atravessado o Rubicão dos 50 anos é saber que essa tragédia não ocorrerá em seu tempo de vida

Marcelo Leite

sábado, 20 de novembro de 2010

Lobo mau!



Blog de Josias de Souza

Marcando o terreno!



Blog de Josias de Souza

Tiriricando!



Blog de Josias de Souza

Osso!



Blig de Josias de Souza

Censura e consciência

Comento com algum atraso a suposta censura a "Caçadas de Pedrinho", um dos títulos infantis de Monteiro Lobato, por trazer "formas de expressão" racistas. Usei aqui o "suposto", porque, como mostrou meu amigo Marcelo Coelho num belo artigo para a Ilustríssima do último domingo, o Conselho Nacional de Educação (CNE) não chegou nem perto de proscrever a obra --o que nem poderia fazer-- ou criar obstáculos intransponíveis a sua utilização nas escolas. O que o parecer nº 15/2010 faz é admitir que o texto traz um linguajar complicado e, elevando o burocratês das autoridades educacionais a sua forma mais perfeita, cobra a formação de professores aptos a lidar com a temática dos estereótipos raciais e sugere que livros com inclinações preconceituosas não sejam escolhidos para fazer parte do Programa Nacional Biblioteca da Escola, mas, se mesmo assim forem, que se exija dos editores a inclusão de notas que apontem criticamente para o problema.
A meu ver, as recomendações ficam entre o desnecessário, o ligeiramente contraditório e o cosmético. É até divertido imaginar que não tenhamos até hoje conseguido formar bons professores para as redes pública e privada, capazes de discutir com toda propriedade assuntos difíceis como o racismo, porque o CNE jamais havia instado as universidades a fazê-lo. Já quanto à suposta solução das as notas, eu não diria que sou contra. Se explicam até que antigamente se caçavam onças, mas que agora o Ibama impede mais esse crime ambiental, certamente não há mal em indicar que a linguagem relativa a estereótipos raciais também mudou. É evidente, contudo, que isso funciona muito mais tranquilizar consciências do que para eliminar o racismo da sociedade.
A minha sensação é a de que estamos diante de uma verdadeira tempestade em copo d'água. O que temos aqui é basicamente a burocracia seguindo seu caminho: diante da reclamação objetiva de um funcionário contra o livro, as engrenagens oficiais são postas em movimentação para produzir uma resposta quase anódina, mas que, por alguma razão, foi transformada em cavalo de batalha ideológico, discriminando entre defensores da liberdade de expressão e promotores da igualdade racial.
Trata-se, evidentemente, de uma falsa questão. Em primeiro lugar, como já enfatizei, não haveria censura mesmo que o parecer do CNE fosse homologado pelo MEC, o que dificilmente ocorrerá, dada a dimensão que o caso adquiriu. E nem seria necessária a interferência da tecnocracia pedagógica para fazer com que Monteiro Lobato seja menos lido. Receio que esse processo esteja acontecendo naturalmente. Não disponho de dados muito objetivos, mas creio que a obra envelheceu mal.
Eu, que me tornei leitor pela pena de Lobato, fiz o que pude para que meus filhos gêmeos, Ian e David, agora com oito anos, descobrissem os prazeres do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Não tive muito sucesso. Quer dizer, o David, que lê tudo o que lhe caia em mãos, de bula de remédio a pareceres do CNE, ainda enfrentou alguns volumes, mas não chegou nem perto de experimentar o encantamento que eu tive com "Os 12 Trabalhos de Hércules". Para ficarmos no mundo helênico, ele prefere mil vezes mais Rick Riordan ou o próprio Homero nas muitas versões adaptadas para crianças. Não sei se é o registro de um Brasil rural que não lhes diz mais nada ou se é a concorrência globalizada, mas não vislumbro um futuro muito brilhante para Lobato. Espero estar errado.
Voltando à falsa polêmica, também me parece uma idiotice transformar o combate ao racismo (ou a qualquer outro "preconceito") numa perseguição a fantasmas do passado. Se a estratégia for levada a ferro e fogo, só nos permitiríamos ler autores contemporâneos e comprometidos com o linguajar politicamente correto (PC) --ou seja, sacrificaríamos toda a literatura, a filosofia e grande parte da ciência. OK, Lobato descreve negros em linguagem hoje imprópria --embora, como notou Coelho, a mensagem final de "Caçadas de Pedrinho" seja antirracista. Mas Aristóteles era escravagista e Shakespeare retrata alguns de seus personagens com generosas pinceladas de antissemitismo. O que vamos fazer com esses e outros autores Restringi-los aos infernos das bibliotecas? Correr a produzir novas edições críticas que assegurem a justa interpretação dessas passagens delicadas? Até os desenhos de Tom & Jerry e do Pica-Pau incorrem em especismo e violência gratuita.
Minha implicância com o PC não é só com o fato de ele ferir de morte o humor mas principalmente porque representa um insulto à inteligência. Uma das características mais notáveis da mente humana é a autoconsciência. Em algum grau, nós a compartilhamos com outros mamíferos. Experimentos mostraram que alguns (mas não todos) os chimpanzés, orangotangos, golfinhos e elefantes são capazes de reconhecer a própria imagem no espelho. Isso implica algum nível de autoconsciência corporal. Só que a humana vai bem mais longe. Não apenas somos capazes de perceber nosso corpo como ainda conseguimos projetá-lo mentalmente no passado ou no futuro dissociando-nos de alguns aspectos de nosso "eu" atual. É uma forma bastante sofisticada de autoconsciência, que responde por grande parte de nossas habilidades para resolver problemas e pela integralidade de nossas belas-artes e ciência.
E o PC é o novo fundamentalismo exegético. Ele postula uma espécie de presente eterno e presume que perdemos essa capacidade tão humana de nos lançarmos no passado carregando apenas a bagagem necessária. Exceto quando alertados por uma nota explicativa, não saberíamos mais perceber que valores e ideias podem mudar com a passagem do tempo nem produzir juízos morais consonantes com o "Zeitgeist" (espírito da época).
Como sempre gosto de culpar a religião por alguma coisa, diria que aprendemos esse mau hábito com certas igrejas as quais, contrariando todas as evidências, proclamam a imutabilidade da moral.
Para não encerrar mais uma coluna falando mal do papa, entretanto, voltemos ao cérebro. O que as novas pesquisas nesse campo indicam é que a consciência não passa de um efeito colateral. Isso mesmo, o "eu" que acreditamos existir dentro de nós e em vista do qual vivemos nossas vidas é, segundo o modelo do neurocientista Michael Gazzaniga, um subproduto de diversos módulos cerebrais ligados em rede analisados pelo que ele chama de "intérprete", estruturas localizadas no hemisfério esquerdo responsáveis por essa sensação de todo unitário. O intérprete é o cérebro sabichão. É ele que busca desesperadamente dar um sentido a todas as nossas experiências, memórias e fragmentos de informação. Quando a história não fecha, pior para a verossimilhança: o intérprete não hesita em criar desculpas esfarrapadas e explicações que beiram o "nonsense".
Não é uma origem muito nobre para o conceito de consciência, que tanto ocupou e encantou os filósofos, mas explica muito dos anos-luz neurológicos que nos separam os cérebros humanos dos de nossos parentes mais próximos.

Hélio Schwartsman

Boêmios ajudam escola pública

Na Vila Madalena, boemia consegue até melhorar a educação pública, num exemplo de inovação comunitária. Um dos ícones da boemia paulistana é a Mercearia São Pedro. À sua frente ocorria uma tragédia. Uma escola (Carlos Maximiliano), deteriorada, sombria, estava com data marcada para fechar. A comunidade se movimentou, ajudando um grupo de professores e alunos. A recuperação virou um case, ensinado em cursos de formação de diretores, para mostrar um exemplo de integração escola-comunidade.
Ocorre que, na Mercearia, escritores boêmios (Marcelino Freire, principalmente) arquitetaram uma semana dedicada apenas à literatura, mas que tivesse um ambiente descontraído dos bares. Os encontros, sempre informais, acontecem em vários lugares do bairro, a começar dos bares. Deu-se o nome de Balada Literária (a programação está no www.catracalivre.com.br), que começa nesta semana, agora até com convidados internacionais. Não há patrocínios nem marca de ninguém, tudo na raça.
Um dos lugares desses encontros é justamente dentro da escola, onde, num galpão fechado, se construiu o Teatro da Vila.
Vejo nesse tipo de combinação fragmentos não só da cidade mas da educação do futuro. É quando se juntam cultura com a educação e as ruas com as escolas. Rua não é lugar de ameaça, mas de aprendizagem e convivência. A comunidade cuida de sua escola como se fosse uma extensão de suas casas.
Por essas e por outras, amo tanto o bairro que adotei desde que me mudei de Nova York.

Gilberto Dimenstein

Cadê a cordialidade?

Sabe aquela cordialidade do brasileiro, sociologicamente identificada pelo grande Sérgio Buarque de Hollanda e que ao longo dos anos nos fez ter orgulho de sermos uma nação tolerante, generosa, caracterizada como um povo alegre e hospitaleiro, pronto a receber e abraçar a todos?
Muita gente sempre achou que essa tal cordialidade era uma espécie de fachada, um marketing comportamental, digamos assim, e que de cordial o brasileiro não tem nada.
Mas sempre, nós, os talvez ingênuos que acreditam na beleza da vida, teimamos em insistir que, sim, é possível viver sem ódios, preconceitos, intolerâncias, com solidariedade no coração.
Mas é difícil, viu, continuar acreditando que todos nascem iguais perante Deus e perante a lei, porque tem cada espírito de porco solto por aí, que vou te contar...
O que dizer dos jovens bem nascidos que resolveram sair espancando outros jovens na principal avenida de São Paulo, por conta de supostas diferenças de orientação social? Apesar de todas as evidências de crime, foram soltos rapidinho, uma vez que brancos, de classe média; se fossem pobres e/ou pretos estavam jogados em alguma cela decrépita, esquecidos pela mesma Justiça que os liberou incontinenti, deixando-os por aí prontos para outras...
E o que dizer do soldado do Exército do Rio de Janeiro que atirou contra um rapaz depois da Parada Gay (um país que tem as maiores paradas gay do continente deveria ser tolerante, não?), porque o rapaz é "viado"? Foi isso que ele disse, segundo testemunha, chamou de viado, disse que o moço envergonhava a família dele, que merecia morrer e pimba, dá-lhe logo um tiro e pronto, resolvido o problema...
Seria uma onda de homofobia o que está ocorrendo?
Então, o que dizer do jovem de 25 anos, macho pra caramba, que quebrou os dois (os dois!) braços e seis dentes (seis!) de uma professora do Sul do país? O infeliz ficou inconformado porque tirou uma nota baixa e resolveu descarregar sua raiva sobre a educadora, de 57 anos, acabando com a pobre mulher. Na fuga, atingiu um porteiro e um segurança.
O que pensa uma criatura dessas? Pensa?
Ainda lá pelas bandas do Sul, outro exemplo de intolerância que nos envergonha e que humilha nosso povo e nossa suposta cordialidade.
Aqui a coisa é profissional: durante um programa de televisão numa afiliada da Rede Globo em Santa Catarina, o "jornalista" Luiz Carlos Prates, um senhor até que bem apessoado, não fosse a peruquinha meio ridícula, encontrou, segundo ele, a explicação para o número elevado de mortes nas estradas do Estado no último feriado. Olha o que ele disse: "Hoje, qualquer miserável tem um carro. O sujeito jamais lê um livro, mora apertado em uma gaiola que hoje chamam de apartamento. Não tem nenhuma qualidade de vida, mas tem um carro na garagem".
Disse mais: completamente irado, disse que esses que se envolvem em acidentes são uns desgraçados, que não se entendem com a mulher e saem por aí em alta velocidade descarregando suas frustrações.
Ainda bem que o cidadão foi devidamente execrado, sobretudo nas redes sociais, onde o vídeo com sua sandice "pobrefóbica" tem tido muita audiência. Veja aqui.
Bem, viado merece porrada e tiro, professora que não dá boa nota tem mais é que apanhar e perder os dentes e um pobre que ousa dirigir um carro de sua propriedade vai acabar morrendo em acidente mesmo...
É o meu Brasil brasileiro?

Luiz Caversan

terça-feira, 16 de novembro de 2010

República Seminova!



blog de Josias de Souza

Iniciação política!



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E agora, Lombardi?!?!?!



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Fatiamento de cargos!



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Quanto vale um pobre?


Em 2006, nos cafundós do Piauí, tive a infelicidade de perguntar ao filho adolescente de uma beneficiária do Bolsa Família quantas vezes por semana eles conseguiam comer alguma proteína. "Não sei o que é isso", foi a resposta.

"Carne. Vocês comem carne?" Ao que respondeu: "De vez em quando a gente acerta um passarinho".
A maior promessa de Dilma Rousseff como presidente é erradicar a pobreza. De propósito ou não, ela usou o termo "miséria" ao fazê-lo.
Especialistas no assunto e o próprio MDS (Ministério do Desenvolvimento Social), responsável pelo Bolsa Família, usam os termos "pobre" e "indigente".
Assim, é pobre e elegível ao Bolsa Família grupos familiares com renda mensal per capita inferior a R$ 140. Se uma família de quatro pessoas vive com R$ 400 ela é pobre (precisaria de R$ 560 ou mais para deixar essa classificação).
Já os indigentes são os que têm renda familiar per capita mensal abaixo de R$ 70.
Os valores são ridículos. Equivalem a R$ 4,60 por dia (um maço de Malrboro para o pobre) e R$ 2,30 (menos que uma passagem de ônibus em SP para o indigente).
O MDS reconhece que o ideal seria usar o valor do salário mínimo como referência. Assim, uma família de quatro pessoas deixaria de ser pobre quando recebesse (via rendimentos do trabalho e/ou benefícios sociais) R$ 2.040,00, ou R$ 510 por cabeça.
A meta de Dilma com a atual definição de pobreza (abaixo dos R$ 140) é factível e não custaria tanto.
Vista de maneira mais honesta, porém, não seria nada sensacional. Virariam "ex-pobres" os que passassem a viver com os R$ 4,60 ou mais ao dia.
Segundo cálculos do Centro de Políticas Sociais da FGV, o Brasil teria de investir mais R$ 21,3 bilhões ao ano (em cima dos R$ 13,4 bilhões do Bolsa Família) para atingir esse objetivo.
Somados, os quase R$ 35 bilhões corresponderiam a apenas 1% do PIB e chegariam a mais de 80 milhões de pessoas.
Como comparação, nos primeiros oito meses de 2010 o governo separou R$ 50 bilhões para pagar juros de sua dívida. Proporcionalmente, os que receberam em juros esses R$ 50 bilhões são um grão de brasileiros diante de um mar de conterrâneos pobres.

Fernando canzian

Irlanda, de tigre celta a dominó no cassino

Mais um dominó europeu está para cair na crise que se iniciou em 2008, parecia superada no início deste ano, mas segue dando dores de cabeça no mundo rico.
O dominó da vez chama-se Eire ou Irlanda, simpática ilha de 4,5 milhões de habitantes, cuja história recente é também a história dos dramas do capitalismo contemporâneo.
A Irlanda foi durante um bom tempo o primo pobre da Comunidade Europeia. Claro que ser primo pobre de um entorno rico não é a mesma coisa que ser pobre na América Latina, por exemplo. Mas é sempre um problema.
De repente, a Irlanda explodiu, nos anos 90. Explodiu tanto que passou a ser chamada de "tigre celta", homenagem dupla: aos países asiáticos que tanto cresceram no mesmo período e às origens mais remotas de sua brava gente.
Entre 1995 e 2007, a economia irlandesa cresceu 6% ao ano, na média, superando todos os seus parceiros da zona euro.
Crescimento apoiado, principalmente, em um "boom" da construção civil, mas também em empresas de tecnologia da informação e medicamentos e em um setor financeiro ousado. Ousado demais, conforme logo se descobriria.
Veio a crise global de 2008 e o tigre celta nem gatinho mais conseguiu ser. A partir de então, a Irlanda sofreu o maior colapso do setor imobiliário entre todos os países desenvolvidos: o valor dos imóveis desabou entre 50% e 60%.
Consequência inescapável: os bancos, que haviam emprestado descuidadamente para construtoras e compradores, ficaram com um baita mico na mão. Consequência dois: o governo decidiu garantir a dívida de todas as suas instituições financeiras, que se acreditava inicialmente não ser tão grande. Era.
O mico passou para as mãos do governo e tem um tamanho aproximado de 40 bilhões de euros, o que faz parecer o rombo no PanAmericano uma coisa quase infantil.
Quebrada a construção, o país retrocedeu 3% em 2008, mais 8% no ano passado e caminha em 2010 para o terceiro ano consecutivo de retrocesso.
É assim que se chega ao dominó do momento: os mercados financeiros, sempre à procura de uma boa caça, desconfiaram que a dívida irlandesa não poderia ser paga. Afinal, o deficit fiscal saltou para 12% da produção econômica, em consequência da queda da arrecadação e dos estímulos que o governo deu para evitar que a recessão fosse ainda mais dramática.
Mas esse é o que os economistas chamam de deficit subjacente, ou seja, a diferença entre o que o governo gasta e o que arrecada. O deficit real agora é de 32% do PIB, algo inacreditável, por conta da estatização da dívida bancária, despesa que só ocorreu uma vez.
O governo promete reduzir o deficit a 3% até 2014, mas os mercados não perdoam e caem matando: na quinta-feira, cobravam para renovar títulos da dívida irlandesa absurdos 9%, mais de três vezes o parâmetro europeu, que são os 2 e poucos por cento cobrados da Alemanha.
Na sexta-feira e nesta segunda, caiu um pouco, mas ainda é insustentável.
Resultado: apelos do Banco Central Europeu e de países como Portugal para que a Irlanda resolva de uma vez pedir ajuda ao BCE na forma de um colchão de algo entre 60 e 70 bilhões de euros para que o mercado sinta que há cacife, sim, para honrar a dívida.
Claro que honrá-la significa cortar fundo nos gastos públicos. O governo já havia sido obrigado a capar 14,5 bilhões no início da crise e, agora, está para apresentar um novo Orçamento de austeridade com um corte levemente superior (15 bilhões de euros).
Em reportagem publicada domingo pelo jornal britânico "The Observer", Morgan Kelly, do University College de Dublin, a capital irlandesa, dizia que os cortes são um "exercício de futilidade". Explica: "Qual é a graça em rearranjar as cadeiras do gasto no deck do navio, se o iceberg das perdas dos bancos vai nos afundar de qualquer maneira?"
Kelly tornou-se famoso na Irlanda por ter sido o único a prever o colapso da construção civil quando todo mundo festejava a transformação da Irlanda no tal "tigre celta". Seu pessimismo de agora, portanto, tem respaldo na história mas também (e principalmente) no fato de que "pelos próximos seis a sete anos, cada centavo do imposto de renda pago pelos irlandeses irá para cobrir as perdas dos bancos", como diz a reportagem.
Já seria suficientemente trágico se fosse apenas um problema irlandês. Não é, como apontou nesta segunda-feira o ministro português de Finanças, Fernando Teixeira dos Santos: "Não estamos enfrentando apenas um problema de um país. É o problema da Grécia, de Portugal, da Irlanda".
Quer dizer o seguinte: o risco de contágio ronda de novo o euro mas não só o euro. A exposição dos bancos europeus na Irlanda é de 29 bilhões de euros, sendo 12,3 bilhões dos bancos alemães. Em Portugal, é ainda maior (43 bilhões de euros, sendo 10 bilhões dos alemães).
Se esses bancos ficarem com um mico desse tamanho, a secura de crédito, que ainda não foi totalmente sanada, volta com força e acaba batendo nas remotas praias brasileiras.

Clóvis Rossi

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Traquinagem!



Blog de Josias de Souza

Ministério andrógino!



Blog de Josias de Souza

O papel da imprensa

É pior do que eu pensava. Esperei pacientemente o fim do pleito para fazer meu balanço do governo Lula, a fim de que ninguém me acusasse de tomar partido no jogo eleitoral. Imaginei que, fechadas as urnas e proclamado o resultado, ninguém seria paranoico o bastante para ver num simples texto de análise tentativas de golpe ou manipulação. Estava enganado. Dos mais de 700 comentários e dezenas de e-mails que minha coluna da semana passada (Gestão Lula, sucesso ou desastre) provocou, uns bons 70% me atribuíam inclinações peessedebistas ou me recriminavam por não ouvir a voz do povo.
Bem, para gáudio geral da nação, nunca fui e nunca serei candidato a nenhum cargo eletivo, o que me isenta de beijar criancinhas e enfrentar maioneses suspeitas. Mais do que isso, entre os muitos vícios (ou virtudes, cada um leia como quiser) de que posso ser acusado, não está o tucanismo. Para citar apenas dois entre muitos exemplos, em 2001, quando da crise de energia elétrica, defendi a renúncia do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Mais recentemente, em 2006, fiz duras críticas a José Serra por, contrariando promessa de campanha, ter renunciado à prefeitura de São Paulo a fim de disputar o governo do Estado. Evidentemente, há um número ainda maior de textos atacando o PT. O desequilíbrio, entretanto, deve-se mais a fatalidades espaço-temporais do que a preferências partidárias: minha coluna, que estreou no início de 2000, acompanhou os oito anos da gestão Lula contra apenas três de FHC.
Não apelei ao arquivo para enaltecer minha "neutralidade" enquanto analista. Mas, como pretendo mostrar até o final deste texto, a imprensa tem um papel institucional na sociedade que, por razões de ordem psicológica, muitas vezes deixamos de enxergar.
De um modo geral, é muito fácil achar quem esteja disposto a elogiar governantes e com eles travar relações de proximidade. Buscar o melhor posicionamento social possível é um comportamento que está inscrito em nosso DNA e no de todos os mamíferos que vivem em bandos.
Em sociedades mais complexas, entretanto, como as humanas e de chimpanzés, em que os indivíduos buscam ao mesmo tempo a ordem e a funcionalidade proporcionadas pelo respeito à hierarquia e uma certa segurança contra os abusos do despotismo, desenvolve-se o que o primatologista Frans de Waal chamou de "balanço de poder", no qual, para contrapor-se ao impulso de dominação exercido pelo macho alfa e seus próximos, surge uma espécie de aliança de opositores, que modula a força da facção situacionista.
Como o caminho mais fácil é quase sempre o de colocar-se do lado dos poderosos, a imprensa adquire um papel especial ao possibilitar que as ideias que fazem as vezes de contrapeso circulem mesmo sem as facilidades proporcionadas pela força dos consensos momentâneos e da máquina pública. Isso é especialmente relevante quando se tem uma oposição pouco entusiasmada, como é o caso do Brasil hoje.
Não é um acaso que os teóricos da democracia, notadamente os "philosophes" do Iluminismo francês e os "founding fathers" dos EUA, tenham dado tanto destaque à liberdade de imprensa. Thomas Jefferson chegou a escrever: "Se me fosse dado decidir se devemos ter um governo sem jornais, ou jornais sem um governo, não hesitaria um momento em preferir a última". Trata-se, obviamente, de um rematado exagero, mas que dá bem a medida da importância de um sistema de freios e contrapesos ("checks and balances") ao poder do Estado.
Não estou, com essas colocações, dizendo que a imprensa precisa necessariamente ser de oposição. Jornais chapa-branca ou apenas pouco críticos são perfeitamente legítimos. Eles apenas acrescentam institucionalmente pouco ao séquito já grande de adesistas de primeira, segunda ou undécima hora.
Mesmo os meios de comunicação que se coloquem no papel de consciência crítica do governo não estão obrigados a censurar cada decisão dos dirigentes. Assim como até um relógio parado está certo duas vezes por dia, uma administração, por pior que seja, fatalmente apresentará iniciativas dignas de apoio. Isso ocorreu até com o Collor.
Mais importante, essas observações não implicam que nossa mídia seja boa ou não cometa injustiças. Pelo contrário, ela as perpetra. E com um notável viés antigovernamental. Não vi estatísticas a respeito, mas estou certo de que o número de matérias injustas publicadas contra Dilma supera o de textos anti-Serra, que, por sua vez, é maior do que o de escritos desfavoráveis a Marina. É claro que o ideal seria que estampássemos apenas reportagens inatacáveis, mas, como isso é humanamente impossível, é melhor (ou "menos pior") que a tendência dos principais órgãos de imprensa (o certo aqui seria distingui-los um a um, mas não tenho nem procuração nem espaço para fazê-lo) seja antigovernista e não puxa-saquista.
A analogia que cabe é com a das deformações profissionais. Da mesma forma que um policial que acredite sempre na palavra de todo mundo, aí incluídos os bandidos, é quase um inútil, também um jornalista que aceite todas as explicações do governo não vai muito longe. No varejo, isso causa problemas. O sujeito inocente que é interrogado pelo tira durão poderá ser indevidamente pressionado. Uma explicação correta para um problema dada por órgão oficial poderá ser editada como desculpa esfarrapada. No atacado, porém, essas injustiças pontuais são o preço a pagar por engrenagens que funcionem, isto é, por uma polícia que investigue e apure crimes e por uma imprensa que informe o cidadão. Desde que esses erros sejam cometidos honestamente, e não na tentativa de extorquir ou manipular, é o máximo que nos é dado obter.
Falta ainda ensaiar uma explicação para o fato de muitas pessoas desprovidas de más intenções não perceberem esses mecanismos, que são até meio óbvios. Já resvalei nessa questão algumas semanas atrás, quando, analisando as eleições, afirmei que nossos cérebros são verdadeiras máquinas de autoengano, que nos permitem enxergar apenas aquilo que nossas emoções autorizam. A política e o futebol são só os ramos de atividade em que o caráter erístico do pensamento é mais notável.
Assim, não chega a ser uma surpresa que o papel da imprensa seja mal compreendido. A memória do eleitor emocionalmente ligado ao PT simplesmente não armazena nem as críticas nem as injustiças feitas no passado contra o PSDB. De modo análogo, o simpatizante tucano só vê os deslizes que a mídia comete contra o seu candidato. Não é à toa que os dois lados acusam os jornais de complô. Ainda que maquinar contra os dois candidatos majoritários numa eleição em dois turnos seja uma impossibilidade aritmética, aos olhos do militante, que só registram o seu lado da história, a acusação, mais do que verossímil, é uma certeza. Bem, parafraseando Schiller, contra a neurologia lutam os próprios deuses em vão.

Hélio Schwartsman

Cúpulas, versões e verdades

Cada vez mais me parece sábia a definição de reportagem que ouvi anos atrás, em palestra na USP, do jornalista norte-americano Carl Bernstein, um dos dois repórteres que estourou o célebre caso Watergate, o que levou ao afastamento do presidente Richard Nixon.
'Reportagem é a melhor versão da verdade possível de se obter', dizia Bernstein.
Sábia observação por pelo menos dois motivos:
1 - Começa por admitir quase explicitamente que não existe uma VERDADE, assim em maiúsculas, como se fosse emitida por Deus, qualquer que seja o seu Deus.
2 - Termina por admitir que boa parte do que sai nos jornais não é testemunhado diretamente, ao vivo, por qualquer jornalista. São eventos a portas fechadas, dos quais os jornalistas recuperam depois uma "versão da verdade".
Esta será tanto melhor quanto mais numerosas e confiáveis forem as fontes de cada jornalista.
Pegue agora um exemplo prático do momento: a cúpula do G20 em Seul. Os jornalistas não chegamos nem perto das reuniões. Ou melhor, chegamos perto (o centro de imprensa funciona no mesmo COEX, o centro de exposições e congressos principal da Coreia, em que estão os líderes). Mas não perto o suficiente para ouvir qualquer coisa das discussões.
Aí, no encerramento (sexta-feira, no caso), sai um documento oficial que é a 'verdade' que os líderes acharam conveniente pôr no papel. Como é óbvio, há dois defeitos aí:
1 - A linguagem diplomática, inevitável nessas ocasiões, é sempre acolchoada para esconder divergências. E não raro é também elíptica. Não vai direto ao ponto de forma a permitir que cada país se sinta contemplado pela mágica da retórica.
2 - Jamais os comunicados oficiais relatam os debates tal como eles de fato se deram, especialmente quando são ásperos. Não fosse a pouco usual presença de câmeras e microfones numa cúpula em Santiago do Chile, jamais teria vazado a famosa frase do rei Juan Carlos da Espanha para o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aquela 'por qué no te callas?'.
É claro que sempre há uma fonte (ou várias) a que se pode recorrer para traduzir a linguagem cifrada dos comunicados. Mas a tradução só será correta ou, pelo menos, não enviesada, se a fonte tiver plena noção de que é dever do funcionário público prestar contas ao público e sabe que a mídia é, em geral, apenas a intermediária entre um e outro.
Tudo somado, meu sonho (de cidadão, não de jornalista porque, nesta última condição, me defendo razoavelmente bem) é que os líderes decidam que sejam transmitidas ao vivo e em cores todas as cúpulas
Loucura? Eles não estão aqui em Seul para defender, supostamente, o meu, o seu, o nosso interesse? Então, por quê diabos eu não posso julgar por mim mesmo, acompanhando os debates, se o estão fazendo direitinho ou não?

Clóvis Rossi

Se eu fosse o Tiririca

Nunca, em toda a sua história, um país acompanhou tão atentamente uma redação, como ocorreu agora com o Tiririca, obrigado a provar que sabe ler e escrever. Só o fato de ter de fazer esse teste já demonstra que ele esteve muito longe do ensino. Ele teria uma chance agora de fazer um lance de marketing maravilhoso e, ao mesmo tempo, ajudar o país - e sem o menor esforço.
Se eu fosse o Tiririca, eu daria um lição a todos os que debocham (e com razão são muitos) e faria da cobrança por uma educação melhor uma plataforma permanente. Começaria reconhecendo que a vida não lhe deu as condições necessárias para estudar, mas sabe de sua importância. Teve até sorte de se virar bem como palhaço, mas é uma ínfima minoria. Montaria uma assessoria capaz de acompanhar números, analisar projetos em andamento e, quem sabe, até propor soluções. Pediria ajuda a entidades como Unicef, Unesco, Todos pela Educação, para embasar suas propostas. Todos, posso garantir, teriam prazer em ajudar se tivessem a segurança de que não se trata, digamos, de uma palhaçada.
Com sua capacidade de comunicação com as camadas mais pobres, seria um belo e produtivo exemplo.
O leitor, a essa altura, deve estar achando que, com essas ideia, eu devo ser uma espécie de Tiririca sem graça. Talvez.
Mas, provavelmente, a educação só será realmente vital em nossa nação quando não elegermos Tiriricas. Ou, se elegermos, pudermos vê-los fazendo coisas sérias. Nada pode ser mais sério para alguém acusado de analfabeto do que defender a educação.

Gilberto Dimenstein

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Orelha de Enem!



Blog de Josias de Souza

De castigo!



Blog de Josias de Souza

O Favorito

Ele entrou na campanha de Dilma Rousseff por indicação do presidente Lula, se aproximou da candidata, virou seu principal interlocutor e foi o escolhido para estar a seu lado, no carro, quando foi considerada eleita presidente e se encaminhava para fazer seu pronunciamento da vitória.
Desde então, Antonio Palocci Filho é o alvo favorito de aliados e inimigos nas articulações de bastidores. Já foi considerado nome certo na Casa Civil. Hoje, há quem diga que nem no Palácio do Planalto estará.
Um assessor direto do presidente Lula não arrisca dizer o cargo que Palocci ocupará num futuro governo Dilma. Diz, porém, ter uma certeza. Seja qual for o posto, ele terá assento na reunião de coordenação do governo da primeira mulher presidente do país.
Em outras palavras, Palocci pode até vir a ocupar um cargo que não tenha sala no Palácio do Planalto, mas participará das reuniões em que Dilma irá analisar e tomar suas principais decisões de governo.
Segundo amigos, o ex-ministro da Fazenda e hoje deputado federal não se importa tanto assim com o cargo que ocupará, desde que participe das decisões centrais do futuro governo Dilma. Na avaliação desses amigos, não teria sentido Palocci ter participado das articulações com empresários e políticos, sendo a ponte entre esses setores e Dilma, assumindo compromissos, e depois ficar fora do principal grupo de poder do novo governo. Nesse caso, seria melhor nem participar e ir fazer outra coisa.
Apesar das avaliações dos amigos, Palocci gostaria de ocupar a Casa Civil ou outro cargo dentro do Palácio do Planalto. Talvez uma reformulada Secretaria Geral da Presidência. O fato é que Palocci estará no governo Dilma. Além de contar com o apoio pleno do presidente Lula, ele conquistou a confiança da presidente eleita. Nesse momento, porém, o que os amigos de Dilma e inimigos de Palocci mais dizem em Brasília é que a futura presidente não vai colocar num cargo de destaque alguém que possa lhe fazer sombra.
A conferir, porque, em momentos de montagem de novo governo, há muita especulação, disputas por espaços, intrigas e um baixo índice de informações seguras e firmes. Até porque, por enquanto, Dilma tem sido econômica nas suas conversas. O que se diz é que ela conversa mais abertamente somente com o presidente Lula sobre sua futura equipe. Apenas depois do retorno da Coreia é que ela começaria a falar mais diretamente sobre o tema com alguns interessados.

Em bloco ou de uma vez

Dilma já disse que não faria anúncios individuais de ministros e preferia divulgar, por blocos, sua equipe ministerial. Começaria pela área econômica. Agora, porém, analisa se a melhor opção não seria deixar para divulgar toda equipe de uma só vez, em meados de dezembro. Ela confidenciou a um amigo temer gerar um clima de desânimo e paralisia no final do governo Lula com o anúncio de alguns ministros.
É que tem muita gente em Brasília nutrindo a expectativa de seguir no posto no próximo ano. Se descobrir ainda em novembro que terá suas pretensões frustradas, o candidato de si próprio perderá todo estímulo de seguir trabalhando. Quem irá penar com isso é o presidente Lula, seu criador.

Valdo Cruz

Tropeços e Dificuldades

Tristeza e Depressão

Encare tudo com confiança

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A conta!



Blog de Josias de Souza

Bocão!



Blog de Josias de Souza

É um sucesso tática do MEC para desmoralizar Enem

É de impressionar o zelo e o custo com que o Ministério da Educação exerce a incompetência ao gerir o Enem.
Convocada, a rapaziada compareceu a mais uma rodada do exame. Uma parte saiu da prova com uma questão irresolvida.
Coisa de múltipla escolha:

Letra A: O MEC faz muito mal todo o bem que faz aos estudantes.

Letra B: O MEC faz muito bem todo o mal que faz aos estudantes.

Letra C: Todas as alternativas alteriores.

A encrenca concentrou-se no sábado (6). A prova trazia questões repetidas. Faltavam-lhe outras questões.
Na folha de teste, a sequência de perguntas era uma. No cartão de respostas, outra. Um espanto!
A encrenca ganhou a web. Tornou-se assunto instantâneo das redes sociais. O MEC foi ao incêndio munido de gasolina.
A equipe do ministro Fernando Haddad (Educação) pendurou no twitter da pasta uma nota ameaçadora e deseducada:
“Alunos que já ‘dançaram’ no Enem tentam tumultuar com msgs nas redes sociais. Estão sendo monitorados e acompanhados. Inep pode processá-los”.
A fogueira subiu. E o time do Inep desceu ao twitter. Dessa vez, munido de uma seringa de água:
“Acompanhamento do twitter: monitoramento do Inep diz respeito a quem dizia utilizar celular durante a prova, e não aos comentários na rede”.
Em entrevista, o presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), Joaquim José Soares Neto, soou satisfeito.
Para ele, o Enem-2010 foi "um sucesso". Como assim? “É um processo complexo e, portanto, passível de falhas. Se houve equívocos, vamos apurá-los”.
O “sucesso” foi tamanho que a OAB aconselhou às felizes vítimas que batam à porta do Ministério Público.
Como parte do êxito, o mandachuva do Inep informou que vai ao ar, na quarta (10), formulário virtual para a requisição de alunos que quiserem reordenar suas respostas.
De resto, o professor Soares Neto disse que pode ser oferecida aos felizardos a oportunidade de uma nova prova, a ser aplicada em dezembro.
No início de 2009, o ministro Haddad anunciara uma bela novidade: o MEC ofereceria à estudantada a oportunidade de prestar dois exames por ano.
Com isso, seria reduzida a TPV (Tensão Pré-Vestibular). Era lorota marqueteira. As provas do ENEM foram furtadas, vazadas e adiadas.
Em 2010, nada de dois exames. O “sucesso” veio de uma única vez. Meses antes, o Inep já havia cavalgado outro lance esquisito.
Descobriu-se que os dados pessoais de 12 milhões de estudantes, que o instituto deveria guardar em segredo, estavam ao alcance de um clique de mouse.
Na ocasião, o professor Soares Neto demonstrara o mesmo desapreço à autocrítica: o vazamento "não afeta de forma alguma a credibilidade do Inep".
De fato, nada parece afetar a “credibilidade” do MEC. Ali, a incompetência é exercida, por vezes, com a máxima competência.

Blog de Josias de Souza

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Assombrações políticas

Férias, visita ao castelo de Vaux-le-Vicomte, nas imediações de Paris. Belo local, jardins magníficos. Pena que pairam sobre ele as eternas assombrações da política, ontem como anteontem, como hoje, no Brasil como na Europa, como no resto do mundo.
O castelo conta a história de Nicolas Fouquet, nobre francês que se torna protegido do cardeal Mazarino, por sua vez tutor de Luís 14, que viria a ser a quintessência do absolutismo monárquico (sim, é a ele que se atribui a frase 'O Estado sou eu', embora haja controvérsias sobre se o rei a pronunciou mesmo).
Mazarino foi o sucessor do cardeal Richelieu e, como tutor do futuro rei, era o governante de fato, o que só serve de lembrança de que a Igreja se mete em política não apenas nas eleições brasileiras de 2010 mas faz um bocado de tempo mais.
Fouquet, o do castelo, foi nomeado superintendente de Finanças e consta que fez razoável confusão entre o Tesouro da França e as suas próprias posses, o que só prova que essa promiscuidade entre público e privado não é invenção brasileira nem recente.
Morto Mazarino, Luís 14 resolve fazer valer a sua frase, tenha-a pronunciado ou não, e assume plenos poderes. Para isso, acha conveniente livrar-se de Fouquet, para o que conta com a valiosa colaboração de Jean-Baptiste Colbert, que bem poderia ser chamado de precursor dos ortodoxos na economia.
Foi ele quem botou ordem nas finanças reais e foi ele também que mais incentivou o rei a defenestrar Fouquet, o que só prova que dossiês, fogo amigo e intrigas politicas não são invenções modernas.
Fouquet acabou preso, apesar de sua popularidade entre os franceses, o que só prova que ficha suja ou suspeita de ficha suja não é impedimento, faz tempo, para que o tal de povo goste de certas personalidades.
Ah, a prisão de Fouquet se deu pelas mãos de um capitão de mosqueteiros chamado D'Artagnan, um dos célebres três mosqueteiros.
Nas paredes do castelo, pode-se ler trovas populares em que se diz que a corda que prendeu Fouquet estava agora à venda e poderia ser usada para prender uma ampla lista de poderosos do momento, a começar pelo seu sucessor Colbert, o que só prova que a tese de que todo político é ladrão, embora injusta, é antiga e disseminada pelo mundo.
Corda, no caso, é no sentido figurado porque Fouquet não foi enforcado, mas condenado à prisão perpétua.
Morreu na cadeia em 1680. A única diferença entre os políticos de 330 anos atrás e os de hoje é que os de hoje não morrem na cadeia. Aliás nem ficam nelas tempo suficiente para morrer.

Clóvis Rossi

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Calma no coração

Janela Indiscreta!



Blog de Josias de Souza

Quimioterapia para a Terra?

Suponha que a atmosfera terrestre esteja doente e que essa doença, o aquecimento global, fosse um tumor (não é boa a analogia, mas serve para falar de terapias possíveis). A melhor estratégia, claro, teria sido a prevenção: fazer exames periódicos de mama e de próstata, a partir de uma certa idade, evitar alguns alimentos e tomar banho de sol só com protetor solar.
O câncer, porém, já se instalou, como o aquecimento global. Quanto mais cedo e diretamente for atacado, melhor. Por exemplo, cortando o suprimento de sangue, como fazem certos medicamentos que tentam conter a formação de vasos sanguíneos que irrigam o tumor e permitem que se espalhe.
É o que se chama, em matéria de clima, de "mitigação". Em lugar de sangue, o suprimento daninho que se deve cortar é o de dióxido de carbono. Com menos emissões de usinas termelétricas a combustíveis fósseis (óleo, carvão, gás natural), do setor de transportes e de desmatamento, o tumor para de crescer.
Caso a mitigação esteja difícil de conseguir, como provou o fôlego curto do Protocolo de Kyoto, pode-se tentar combater o câncer com força bruta. Por exemplo, extirpando o tumor com uma cirurgia.
Aqui a analogia começa a fazer água, porque não há bisturi capaz de arrancar calor (radiação) retida na atmosfera. Mas é possível pensar em intervenções na infraestrutura construída pelo homem sobre a Terra, como preparar cidades e agricultura para um eventual aumento de chuvas e de enchentes, ou a falta delas e as secas. Em matéria de clima, fala-se em "adaptação".
Agora, considere a hipótese de que tudo isso falhe, e que a temperatura da Terra suba mais rápido do que calculamos, sem sobrar tempo nem dinheiro para adaptar a civilização. Resta como último recurso a quimioterapia: empregar munição pesada para tentar matar as células tumorais, ainda que ao custo da matança de células inocentes do doente, como as que mantêm os cabelos, e de um mal-estar terrível.
No que respeita à atmosfera terráquea, esse recurso extremo seria a geoengenharia, ou, como preferem alguns, a climaengenharia (ou, ainda, engenharia do clima). Trata-se de intervenções em larga escala na fisiologia da Terra, capazes de alterar o metabolismo de energia e gases que a mantém em constante movimento - chuvas, ventos, ondas, estações etc.
Um exemplo: a ideia antiga de "adubar" oceanos com ferro, fator limitante para a proliferação de micro-organismos capazes de fazer fotossíntese. Vitaminados, eles se multiplicariam e consumiriam mais CO2 da atmosfera. Efeito similar pode ser alcançado com a plantação de gigantescas florestas: para crescer, as árvores precisam fazer fotossíntese e tirar dióxido de carbono do ar.
Há outras propostas, como pintar de branco os telhados das casas. As cidades de hoje são ciclopicamente grandes, e essa imensa área refletiria mais luz do sol de volta para o espaço (a quantidade de energia devolvida é chamada por climatologistas de "albedo"). Haveria menos radiação disponível para ser aprisionada por gases do efeito estufa e alimentar o aquecimento global.
Não faltam noções ainda mais mirabolantes. Já se falou em lançar milhares de espelhos em órbita, para barrar a radiação solar antes mesmo que chegue ao planeta.
Outro conceito, já defendido pelo Nobel Paul Crutzen, seria injetar na atmosfera nuvens de partículas, em quantidade suficiente para fazer sombra, um pouco como ocorre com a matéria ejetada em grandes erupções vulcânicas, a exemplo do monte Pinatubo.
Assim como acontece com a quimioterapia, o risco é enorme. Um pequeno erro de dosagem pode ter consequências devastadoras para a saúde do doente.
Não seria trivial controlar um crescimento indesejável de micro-organismos marinhos, por exemplo. E sombrear um planeta do tamanho da Terra custaria caro, decerto, bem mais que mitigar a emissão de gases ou financiar a adaptação ao aquecimento global inevitável, já "contratado".
É por isso que muita gente se opõe a essas opções ultratecnológicas, que se alimentam da visão prometeica segundo a qual os males da tecnologia podem e devem ser curados com mais tecnologia. Para esses arautos da harmonia e do equilíbrio, o bom senso indica que sempre haverá efeitos não pretendidos nem previsíveis.
Eles estão com a razão, em seu chamado à cautela. Há muita coisa para ser feita antes de gastar bilhões em coisas de resultado incerto. Mas será que faz sentido descartar de saída a possibilidade de precisarmos de quimioterapia?
De certo modo, foi isso que decidiram 179 países reunidos em Nagoya, Japão, ao adotar na semana passada um protocolo para regulamentar a Convenção da Biodiversidade. Eles optaram por uma moratória de propostas de climaengenharia. A precaução tem algum sentido, pois ajuda a frear a tendência de alguns países, como os EUA, de privilegiar soluções tecnológicas e unilaterais.
Se a moratória implicar interromper ou deixar de financiar estudos em geoengenharia, contudo, podem estar dando um tiro no pé. Ninguém quer fazer quimioterapia. Mas só um homeopata maluco, fundamentalista até a raiz dos cabelos, seria contrário a pesquisar novos medicamentos quimioterápicos.

Marcelo Leite

O Brasil com futuro

odos os candidatos falaram, na campanha, da importância do emprego, da educação, da inovação e da inclusão. Por isso, vale a pena conhecer uma experiência que junta tudo isso. Mas sem governo. É realizada em São Paulo, onde, num galpão jovens se reúnem para desenvolver negócios que gerem lucro e mudem o mundo (o detalhamento está no www.catracalivre.com.br).
Sem nenhum apoio público, foi criado um espaço chamado "Hub". Lá, jovens, com pouco dinheiro e muitas ideias, alugam espaços e passam a fazer parte de uma comunidade, trocando informações e conhecimentos. Entre outros projetos, eles estão criando um carro ecológico em sistema colaborativo, moedas locais para desenvolver bairros da periferia, uma empresa de entregas que troca a moto por bikes, a plantação de jardins em cima dos prédios.
É apenas um detalhe. Mas aí está minha visão de um Brasil com futuro. Jovens capazes de desenvolver seus talentos e fazer inovações. O que tem pouco estímulo dentro e fora das universidades. Comparados aos Estados Unidos, estamos, sem exagero, na Idade da Pedra.
Mas há demanda. Tanto que experiências como essa começam a se disseminar. Imagine se contar com apoio do poder público (infraestrutura), a iniciativa privada ( participando dos negócios com empréstimos e até doação de recursos) e entidades tipo Sebrae. Senac e Senai que ajudem na formação dos projetos.
Também coloquei no Catraca Livre projetos que apóiam a inovação. O Sebrae, por exemplo, criou um projeto apenas para atender esse tipo de demanda.

Gilberto Dimenstein

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Novo figurino!



Blog de Josias de Souza

Álcool é mais prejudicial do que a heroína ou o crack, diz estudo

Um estudo britânico que analisou os danos causados aos usuários de drogas e para as pessoas que os cercam concluiu que o álcool é mais prejudicial do que a heroína ou o crack.
O estudo divulgado na revista científica "Lancet" classifica os danos causados por cada substância em uma escala de 16 pontos.
Os pesquisadores concluíram que a heroína e a anfetamina conhecida como "crystal meth" são mais danosas aos usuários, mas quando computados também os danos às pessoas em volta do usuário, no topo das substâncias mais nocivas estão, na ordem, o álcool, a heroína e o crack.
O cigarro e a cocaína são considerados igualmente nocivos também quando se leva em conta as pessoas do círculo social dos usuários, segundo os pesquisadores. Drogas como LSD e ecstasy foram classificadas entre as menos danosas.

APOLÍTICA

Um dos autores do estudo é David Nutt, que ocupou o cargo de principal conselheiro do governo britânico para a questão das drogas.
Após deixar o posto, no ano passado, ele formou o Comitê Científico Independente sobre Drogas, instituição que se propõe a investigar o tema de forma apolítica.
O professor Nutt afirma que "considerados os danos totais, o álcool, o crack e a heroína são claramente mais prejudiciais que todas as outras (substâncias)".
"Nossas conclusões confirmam outros trabalhos que afirmam que a classificação atual das drogas tem pouca relação com as evidências de danos", diz o estudo.
"Elas também consideram como uma estratégia de saúde pública válida e necessária o combate agressivo aos males do álcool."

Folha de São Paulo